Diz-se “public utilities”. Em
português, não quer dizer a mesma coisa, mas diz tudo. Serviços e
infra-estruturas de serviços e facilidades para toda a gente. Inicialmente organizados
pelo Estado, ulteriormente geridos pelo mesmo ou por empresas privadas. Cada
país tem a sua solução. Mas é sempre a mesma coisa: serviços públicos.
Muita coisa pode entrar nesta
categoria: água, luz, electricidade, gás, telefone, correios, banda larga,
transportes, esgotos, resíduos, faróis e outros. Há quem inclua certos serviços
públicos especiais, como a saúde e a educação. Podem ser de gestão pública ou
privada, local ou nacional, em monopólio ou em mercado aberto. Fazem parte da
concepção moderna de país civilizado.
Estes serviços, em Portugal, começaram
por ser públicos. Uns mantiveram-se como tal, outros foram privatizados. Nada muito
diferente de outros países. A eficácia, a utilidade e a honestidade destes
serviços variam muito. Em tempos, a imprensa realizava uma espécie de ranking
em que classificava, segundo a opinião pública, cada serviço. Alguns,
aborrecidos com uma má classificação, esforçavam-se por melhorar, o que às
vezes conseguiam e nós ficávamos a ganhar.
Entretanto, com a privatização a
ajudar, mais a crise financeira e a compra e venda de empresas, sem falar na
concorrência e na voracidade de tanta gente, todas estas empresas se viraram
para a agressividade comercial. São dezenas de e-mails e telefonemas não
desejados que se recebem por mês em casa de cada um. Novos serviços, mais
pacotes, descontos aparentes, novos dispositivos, vantagens incríveis e brindes
inacreditáveis! No fim do dia, é sempre para vender mais mercadoria inútil,
fidelizar aberta ou furtivamente, instalar aplicações, adquirir uma nova “box”,
alargar o serviço para áreas inúteis e subtrair o cliente à empresa rival!
Uma moda recente é a dos serviços
de distribuição separados da produção e da assistência, o que exige escolhas
feitas pelos clientes, impostas por lei (dizem eles…), que logo anunciam
descontos e vantagens, mas que não têm uns nem outras. Rapazes e raparigas com
bilhetes de identidade vistosamente exibidos batem à porta, declaram que, “para
nosso bem”, vêm verificar as instalações e anunciam benefícios, mas que têm
sempre mercadoria para vender, regras absurdas e fidelizações ocultas! Para não
falar das “letras pequeninas” cheias de ratoeiras, nem das regras
incompreensíveis tanto para velhos analfabetos como para jovens doutorados!
Tentar esclarecer com os serviços
de assistência é inútil. Podemos esperar até meia hora a ouvir música idiota.
Quando a chamada é atendida, num Call Center da Covilhã ou de Cabo Verde, somos
informados que temos de fidelizar, que outro serviço tratará de nós, que é
necessário comprar mais um pacote ou mudar um tarifário! É inútil
queixarmo-nos. Ou porque não se sabe a quem. Ou porque os “provedores” estão ao
serviço da empresa, não de nós. Ou porque demoram. A análise das facturas é um
pesadelo. Informação inútil e excessiva, para que ninguém compreenda. Para
desmoralizar quem quer compreender. Ou obrigar toda a gente a desistir. Quando
há dupla facturação, ou contagem errada, é preciso primeiro pagar, depois
litigar, pagar inspecções (mesmo quando a culpa é deles…) e esperar. Meses…
Anos… Sorte nossa é quando recebemos a visita de um técnico ou assistente: a
gentileza e a perícia destroem o mito das máquinas e das competências digitais.
Algumas práticas destas empresas,
públicas ou privadas, são simplesmente ilegais. Como tanta gente lhes deve
emprego ou investimento, ninguém as castiga. Nem sequer se faz legislação que
proíba o assédio comercial.
Perceber o que “eles” fazem exige
tempo, sabedoria, paciência, letras, advogados e recursos. Quer isto dizer, esquecer.
Por outras palavras, dar milhões a ganhar às empresas. Privados ou públicos,
estes serviços teriam de responder, respeitar e servir. Não o fazem. E gabam-se
da sua agressividade. Uma coisa é certa: ninguém os desafia ou vigia!
DN, 12 de Março de
2017