domingo, 24 de novembro de 2013

Luz - Um antigo mercado transformado em “Comes e Bebes” e “Gourmet”, Madrid

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Era um mercado do século XIX, em ferro, vidro, pedra e tijolo. Foi transformado e adaptado. Continua a ser mercado de produtos vários, a que se acrescentaram bares de toda a espécie, pequenos restaurantes rápidos, cafés, geladarias, pastelarias, etc. Lá encontrei, com surpresa, pastéis de nata ou de Belém, ameixas de Elvas, vinho do Porto, figos do Algarve, frutos secos e mais uma ou duas iguarias portuguesas. (2012).

domingo, 17 de novembro de 2013

Luz - Bares nas arcadas da Plaza Mayor, Madrid.

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A toda a volta desta magnífica praça, é possível encontrar bares interessantes. Em certos momentos do dia e em certos meses do ano, quando os passeantes e turistas não são às revoadas, esta praça é encantadora, discretamente majestática e ligeiramente austera. Mas, mesmo quando está cheia de gente, de vendedores ambulantes e artistas de toda a espécie, respira-se ali um ar de simpatia. Quem sabe se resulta da boa mistura da Áustria e da Espanha (2012).

terça-feira, 12 de novembro de 2013

Uma reflexão sobre a Reforma do Estado (*)


Por que razão o tema da Reforma do Estado é actual?



A primeira razão parece quase circunstancial: a crise financeira dos Estados, a dívida pública e a crise das dívidas soberanas fizeram com que seja necessário repensar e reorganizar a despesa e a receita do Estado, numa altura em que já não se pode, em Portugal como noutros países, continuar a simplesmente aumentar os impostos e recorrer ao crédito. Novas soluções têm de ser encontradas. E logo vieram ao espírito várias hipóteses: diminuir a despesa, cortar no investimento e nas prestações sociais, diminuir a dimensão do Estado, baixar os desperdícios, etc. Em poucas palavras, diminuir e organizar melhor o Estado. Isso é uma coisa. Reformar o Estado é outra. Falta saber se são possíveis ao mesmo tempo.



A segunda razão é porque se trata do principal objectivo da luta política contemporânea. Uma nova forma de luta de classes. Não é só luta de classes, nem é toda a luta de classes. Mas é boa parte. A traço grosso, temos, de um lado, os que querem um Estado forte, activo, interveniente, tão vasto ou mais do que hoje, motor de desenvolvimento, dirigente da nação e da economia; e, do outro lado, os que querem um Estado mais pequeno ou muito mais pequeno do que hoje, parceiro da sociedade civil, regulador, disciplinador, não interveniente, ligeiro e eventualmente fraco. Em quase todos os Estados desenvolvidos, mas também noutros em vias de desenvolvimento ou emergentes, encontramos o mesmo tipo de divisão e de confronto. É verdade que, em parte, mas apenas em parte, esta divisão recorta a antiga separação entre direita e esquerda. Mas não se trata apenas de uma cópia ou de uma modernização. Na verdade, ao longo das últimas décadas, é frequente encontrar forças de esquerda liberais, tal como movimentos de direita a favor do Estado. Bastaria quase olhar só para Portugal, onde já tivemos esquerdas dirigistas e intervencionistas, mas também esquerdas liberais. Como já tivemos direitas dirigistas e intervencionistas, tanto quanto as tivemos defensoras da sociedade civil. A nossa mais longa tradição é, aliás, a de uma direita amiga do Estado.



A terceira razão resulta do facto de pagar, gastar, distribuir e investir serem, nos tempos de hoje, as principais tarefas do Estado e os principais argumentos políticos e eleitorais. Os orçamentos de Estado, que não cessam de aumentar desde há várias décadas, traduzem cada vez mais essa prioridade. O Estado investe ou despende sempre mais na Saúde, na Educação, na Segurança social e nas obras e serviços públicos, sem falar nas outras funções de Estado e de Soberania, além da despesa crescente com a sua própria organização e seus funcionários. Sem poder gastar mais e distribuir melhor, nenhum poder político resiste ou atravessa vitoriosamente as eleições. Todos os Estados procuram, com mais ou menos relevo e significado, diminuir o fardo financeiro, a fim de poder melhor determinar a sua despesa. Mas a verdade é que a maior parte dos Estados desenvolvidos modernos chegaram ao ponto crítico de não poderem mais continuar a gastar, sob pena de abrirem crises sérias de endividamento ou mesmo de bancarrota. Alguns Estados viram e acudiram ao fenómeno, talvez a tempo, como certos Estados escandinavos, outros não viram ou não souberam acudir a tempo, como a Grécia, Portugal e a Espanha, por exemplo.



Mas há outros motivos. Actuais também, mas já com algumas décadas.



A globalização pôs o Estado em crise. Isto é, criou novas realidades económicas e financeiras e exigiu adaptações e mudanças. Ora, os Estados dos países desenvolvidos não estavam preparados e especialmente os Estados europeus contemporâneos nem sempre souberam reagir e responder. O Estado português muito menos. A economia mundial, o livre comércio e a desregulamentação de muitas actividades económicas e financeiras internacionais deixaram os Estados desarmados e impotentes. Só os Estados mais poderosos (nomeadamente os Estados Unidos, a Alemanha e a China…) conseguiram pôr a seu proveito as forças libertadas pela globalização, enquanto a maioria sofre as suas consequências.



A consolidação e o desenvolvimento da União europeia aprofundaram a crise do Estado nacional. A União revelou uma dificuldade surpreendente em se adaptar. Dai resultou a sua desorientação, ficando aquém da estrutura pré federal que alguns desejam, mas transformando os Estados nacionais numa espécie de parceiros locais de uma frágil estrutura internacional que ultrapassa os Estados, sobretudo os de pequena e média dimensão e de pouca força económica. Note-se bem: ultrapassa-os, sem lhes conferir solidez ou estabilidade. A consequência deste processo é evidente: a reforma do Estado, em conjugação com a da União, tornou-se necessária.



Chego assim à segunda parte da minha exposição.




Por que razões a Reforma do Estado é, em Portugal, necessária há várias décadas?




Para Portugal, todos os motivos acima explicam a contemporaneidade e a actualidade do tema, mas há outros motivos que nos dizem respeito. Há outras causas específicas que explicam a evolução do Estado português, os seus problemas e a necessidade crescente da sua reforma.



Após o 25 de Abril, o Estado português foi reorganizado de modo improvisado. À pressa, sem ideia nem objectivo. A democracia política instalou-se em cima de estruturas corporativas obsoletas, próprias de outras idades e de outros modos de governo. As estruturas democráticas combinaram com o anterior regime corporativo a que acrescentaram as liberdades, tendo também concertado com formas de governo e de administração forjadas precipitadamente durante a revolução de 1974/75. O resultado foi uma obra compósita, sem coerência.



O crescimento do Estado de protecção social foi muito acelerado depois de 1974 e fez aumentar a dimensão, o volume, a força, a decisão e o peso do Estado e da Administração Pública. Mesmo depois da reprivatização da economia e das empresas, iniciada nos anos 90 e prosseguida até hoje pelos dois maiores partidos, as dimensões do Estado administrativo não foram reduzidas. Dos menos de 200.000 funcionários dos anos 1960, chegámos aos 600.000 a 700.000 da última década. Esta dimensão não é necessariamente exagerada, quando comparada com os nossos parceiros europeus. Acontece que se tratou de um crescimento orgânico e demográfico, sem alteração consistente das formas de organização e das missões do Estado, tanto central como local. Por outro lado, a comparação com outros países desenvolvidos pode ser falaciosa. Na verdade, a semelhança de números esconde diferenças radicais no produto nacional, na organização e na produtividade.



A Constituição e as principais leis de base não criaram um Estado administrativo com novo espírito e critério, nem estabeleceram um novo modelo de organização. Algumas das grandes polémicas, controvérsias, ou dilemas foram sempre sendo adiados: o “Centro versus Região” e “Estado central versus Autarquia”, por exemplo, nunca encontraram verdadeiramente solução, nunca houve decisão claramente maioritária ou consensual. Donde resulta que a distribuição de poderes permaneceu instável e sujeita a evoluções de circunstância. Do mesmo modo, as responsabilidades dos titulares dos órgãos políticos nacionais e locais permaneceram incertas. Outro exemplo ainda de questão eternamente adiada é o do regime de acumulação de funções públicas e privadas dos agentes da Administração, cuja indefinição é fonte permanente de distorções. Certos aspectos fundamentais evoluíram, é certo, mas só na medida em que tal interessou circunstancialmente. Estão nesta situação, por exemplo: as capacidades eleitorais locais, o regime de referendo, os direitos de propriedade e de iniciativa privada, o âmbito do sector público empresarial, a autonomia das instituições públicas e os poderes da tutela de Estado sobre instituições privadas.



A verdade é que não é possível encetar com êxito um processo de reforma do Estado sem começar ou passar pela revisão da Constituição. O que torna tudo mais difícil. A Constituição e as leis de bases traçaram minuciosamente um sistema de defesas contra o autoritarismo, o caciquismo, o cesarismo, os vulgarmente chamados regimes fascistas e comunistas, o populismo de cariz militar e outros… A natureza equivoca e ambígua do sistema semi-presidencial é o melhor retrato desse sofisticado sistema de defesa, brilhante na construção, uma verdadeira obra-prima, mas que é fraco de carácter e defensivo na energia. Algumas das querelas antigas e que hoje são de novo virulentas, como entre os órgãos de soberania (entre o Parlamento, o Presidente da República e o Governo), ou entre os órgãos de soberania e os tribunais (com relevo para o Tribunal Constitucional), são o resultado directo e permanente da natureza híbrida do regime, do sistema constitucional e da natureza do Estado.



Toda a construção ou todo o desenvolvimento do Estado, desde os anos 1970, foram feitos nas circunstâncias acima descritas, com especial relevo para uma instituição: os partidos políticos. O fio condutor, os obreiros e os protagonistas do desenvolvimento do Estado e da Administração Pública, desde 1974, foram os partidos políticos. Foram subalternizadas outras instituições e entidades, como sejam o Parlamento, o Presidente da República, o Governo, as Regiões, as Autarquias, os Tribunais, as Forças Armadas, as empresas privadas, as universidades e outras.



A sociedade e a economia mudaram profundamente durante as últimas quatro a cinco décadas. A demografia alterou-se e o panorama populacional do país modificou-se drasticamente. A administração autárquica, local e regional, foi concebida para um país e uma sociedade que já não existem. As grandes metrópoles urbanas estão cada vez mais complexas e quase ingovernáveis, enquanto o interior despovoado continua a ser regido por sistemas desadequados. Mudaram as actividades, modificaram-se as empresas, deslocaram-se as pessoas, transformaram-se os recursos, alteraram-se drasticamente as vias de comunicação… mas as estruturas administrativas mantiveram-se quase inalteradas.



Recentemente, a crise financeira do Estado (e da sociedade) e o endividamento externo fizeram com que o Estado português ficasse refém dos seus credores, dos parceiros europeus mais poderosos e dos grandes interesses… Não é a melhor altura para proceder à Reforma do Estado. Aliás, a correcção conjuntural das finanças do Estado, apesar de indispensável, não pode ser confundida com a reforma estrutural do Estado. Esta pode e deve ser preparada, debatida e reflectida, mas qualquer urgência é sinal de fraqueza e de dependência! Em momentos de expansão económica e de estabilidade social e política, as querelas constitucionais esbatem-se e as deformações do Estado são aparentemente ultrapassadas pela euforia económica e social. Mas, em momentos de crise, as deficiências constitucionais avultam com carácter de urgência. Quando a crise é de endividamento internacional, de ameaça de bancarrota e de perda de autonomia de decisão, o “verniz estala” mais facilmente. Ora, é nesses momentos, quando são mais precisas, que a revisão da Constituição e a reforma do Estado são mais difíceis. Não só pela insuficiência de meios, mas também pela crispação entre partidos políticos. Os regimes de resgate financeiro e os deveres que lhes estão associados fizeram com que os “cortes” e as “supressões”, assim como as mudanças nos regimes laborais, se transformassem em substitutos para a reforma do Estado. Tal não deveria acontecer. As questões laborais não se devem sobrepor aos objectivos fundamentais da reforma de Estado.



Paradoxalmente, em resultado de toda esta evolução brevemente descrita, a reforma do Estado, aos olhos de muitas pessoas, tornou-se urgente. O Estado está fraco de mais, pesado de mais, vagaroso de mais, ineficiente de mais, capturado de mais por interesses particulares e dependente de mais de poderes estrangeiros e internacionais. Mas urgente não quer dizer de emergência. Urgente implica uma necessidade inadiável, mas a sua satisfação pode ser feita gradualmente, ao longo do tempo, com uma definição clara de objectivos, com uma estratégia política e com um calendário razoável. A pressa seria desaconselhada, sobretudo porque o Estado se encontra débil e dependente.



Esta debilidade ou esta crise do Estado português é agravada por outros fenómenos. O primado dos partidos políticos permitiu que a captura do Estado pelos interesses privados fosse facilitada. É através dos partidos políticos que grupos económicos, empresas, sindicatos, associações privadas, profissões e outros interesses retêm e possuem a capacidade política de regulação e legislação, assim como os favores económicos. É usual pensar que o “poder político”, em democracia, deve primar sobre o “poder económico”. Esta quase verdade consensual serve para justificar a acção livre dos agentes políticos e, por essa via, o privilégio acordado aos partidos políticos e a consequente submissão dos outros interesses sociais. Acontece que é em parte esse primado da política que serve a captura do Estado por interesses privados. Repito: é por intermédio dos partidos que os interesses privados detêm privilégios e poderes. Daqui não concluo que é necessário ou sequer aconselhável afastar os partidos. Não. Necessário é moderá-los. O que só pode ser feito com instituições democráticas sólidas. Evidentemente, não há democracia sem partidos políticos. Mas também não há democracia só com partidos como únicos agentes políticos.



A massificação da política, da economia e da cultura criou novos fenómenos sociais, culturais e políticos aos quais é necessário prestar atenção com olhar crítico. São os casos, por exemplo, das sondagens de opinião permanentes e da comunicação imediata em tempo real, que destruíram a noção de mandato democrático. Ou da fabricação de realidades virtuais que leva o debate público para fora das instituições políticas. Ou ainda da mercantilização do voto e dos processos eleitorais que transformou esses processos políticos em espectáculo encenado. Todos estes fenómenos destruíram uma boa parte do prestígio da profissão, da carreira e da função política, geralmente coincidente e adequada às estruturas do Estado nacional. A actividade política perdeu dignidade e reputação. O Estado hipotecado aos partidos e por eles detido é fonte de desprestígio da actividade política.



Quase quatro décadas de democracia, acrescentadas a quase cinco de autoritarismo, criaram um universo de contacto entre a vida privada e a pública e entre os interesses económicos e a função política. Por várias razões, não se procedeu a um desenho de fronteiras nítidas, nem se criaram mecanismos eficientes de avaliação e julgamento. Mau grado a aparência de força e autonomia, o Estado português é presa de interesses e forças sociais. Tanto partidos políticos, como grandes corpos profissionais ou grupos económicos. Mais do que a ilegalidade e a promiscuidade sua companheira, são a confusão legal e a acumulação legítima de funções e de interesses privados e públicos que distorcem e dominam a vida pública portuguesa.



Assim chego à terceira parte da minha exposição. Não tenho a veleidade de propor um programa completo, um roteiro ou um plano. Apenas me limito a uns pontos que desejo sublinhar.



Alguns contributos para a discussão pública sobre a Reforma do Estado em Portugal.




Convém nunca esquecer que se trata de um longo processo aberto à sociedade. Pode demorar anos e não se confunde com um calendário eleitoral. Nem com pagamento de dívidas ou resgate financeiro.



Reformar o Estado em democracia exige um plano, uma estratégia, um condutor e um consenso alargado. Como se pode imaginar, a dificuldade reside na necessidade de um consenso alargado (a não confundir com unanimidade) e na indispensabilidade de um condutor, de um dirigente ou de um piloto (pessoa, partido ou instituição). A direcção permite a eficácia, a unidade de orientação e a consistência. O consenso alargado permite, além das liberdades e da pluralidade, a persistência e a duração no tempo. De outro modo, teremos reformas aparentes e efémeras, logo seguidas de novas reformas levadas a cabo por outros protagonistas políticos, nomeadamente os partidos.



Por outro lado, como já disse, em tempos de crise financeira, não é aconselhável esperar demasiado de um esforço de reforma do Estado. Criar ou reformar um Estado sob ameaça de bancarrota e sob a pressão dos credores internacionais é tão errado e tão perigoso quanto criar ou reformar um Estado à custa de dívida e com base em benesses demagógicas. São necessários meios, que faltam. É precisa tranquilidade política, inexistente. É indispensável independência, ausente. É imprescindível a sinceridade política, em falha absoluta. Nenhum partido da oposição está disponível para se associar aos partidos da maioria, arcando também com as responsabilidades da situação actual. Nenhum partido do governo está preparado para ceder a sua posição, partilhando-a com outros. Nas actuais condições de excepcional crispação e de degradação das relações políticas e pessoais entre dirigentes partidários, nada parece favorecer a preparação dos consensos alargados necessários. Reformar em profundidade não parece possível actualmente. Preparar, estudar, debater, negociar… sim! Ora, todos podem e devem tomar iniciativas de reflexão e discussão: Parlamento, Governo, Presidente da República, Forças Armadas, partidos políticos, instituições, magistratura, universidades, profissões, associações e sindicatos.



Importa, por outro lado, considerar que a revisão profunda da Constituição é parte central da reforma. Não é possível imaginar que a reforma do Estado possa dispensar a revisão da Constituição. Os poderes dos órgãos de soberania, o sistema eleitoral, a relação entre Estado central e autarquia, a concepção da Administração Pública, o conceito de funcionário público, o desenho dos grandes serviços públicos de Saúde, Educação e Segurança social, a organização da Justiça e os direitos e os deveres das instituições e das empresas privadas são aspectos essenciais da reforma do Estado, mas a sua definição actual, que importa rever e alterar, reside na Constituição.



O Parlamento, o Governo e o Presidente da República, assim como inúmeras instituições privadas, poderiam criar grupos de reflexão e debate. Desde que alguém, Presidente da República, Presidente da Assembleia da República ou Primeiro-ministro, diga que vale a pena, que não é inútil. É a única maneira de evitar que a revisão da Constituição e a reforma do Estado se transformem em armadilhas. Que é o que está a acontecer!



Quanto aos conteúdos das reformas e da revisão, gostaria de distinguir alguns.



Considero útil a revisão profunda do sistema eleitoral, de modo a que as eleições não sejam utilizadas exclusivamente pelos partidos políticos e que os eleitos, partidários ou não, sejam pessoalmente responsáveis. Não se trata de pretender que um Parlamento feito de independentes seja mais eficiente e mais responsável que um Parlamento feito de grupos partidários. O mais importante é que haja mecanismos de moderação do poder inquestionável dos partidos e das suas direcções. A possibilidade de candidaturas independentes, locais ou de outra natureza, é sobretudo fértil, não porque se substitui aos partidos, mas porque os ameaça e os obriga a superiores critérios de honestidade e responsabilidade, assim como é a melhor maneira de abrir um partido à sociedade.



Outra mudança que se me afigura necessária é a liquidação dos restos do sistema de “confiança política” na Administração Pública, um dos graves factores do mau governo e de captura partidária. Com as devidas excepções, fundamentadas e em número reduzido, os cargos da Administração, particularmente os dirigentes da alta administração, deveriam todos ser exclusivamente preenchidos segundo critérios técnicos, científicos, profissionais, de carreira, de mérito pessoal, de dedicação e merecimento, em detrimento dos resquícios da “confiança política” ainda em vigor. O anterior sistema, aprovado pela unanimidade dos partidos, estabelecia que os mandatos dos Directores gerias e equiparadas cessava com as eleições e a tomada de posse do novo governo. Quer isto dizer, politizava e partidarizava legalmente a Administração Pública. Esta prática, absolutamente legal, foi um autêntico veneno durante décadas. O actual governo mudou o sistema, e bem, dando por terminada a “confiança política” plena e criando concursos, mas infelizmente admitindo ainda a escolha, pelo ministro, entre vários seleccionados através de concurso. Foi um progresso, mas evitou-se o melhor.

A este propósito, outra mudança se revela importante: é a velha questão da acumulação das funções privadas e públicas por parte dos agentes do Estado, nomeadamente na Saúde, na Educação, na Consultoria, nas Obras públicas, na peritagem financeira, no contencioso e no apoio jurídico… Apesar das regras existentes, mais complacentes do que severas, a acumulação é muito frequente e quase sempre legal, por via de regimes de excepção que se tornam gerais. Também por isso se torna imprescindível proceder a uma revisão profunda das funções de justiça, fiscalização, avaliação, regulação e prestação de contas, as mais frágeis e as mais críticas de todo o sistema político português.



Entre outras consequências dos novos métodos e dos novos princípios de organização da Administração Pública, avulta a da possibilidade de criar e desenvolver a capacidade científica e técnica do Estado que lhe permita estudar, avaliar, escolher e decidir com mais competência, mais isenção e menor intervenção dos interesses externos ou ocultos, sejam eles partidários ou de qualquer outro tipo. O recurso crescente do Estado a entidades exteriores à Administração (técnicas, cientificas, de consulta económica, de assessoria jurídica, etc.) parece ter tido mais inconvenientes (dependência, interesses particulares, submissão política…) do que vantagens. A verdade é que, hoje, parece termos diante de nós um Estado decapitado, ao qual foi retirada grande parte da competência técnica e científica. O recurso sistemático a empresas nacionais ou multinacionais de estudos, consultoria, aconselhamento, gestão, apoio jurídico, engenharia financeira e tantas outras empobrece o Estado, diminui a isenção das autoridades públicas, oculta os procedimentos e não assegura a independência e o rigor. É cada vez mais evidente que todas essas instituições demonstram e provam o que se lhes pede. A tal ponto que as mesmas entidades conseguem fazer estudos contraditórios.



Última observação: evidentemente que a reforma do Estado não dispensa, antes exige, a definição das novas fronteiras dos direitos e deveres dos cidadãos, das empresas, das instituições, das associações, das autarquias e do Estado, assim como o estabelecimento da nova organização administrativa e territorial do Estado, com a consequente revisão profunda dos sistemas ditos de subsidiariedade na Administração pública. Mas este objectivo parece poder ser aceite por todos, embora cada um tenha ideias diferentes sobre o seu conteúdo.



Para terminar. A reforma do Estado é obra de uma geração. Deveria ser gradual, reflectida e comum a uma parte importante das forças políticas, sociais e culturais. Não deveria ser arma de arremesso, nem emboscada, hoje eventualidades prováveis. Tudo milita, actualmente, para que essa obra não seja cumprida. A começar pela pressa de uns e a acabar na recusa de outros. Se ao menos os titulares dos órgãos de soberania soubessem reflectir e preparar o futuro! Se ao menos os dirigentes políticos quisessem levar a cabo tal empreendimento sem pensar apenas no orgulho narcisista! Se ao menos os partidos fossem capazes de fazer tantos sacrifícios quanto exigem deste nosso pobre povo!

(*) Instituto de Defesa Nacional
Lisboa, 6 de Novembro de 2013

domingo, 3 de novembro de 2013

Luz - Barcelona, Mare Magnum

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Nas docas dos Olímpicos. Toda esta região terá sido reconstruída, urbanizada e arranjada com os Jogos Olímpicos em vista. Um pouco como o nosso Parque das Nações, a pensar na EXPO. Ao contrário da área de Sevilha, onde se criou uma zona semelhante, preparada para a Exposição universal e que hoje parece estar abandonada ou degradada… esta parte de Barcelona parece atrair milhares de pessoas, há bares e restaurantes por todo o lado, locais de divertimento e lazer, etc. Não tenho a certeza que seja um longo, próspero e interessante futuro, mas lá se vai aguentando. Pelo menos, não parece lá haver pavilhões como os nossos, um que virou casino, outro, o de Portugal, que está abandonado e em início de degradação… (2012)