domingo, 25 de novembro de 2012

Luz - Belém, Igreja da Natividade, 2012

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Duas irmãs orientais diante de um azulejo com orações e indicações práticas na mesma língua. Tenho vergonha de ainda não ter decifrado a língua do painel e a nacionalidade das irmãs. Aquela igreja fica perto de Jerusalém, em Belém, na Palestina, isto é, na Jordânia, ou antes na Cisjordânia, quer dizer, por agora, em Israel! É um sítio mágico de peregrinação. Gente de todo o mundo, de chineses a etíopes, de índios americanos a bolivianos, de russos a brasileiros, de tudo havia por ali. O sítio é feio, o urbanismo horrendo, o conforto inexistente, as filas de espera monstruosas, a falta de água absoluta, as vigarices dos mercadores dos templos mais que muitas, o barulho dos autocarros insuportável, o pó intolerável, as facilidades de banho pouco recomendáveis... Mas lá que o sítio é mágico... Mesmo para um agnóstico!

terça-feira, 20 de novembro de 2012

António-Pedro Vasconcelos, «O Futuro da Ficção», FFMS, 2012

Por Maria Filomena Mónica
O PRIMEIRO aspecto a notar é ser este livro atravessado por uma profunda nostalgia, o que não fica mal a um romântico. O tom usado confere à obra, como aliás ao seu autor, um fascínio invulgar. Não fosse isto e alguns leitores poderiam olhá-lo como uma ostentação provinciana de cultura. Mas se ele cita muitas obras-primas é por o exercício ser necessário ao que pretende demonstrar, isto é, que, ao longo da História Europeia, houve ciclos de criatividade, de curta duração, seguidos por longas noites de silêncio.
O livro tem muitas qualidades. Refiro a mais óbvia, a familiaridade com que o autor fala do arco temporal que vai da Grécia clássica ao mundo moderno. O relato tem qualquer coisa de teleológico, o que, em vez de me irritar, acabou por me encantar, talvez por conhecer o António Pedro há tantos anos. Leia-se o que vem na pág. 23: «Hoje não é heresia reconhecer que o século que acabou foi o século do cinema». Depois da tragédia grega, da pintura renascentista, do iluminismo, dos romances realistas, da poesia simbolista, eis que chega a arte suprema, a 7ª, que «vai retomar, no século XX, o fio que se foi urdindo, ao longo de vinte e oito séculos, através de constantes migrações, a grande História da Ficção no Ocidente». Basta olhar John Wayne, em A Desaparecida, de John Ford, para compreendermos do que está a falar.
O autor sabe que precisamos de uma gesta para sobreviver, como sabe que modernamente nada nem ninguém encarnou melhor esse desejo do que Hollywood e John Ford. É quase inexplicável, mas aconteceu: desde 1940 que os filmes de Ford, centrados em cowboys e índios, tocaram o coração de pessoas que nada sabiam da forma como os EUA tinham nascido. A imagem do cavaleiro solitário, que, algures num espaço sem fim, apenas com um Colt à cintura, enfrenta o Mal, permanece um dos grandes mitos da cultura contemporânea.
Mas voltemos a outra das suas teses, a do desaparecimento do romance. Aqui, as nossas diferenças são maiores. É possível que o romance, tal como o herdámos do século XIX, esteja a morrer, mas não é certo. Aceito que as experiências de romancistas que se puseram a brincar com a estrutura narrativa ou enveredaram por malabarismos com palavras redundaram em fracasso. Foi por terem optado pelo experimentalismo pretensioso que alguns escritores recentes, como, por exemplo, Jeannette Winterson, que, em 1985, publicou um romance notável, Oranges Are Not the Only Fruit, deixaram de me atrair. Mas, na narrativa ficcional, há qualquer coisa – seja ela em livro, no palco ou na televisão - que nunca desaparecerá. Porque os homens jamais se cansarão de ouvir ou de ler histórias. Talvez neste ponto – deve ser o único – seja mais optimista do que o António Pedro. Não antevejo um mundo sem ficção, porque ela é essencial ao ser humano.
Falo por mim. Desde a infância que leio romances e nunca se me pôs a questão de saber se estaria a perder tempo. O que pretendia era entrar num mundo novo, conhecer pessoas diferentes, chorar com dramas alheios. Não teria sobrevivido à infância se não tivesse «sido» Tom Sawyer, muito menos à adolescência se não me tivesse identificado com Cathy. A ficção fala de nós e ainda, ou sobretudo, desse «eu» que poderíamos ter sido, para usar o título do mais famoso poema de Robert Frost, «The road not taken». Por vezes, compreendemos melhor o mundo através da ficção do que olhando-o através da janela. 
Abordei já algumas divergências. Quero ainda falar de outra, talvez a mais importante, que diz respeito à suposta degradação do nível cultural das massas populares. Para me ater apenas às televisões, é evidente que temos, diante de nós, uma programação pior do que a que, noutros países é oferecida. Reconheço que nunca, desde que entrámos no século XXI, vi nada que se possa equiparar às séries televisivas escritas por Alan Bennett, Dennis Potter ou John Cleese, nos anos 1970 e 1980. Mas esse mundo, onde apenas existia, ou quase, um canal generalista, desapareceu. O que não quer dizer que tudo quanto se vê na TV seja mau: basta recordar as séries produzidas pela privada HBO ou por Steven Bocho. Se Shakespeare estivesse vivo, optaria por escrever para a TV? E que faria Dickens diante das possibilidades abertas pelos DVDs? 
Quanto à ficção escrita, só o tempo separará o trigo do joio. Não há outra maneira, nem outro juiz. Por isso, não vale a pena chorarmos sobre uma eventual decadência. Bastou-me olhar a estante, que fica ao lado do meu computador, para ver algumas obras-primas, de autores tão diferentes quanto Doris Lessing, V. S. Naipaul ou Philip Roth.
Apesar de partilharmos inquietações, não aceito a visão apocalíptica do António Pedro. Em primeiro lugar, a civilização do espectáculo apenas tornou visível o que há muito existia, isto é, o gosto boçal por determinados entretimentos populares. Aquilo de que nos devemos ocupar é de oferecer aos nossos filhos e netos uma boa educação, o que pressupõe a existência de uma rede de escolas públicas decente, onde o Canon clássico seja ensinado. Tanto eu como ele pertencemos a uma minoria privilegiada, a classe média, o que nos pode levar a ter uma visão distorcida do mundo contemporâneo. Enquanto eu e ele líamos, e sublinhávamos, Stendhal, muitos raparigas e rapazes da nossa idade andavam pelos montes a guardar rebanhos. Antes de começarmos a chorar a perda de um mundo que nunca existiu, temos de nos perguntar quantas pessoas, há 100 ou 200 anos, tinham acesso à cultura superior.
Tão pouco aceito a sua ligação do termo «globalização» à diminuição da qualidade da produção cultural, tal como expressa numa frase que aparece perto do final (pág 59): «Os progressos da globalização trouxeram consigo uma atomização da cultura, uma proliferação das ficções e uma democratização dos meios de a produzir. Hoje, qualquer um pode ser criador. E, no entanto, nunca houve tão poucos criadores». Não é verdade. Foi o António Pedro que me recomendou um livro, fruto do fenómeno da globalização – neste caso, da emigração da América do Sul para a do Norte – que merecera a sua atenção, a obra The Brief Wondrous Life of Óscar Wao», de Junot Diaz (2007).
Termino com uma gracinha que diz muito sobre as diferenças culturais entre os países. Aquando do escândalo envolvendo Hugh Grant em Los Angeles – quando o famoso actor foi apanhado num carro, estacionado na via pública, dentro do qual uma prostituta se dedicava à prática de sexo oral - um jornalista perguntou-lhe se não tencionava consultar um psicoterapeuta. A resposta foi: «Não, em Inglaterra, preferimos ler romances»
[1]. O António Pedro pode estar descansado. Como em séculos pretéritos, talvez mais do que em séculos pretéritos, o mundo precisa de ficção. O público fragmentou-se, mas haverá sempre lugar para obras de qualidade. Não, não vamos esquecer de Aristóteles, nem, muito menos, ter de esperar dez séculos para o redescobrir.

domingo, 18 de novembro de 2012

Luz - De Aqaba a Petra, Jordânia 2012

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Na estrada de Aqaba para Petra e depois para Amã, capital da Jordânia. São centenas de quilómetros através, quase sempre, do deserto. Esporadicamente, uma aldeia ou uma vila. Ao longo da estrada, dos dois lados, vestígios humanos, de restos de tentativas a inícios de promessas. Há de tudo: comércios, uma tasca, uma loja de comes e bebes, uma estação de gasolina, uma repartição da polícia ou um posto militar. Tentativas de plantação de árvores, condutas de petróleo, tubos de rega gota a gota, um raro oásis de verdura e pomares com umas centenas de metros quadrados e umas tendas de beduínos. Por volta de Petra, sítio admirável, estamos em terra de Harrison Ford e Indiana Jones: não faltam fotografias e referências. De Aqaba ao Wadi Ram (o deserto ali ao lado), estamos em locais de Lawrence da Arábia e de Peter O’Toole. E também não faltam fotografias, cartazes, lojas com esses nomes e outras alusões de mau gosto. Aqaba é a única saída para o mar e o único porto que serve a Jordânia. Daí a auto-estrada que leva pessoas e sobretudo mercadorias até à capital e às cidades e vilas do Norte. Durante a longa viagem, inaugurei um novo estilo de fotografia (novo... para mim...), que consiste em fotografar, a partir do carro ou do autocarro, sempre em andamento, disparando a máquina digital, não digo ao acaso, mas com inusitada frequência. O que sai é em grande percentagem inútil. Mas aqui e ali aparecem surpresas! As cores dos edifícios, sempre inacabados, são o que há de mais fantasioso. Talvez para compensar a monotonia do deserto. Chamo a este estilo “road photography”, a completar com a “train photography”, que pratico no seguimento e sob a inspiração de algo mais sério, firmado e antigo que é a “street photography”.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

domingo, 11 de novembro de 2012

Vinho do Porto, Ferreira, Gaia, 2006

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À janela da Sala de provas do armazém da Casa Ferreira, em Gaia. Em frente, do lado de lá do rio, a cidade do Porto (com a magnífica Casa da Alfândega à esquerda). Na prateleira, no primeiro plano, estão as “provadeiras”, com amostras de vinho, prontas para prestar provas. Estes copos foram, durante décadas, os próprios dos profissionais da adega que com eles faziam os seus testes e as suas provas. A dimensão, o pé, a largura em baixo e o diâmetro na boca permitiam fazer vários exercícios para melhor conhecer a cor, o aroma e a “perna” do vinho. Recentemente (vinte ou trinta anos) começaram a ser usados por conhecedores em suas casas, por vezes em bares e restaurantes especializados ou garrafeiras mais cuidadosas. Finalmente, há cerca de dez anos, a exemplo do que a região do Champagne tinha feito há décadas, as organizações do vinho do Porto (Instituto, empresas, produtores e Casa do Douro) entenderam lançar um copo novo e apropriado ao vinho do Porto. Encomendaram-no a Siza Vieira. Este fez algo de muito parecido com esta provadeira, com pequenas alterações no pé, na base e nas proporções. No essencial, é uma provadeira. (2006)

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Farmácia, Saúde e Sociedade


     NADA na minha vida anunciava que eu viria um dia dirigir-me a um Congresso dos Farmacêuticos! Na minha vida profissional, nas minhas funções passadas ou nas áreas em que tenho algum estudo, nada encontro que me aproxime da vossa profissão. Mesmo assim, certamente por bondade do vosso Bastonário, aqui me apresento depois de ter aceitado o seu amável convite, que tanto me honrou. Apesar do título (“Farmácia, Saúde e Sociedade”), o meu tema será sempre mais a sociedade do que a Farmácia.

Permitam iniciar com uma recordação ou uma alusão à longínqua época dos meus doze anos. A minha Tia Maria de Jesus era sócia de uma farmácia. A Farmácia Castro, na Régua. Era aí que eu passava longas tardes, durante o Verão, a ouvir as notícias, a ver os clientes, a arrumar medicamentos, por vezes mesmo a atender fregueses (como se dizia então...), devidamente supervisionado pelo senhor Coelho, o sócio e farmacêutico. Muita gente vinha a essa farmácia aviar receitas, mas também pedir conselhos e ajuda. Mais do que tudo, as pessoas vinham conversar, saber notícias, passar um pouco da tarde. Queixavam-se da saúde, da própria e da dos outros, mas era a conversa o género mais procurado. Uns analfabetos vinham mesmo pedir que lhes lessem cartas de longe. A Farmácia era um local de sociedade e convívio, de ajuda e reunião, de distracção e coscuvilhice... As pessoas tinham conta na Farmácia, pagavam ao mês. Ali se deixava recados e encomendas. Algum correio podia ser dirigido para ali. Foi ali que aprendi coisas que não me ensinavam em casa ou de que só se falava entre dentes e em murmúrio.

Já direi em breve por que razão entendi aludir a estas recordações. Antes, acrescento que, mal comecei a pensar nesta reunião, me lembrei imediatamente não só da Farmácia Castro, da Régua, como também das farmácias Almeida, Barreira, Baptista e Galeno, todas em Vila Real. Como é possível, com tantas falhas de memória próprias da minha idade, recordar tão bem as farmácias de Vila Real que deixei para trás há mais de cinquenta anos? Ao lado das farmácias, vou evidentemente encontrar a livraria, a pastelaria, o café... São os locais de iniciação e socialização e as instituições de aprendizagem.

Não me ouvirão fazer a defesa imobilista das velhas instituições e empresas, nem me ouvirão dizer que antigamente é que era bom e que hoje “tudo andou para trás”. Não seria verdade. As novas cidades, o novo comércio, as novas grandes instituições têm muito de bom e de eficaz. Mas nem sempre são melhores. Ou antes; nem sempre são só isso. Há muito que aprendi que o “progresso”, com aspas, nem sempre é progresso, sem aspas. Com a evolução tecnológica e organizativa, ganha-se muito, mas também se perde. Perde-se em humanidade, em contacto de qualidade com os outros, os vizinhos e até os familiares. Em tempos de crise, como os que vivemos hoje, as instituições humanas, as redes de relações de amizade e de família, as empresas civis, as comunidades locais e autárquicas e o universo associativo seriam ou podem ser excelentes amparos para os que vivem com dificuldades. E por mais eficazes que sejam as grandes instituições e empresas, nunca se conseguirá, creio, obter a qualidade humana que tanta falta faz a quem sofre ou necessita de ajuda.

Como é evidente, tudo isto vem muito a propósito das farmácias. São quase por definição instituições de pequena dimensão, descentralizadas, distribuídas pelos bairros, pelas cidades e pelas vilas. São empresas humanas e humanizadas. São instituições que vivem mergulhadas na sociedade e nas comunidades locais. São, em poucas palavras, mais do que empresas económicas e mais do que agências comerciais. Não conheço os problemas dos farmacêuticos e das farmácias, nem pretendo elogiar-vos só por estar na vossa presença, mas é este o papel das farmácias que desejo sublinhar, recordar e promover.

É verdade que há problemas das farmácias. Problemas jurídicos, legais, comerciais, institucionais e outros. Sobre eles pouco poderei dizer e seria muito oportunista fazê-lo aqui. Sei que as questões das margens legais e das dívidas do Estado estrangulam as farmácias. Sei que há graves perturbações no abastecimento de medicamentos motivadas por interesses ilegítimos e de que sofrem não apenas as farmácias, mas, em primeiro ligar, os cidadãos, os clientes e os doentes. Sobre esses problemas, as farmácias têm a minha simpatia. Não por razões de oportunidade, muito menos corporativas. Mas porque entendo que é relevante o papel das farmácias na qualidade de vida e na decência tanto das comunidades locais como das sociedades modernas.

Gostaria que as farmácias tivessem mais liberdade, mais autonomia e mais capacidade. E que fossem sempre instituições dos bairros onde estão instaladas. Mais uma vez, não é melancolia reaccionária. Não é nostalgia. É vontade e esperança de ver sociedades institucionalmente enriquecidas. Há países bem mais desenvolvidos do que Portugal, como os escandinavos ou os Estados Unidos, onde é frequente ver farmácias e outras empresas de bairro prosseguirem a desempenhar um papel crucial na organização das comunidades e na salvaguarda de valores humanos e humanistas. Com certeza que as grandes superfícies, as grandes lojas e as grandes cadeias de distribuição trouxeram vantagens, algumas vantagens. Mas também trouxeram inconvenientes. Nem tudo o que é moderno é progresso. Como disse acima, há muito progresso negativo.

Não se pense também que as farmácias pertencem a uns senhores e umas senhoras de grande idade, com pouca formação e reduzidos conhecimentos, em formato de velhos caciques locais, uma espécie de museu vivo de outras épocas! Bem pelo contrário! Fui ver os números e verifiquei que a rede de farmácias e a profissão de farmacêutico poderá mesmo ser do que de mais moderno existe. Ostentam dados bem na média europeia, seja na cobertura territorial, seja na cobertura da população. Estão, na Europa, entre as que mais farmacêuticos diplomados empregam.  São, em Portugal, um dos sectores proporcionalmente mais qualificados e mais jovens. Mais de um terço dos seus trabalhadores têm grau superior. Cerca de 40% têm menos de 35 anos e quase 70% têm menos de 45 anos! Tomaram muitos sectores económicos ou sociais do nosso país exibir dados semelhantes!

Mais ainda. Sem falar da dimensão social e de convívio de que falava acima, a rede de farmácias presta formidáveis serviços públicos não remunerados, não contabilizados, sem encargos para os cidadãos e sem custos para o Estado. A intervenção das farmácias e dos farmacêuticos directamente em programas e acções de grande envergadura, como sejam o acompanhamento na diabetes, a troca de seringas, a recolha de radiografias, a destruição de medicamentos fora de prazo, a vacinação e outras boas práticas permitem incalculáveis poupanças, mas sobretudo inestimáveis vantagens de cuidado e humanização.

Permitam-me alargar um pouco a reflexão. Os critérios e princípios que se aplicam às farmácias e ao seu papel na sociedade não são exclusivos deste sector de actividade. Bem pelo contrário. Em tempos tão difíceis como os que vivemos, é indispensável que as instituições humanas, sociais e civis estejam presentes, não sejam destruídas e sejam aproveitadas. Não são as repartições nem as grandes organizações que vão salvar, no dia-a-dia, as pessoas e as famílias. Ao lado da grande política e dos grandes dispositivos financeiros e legais, são as instituições humanas que tratam das pessoas. E são as mesmas instituições que devem ser chamadas a participar e colaborar no esforço colectivo. Nesta crise, cujo fim não se conhece, é cada vez mais evidente e necessário governar com os cidadãos, as empresas e as instituições. É cada vez mais importante partilhar os problemas e as soluções, evitando assim esta prática corrente dos últimos anos de tomar medidas como quem atira armas de arremesso contra as populações. Os últimos governos têm-se distinguido nessa especialidade, a de governar sem dizer nada antes nem durante, só depois.

            Faça-se a analogia. Pense-se que a rede de farmácias é também a rede de empresas, de instituições, de associações e de sociedades. Imagine-se o papel que poderão ou poderiam desempenhar na análise dos factores de crise, na detecção de situações difíceis, na procura de soluções razoáveis, mesmo duras, mesmo difíceis. Esta força interior poderia ser um travão dos erros de análise, previsão e cálculo tão frequentes. Como poderia ser um ser um antídoto para a falta de conhecimento da realidade. Lamento que o meu país esteja a receber ordens da maneira mais primitiva que se possa imaginar. Chegam brigadas de técnicos e especialistas organizar os sectores e as áreas de actividade, trazendo consigo ementas de serviços de grande qualidade e de enorme competência, mas destituídos de conhecimento, de sensibilidade e de contacto directo. Lamento que o meu país não tenha sabido evitar o ponto a que chegámos. Lamento que as nossas elites, os nossos partidos políticos e as nossas autoridades não tenham prevenido, nem saibam ou queiram cuidar. Lamento que possa parecer que não há outra solução que não seja a de receber instruções...

            Esta ligação das autoridades e dos governos à população revela-se essencial, não para suavizar ou repetir erros e dívidas, mas para melhor cuidar dos cidadãos e associá-los ao esforço comum. É tanto mais essencial quanto a confiança dos cidadãos na política, nos políticos, nas instituições e nas administrações públicas está em perigoso declínio. Estudos a publicar brevemente mostram que, em dez a vinte anos, a confiança dos cidadãos desceu de valores próximos dos 50% a 70% para níveis de 14% a 30%.

            Viver com as farmácias, jovens, competentes e próximas da população, pode ser uma metáfora para a política necessária para todo o país em tempos de crise.

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Congresso Nacional dos Farmacêuticos
Lisboa, 2 de Novembro de 2012

domingo, 4 de novembro de 2012

Luz - Vinhas no Douro, 2006

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Outra imagem de um conjunto de vinhas do Douro. As formas “gráficas” das vinhas são infinitas. Neste caso, sejam os taludes e respectivas vinhas na horizontal, sejam as vinhas “ao alto” denotam plantações recentes, talvez datando dos últimos vinte anos. (2006)