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quinta-feira, 26 de fevereiro de 2009
quinta-feira, 19 de fevereiro de 2009
Migrações e Relações Internacionais
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O TEMA SUGERE IMEDIATAMENTE uma pergunta: quais são os nexos, as causas, os efeitos e as implicações existentes entre as migrações e as relações internacionais? A minha resposta simples é a seguinte: podem ser de toda a espécie, de intensas a inexistentes. As migrações podem, ou não, influenciar as relações internacionais. Estas podem, ou não, ter consequências nas migrações. Uma observação da história revela a existência de várias relações, de causa e efeito, num ou noutro sentido. Relações internacionais, entre dois ou mais países, dentro de uma ou mais regiões, podem conduzir a migrações casuais ou permanentes, como podem não ter especial influência nesses movimentos de população. Países ou grupo de países com relações intensas, nomeadamente económicas, ou até políticas, podem ser também o ponto de partida ou de chegada de fluxos migratórios volumosos, como podem desconhecer esse movimento de população. Inversamente, migrações humanas entre vários países e diversas regiões podem forjar um certo tipo de relações internacionais, de cooperação, como podem estar na origem de outros tipos de relações internacionais, de conflito. Como também podem ter reduzida influência no modo como se constroem e praticam as relações entre Estados. Em poucas palavras, posso concluir que não existe regra ou lei que estabeleça efeitos ou características permanentes e necessárias entre as migrações e as relações internacionais. Esta, a resposta simples. Como veremos mais adiante, a resposta pode ser bem mais complexa.
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Texto integral [aqui]
Luz - Casal a cavar
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Algures no Douro, por entre a vinha e o olival, numa pequena horta, um casal cava a terra, talvez plantando batatas. A cena tem uma espécie de beleza bíblica. Ou parece tirada de um “livro de horas” medieval. Mesmo com esse encanto, felizmente que existem hoje outras maneiras de tratar a terra. (1995).
domingo, 15 de fevereiro de 2009
Duas cidades, dois estilos
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O GOVERNO esforça-se. Desmultiplica-se em acções para acudir à crise. O elenco de medidas é vasto. Linhas de crédito bonificadas. Apoios às pequenas e médias empresas. Garantias de depósitos bancários, de crédito e de recurso a capitais. Tomadas de posição, pelo Estado, em empresas financeiras e outras. Apoios específicos às empresas exportadoras. E sobretudo investimento público em grandes obras polémicas (o TGV, o aeroporto...), inúteis (mais auto-estradas...) ou necessárias (reparação de escolas e de hospitais...). Cerca de 15.000 empresas terão já beneficiado dos apoios extraordinários. No sector social, o Governo está também activo e, aparentemente, generoso. Apoios à criação ou manutenção de emprego. Alargamento das condições de atribuição do subsídio de desemprego. E ajudas aos lares de idosos e às famílias com carências especiais. É possível que haja intenções políticas próprias do ano eleitoral. A estridência paralela (“Tirar aos ricos para distribuir à classe média”...) é demagógica e mancha a folha de serviços. Mas o esforço é real. Perante uma assembleia da Associação Nacional de Empresas Familiares, o secretário de Estado Castro Guerra, académico reputado e ponderado, enumerou, factualmente, sem oportunismo eleitoral, as medidas tomadas e os esquemas disponíveis para quem queira obter apoios e combater a crise.
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A MERA LISTA é impressionante. Mas sobram dúvidas. O Estado vem, mais uma vez, para ficar? A dependência das empresas e da sociedade civil aumenta? As escolhas de programas e de empresas foram as melhores? Todos os que merecem têm oportunidades iguais? Há sectores e empresas esquecidos? Os recursos são suficientes? Há fundos disponíveis e não utilizados? Estas medidas têm resultados a prazo, no futuro, ou limitam-se a adiar mortes certas? Há maneira de saber se os apoios são realmente aproveitados e não são desviados? Temos a certeza de que uma parte destes recursos não é simplesmente apropriada pelos predadores habituais? O que já está comprometido com a banca é perdido, recuperável, fértil, útil? Os investimentos públicos estão pensados da melhor maneira, com horizonte de médio e longo prazo? Ou é a corrida habitual atrás de pressões e de votos? Todo este esforço tem como principal objectivo mudar e transformar ou manter e preservar? As empresas ajudadas têm capacidade, inteligência, estratégia, vontade e condições para aproveitar os apoios e “dar a volta”? Vale a pena aumentar consideravelmente o défice público? Está alguém a pensar que tudo isto merece uma estratégia ou trata-se de acudir a fogos de modo indiscriminado? Aquele não era talvez o lugar para responder e esclarecer. Quanto mais não fosse, os empresários falam pouco. Não correm riscos. Não querem ficar sujeitos a represálias do governo. Não gostam de desvendar os seus problemas nem os seus segredos. Os economistas também não falam muito. Muitos dependem do governo. Uns ficam-se pelas teorias académicas. Outros são simples crentes de um qualquer paradigma e não perdem tempo com a análise empírica. E quase todos revelam uma imperial indiferença perante a urgente tarefa de esclarecer, com clareza, a população.
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POR ESTAS RAZÕES, o Parlamento é o local ideal para discutir e perceber. Nesse mesmo dia, a televisão relatava em directo, a partir da Assembleia da República, o debate sobre as questões económicas e, por inevitável consequência, o pacote de medidas tomadas pelo governo. O que se viu era confrangedor. De envergonhar qualquer cidadão. Governo e partidos esganiçavam e berravam, insultavam-se mutuamente, acusavam-se das piores selvajarias. Ninguém estava interessado em convencer ou esclarecer, fundamentar ou simplesmente reflectir. Todos se acham titulares de uma bula para dizer disparates e de uma dispensa de pensar. A menor das preocupações era a de pensar que a população poderia estar à escuta e a tentar perceber. Nem um só deputado, num total de 230, pensou em fazer um apelo ao entendimento, à cooperação entre alguns partidos, à convergência de esforços para encontrar soluções. Não se trata de esperar pela união nacional, mas muito seriamente de cooperar com vista a resolver alguns problemas causados pela maior crise económica e social das últimas décadas. Aqueles deputados têm os mesmos reflexos, os mesmos comportamentos e a mesma visão do mundo que um bando de hooligans em claques de futebol.
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ALI AO LADO, com um clique de televisão, tínhamos a possibilidade de ver o canal que transmitia o debate, no Senado americano, sobre o mesmo problema: ajuda e apoio à economia, programas sociais, intervenção colossal do Estado e políticas sociais de emergência. Os senadores falavam devagar, com razão, defendiam os seus pontos de vista, argumentavam. Tratavam-se delicadamente, com cerimónia. Diziam por vezes frases de enorme violência no conteúdo, nunca na forma. Mostravam que faziam um esforço para chegar a um qualquer ponto de cooperação. Aprovaram um pacote com 65 por cento dos votos. De ambos os lados, do sim e do não, havia democratas e republicanos. Ali, vota-se por nome e por Estado, não por partido, em bloco. Após dias ou semanas de intenso trabalho conjunto, conseguiram chegar a acordos suficientes para que as medidas e os dinheiros tenham uma qualquer eficácia. A legitimidade e a autoridade dos programas de emergência estavam assim garantidas. Ficámos a perceber mil vezes melhor a natureza, o alcance, o sentido e os objectivos das medidas americanas do que o programa português.
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UM ÚLTIMO ponto. Na assembleia de empresários acima referida, chegado o período de debate, alguém perguntou: “Em vez de pagar milhares de milhões com apoios às empresas, não seria melhor política o governo pagar as suas dívidas”? O secretário de Estado respondeu: “O Estado deve-lhe alguma coisa”? O empresário disse: “Por acaso, sim, mas não é esse o ponto. Quero é discutir a política geral”. À bruta, cruamente, o governante retorquiu: “Faça-me chegar ao gabinete o seu caso pessoal e logo se resolverá”. Assim não, senhor secretário de Estado.
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«Retrato da Semana» - «Público» de 15 de Fevereiro de 2009
O GOVERNO esforça-se. Desmultiplica-se em acções para acudir à crise. O elenco de medidas é vasto. Linhas de crédito bonificadas. Apoios às pequenas e médias empresas. Garantias de depósitos bancários, de crédito e de recurso a capitais. Tomadas de posição, pelo Estado, em empresas financeiras e outras. Apoios específicos às empresas exportadoras. E sobretudo investimento público em grandes obras polémicas (o TGV, o aeroporto...), inúteis (mais auto-estradas...) ou necessárias (reparação de escolas e de hospitais...). Cerca de 15.000 empresas terão já beneficiado dos apoios extraordinários. No sector social, o Governo está também activo e, aparentemente, generoso. Apoios à criação ou manutenção de emprego. Alargamento das condições de atribuição do subsídio de desemprego. E ajudas aos lares de idosos e às famílias com carências especiais. É possível que haja intenções políticas próprias do ano eleitoral. A estridência paralela (“Tirar aos ricos para distribuir à classe média”...) é demagógica e mancha a folha de serviços. Mas o esforço é real. Perante uma assembleia da Associação Nacional de Empresas Familiares, o secretário de Estado Castro Guerra, académico reputado e ponderado, enumerou, factualmente, sem oportunismo eleitoral, as medidas tomadas e os esquemas disponíveis para quem queira obter apoios e combater a crise.
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A MERA LISTA é impressionante. Mas sobram dúvidas. O Estado vem, mais uma vez, para ficar? A dependência das empresas e da sociedade civil aumenta? As escolhas de programas e de empresas foram as melhores? Todos os que merecem têm oportunidades iguais? Há sectores e empresas esquecidos? Os recursos são suficientes? Há fundos disponíveis e não utilizados? Estas medidas têm resultados a prazo, no futuro, ou limitam-se a adiar mortes certas? Há maneira de saber se os apoios são realmente aproveitados e não são desviados? Temos a certeza de que uma parte destes recursos não é simplesmente apropriada pelos predadores habituais? O que já está comprometido com a banca é perdido, recuperável, fértil, útil? Os investimentos públicos estão pensados da melhor maneira, com horizonte de médio e longo prazo? Ou é a corrida habitual atrás de pressões e de votos? Todo este esforço tem como principal objectivo mudar e transformar ou manter e preservar? As empresas ajudadas têm capacidade, inteligência, estratégia, vontade e condições para aproveitar os apoios e “dar a volta”? Vale a pena aumentar consideravelmente o défice público? Está alguém a pensar que tudo isto merece uma estratégia ou trata-se de acudir a fogos de modo indiscriminado? Aquele não era talvez o lugar para responder e esclarecer. Quanto mais não fosse, os empresários falam pouco. Não correm riscos. Não querem ficar sujeitos a represálias do governo. Não gostam de desvendar os seus problemas nem os seus segredos. Os economistas também não falam muito. Muitos dependem do governo. Uns ficam-se pelas teorias académicas. Outros são simples crentes de um qualquer paradigma e não perdem tempo com a análise empírica. E quase todos revelam uma imperial indiferença perante a urgente tarefa de esclarecer, com clareza, a população.
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POR ESTAS RAZÕES, o Parlamento é o local ideal para discutir e perceber. Nesse mesmo dia, a televisão relatava em directo, a partir da Assembleia da República, o debate sobre as questões económicas e, por inevitável consequência, o pacote de medidas tomadas pelo governo. O que se viu era confrangedor. De envergonhar qualquer cidadão. Governo e partidos esganiçavam e berravam, insultavam-se mutuamente, acusavam-se das piores selvajarias. Ninguém estava interessado em convencer ou esclarecer, fundamentar ou simplesmente reflectir. Todos se acham titulares de uma bula para dizer disparates e de uma dispensa de pensar. A menor das preocupações era a de pensar que a população poderia estar à escuta e a tentar perceber. Nem um só deputado, num total de 230, pensou em fazer um apelo ao entendimento, à cooperação entre alguns partidos, à convergência de esforços para encontrar soluções. Não se trata de esperar pela união nacional, mas muito seriamente de cooperar com vista a resolver alguns problemas causados pela maior crise económica e social das últimas décadas. Aqueles deputados têm os mesmos reflexos, os mesmos comportamentos e a mesma visão do mundo que um bando de hooligans em claques de futebol.
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ALI AO LADO, com um clique de televisão, tínhamos a possibilidade de ver o canal que transmitia o debate, no Senado americano, sobre o mesmo problema: ajuda e apoio à economia, programas sociais, intervenção colossal do Estado e políticas sociais de emergência. Os senadores falavam devagar, com razão, defendiam os seus pontos de vista, argumentavam. Tratavam-se delicadamente, com cerimónia. Diziam por vezes frases de enorme violência no conteúdo, nunca na forma. Mostravam que faziam um esforço para chegar a um qualquer ponto de cooperação. Aprovaram um pacote com 65 por cento dos votos. De ambos os lados, do sim e do não, havia democratas e republicanos. Ali, vota-se por nome e por Estado, não por partido, em bloco. Após dias ou semanas de intenso trabalho conjunto, conseguiram chegar a acordos suficientes para que as medidas e os dinheiros tenham uma qualquer eficácia. A legitimidade e a autoridade dos programas de emergência estavam assim garantidas. Ficámos a perceber mil vezes melhor a natureza, o alcance, o sentido e os objectivos das medidas americanas do que o programa português.
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UM ÚLTIMO ponto. Na assembleia de empresários acima referida, chegado o período de debate, alguém perguntou: “Em vez de pagar milhares de milhões com apoios às empresas, não seria melhor política o governo pagar as suas dívidas”? O secretário de Estado respondeu: “O Estado deve-lhe alguma coisa”? O empresário disse: “Por acaso, sim, mas não é esse o ponto. Quero é discutir a política geral”. À bruta, cruamente, o governante retorquiu: “Faça-me chegar ao gabinete o seu caso pessoal e logo se resolverá”. Assim não, senhor secretário de Estado.
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«Retrato da Semana» - «Público» de 15 de Fevereiro de 2009
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NOTA: O Jacarandá e o Sorumbático propõem-se premiar o melhor comentário que seja feito a este Retrato da Semana até às 20h de 20 Fev 09. O prémio pode ser visto [aqui].
Actualização (21 Fev 09 / 10h40m): ver a decisão do júri em "actualização" - [aqui]
quinta-feira, 12 de fevereiro de 2009
Luz - Operária têxtil
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Numa empresa moderna de têxtil e confecções, uma trabalhadora. (2006).
domingo, 8 de fevereiro de 2009
Os subterrâneos da democracia
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EXTRAORDINÁRIO, ESTE ANO de 2009! Um dos mais difíceis da história recente do país. Ainda por cima com eleições europeias, autárquicas e legislativas. Curiosamente, o peso das dificuldades é tal que as eleições parecem estar a anos de distância.
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A crise económica e financeira, com relevo especial para o fecho de empresas, os despedimentos e o desemprego, ocupa as atenções. Estas são partilhadas com a corrupção e a proliferação de negócios estranhos, com ou sem intervenção do governo. Antigamente, as crises criavam oportunidades e sobretudo gangsters. Hoje, os bandidos de sucesso e os golpes de génio financeiro provocam, eles, as crises. O terceiro tema que a todos prende é o da justiça. Quando há crise, negócios esquisitos e corrupção, logo a justiça é chamada a agir. Mas, em si mesma, tem sobejos motivos de apreensão: os seus desmandos, os atrasos, a vaidade judicial, as chicanas processuais e a quebra do segredo de justiça são suficientes para mobilizar as preocupações dos cidadãos. Já se percebeu que a justiça e a regulação são incapazes de resolver os problemas a tempo: são cada vez mais o lado inquietante do problema. Para muitos, desempregados ou vítimas, o desespero começa a ser uma realidade.
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A GRAVIDADE do que precede é tal que nem recordamos o facto essencial do ano: as eleições. Teoricamente, estas poderiam ser um instrumento de resolução. Debates sérios e veredicto popular poderiam seleccionar e ungir quem tem mais capacidades para deitar mãos à obra. Mas, com realismo, receia-se o pior: é bem possível que das eleições resulte um poder minoritário, partidos fragmentados e uma autoridade dispersa.
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As eleições europeias não interessam a ninguém. Não têm qualquer espécie de significado. Ou antes, têm-no cada vez menos, se tal é possível. Em tempos de ressurreição do proteccionismo, são um modelo de inutilidade. Já as outras, autárquicas e legislativas, são de real importância. Espera-se que sejam úteis. Com os ecrãs de nevoeiro criados pelas dificuldades presentes, poucos são os que pensam que as eleições poderiam ajudar. E delas não se ocupam. Mas há quem não pense noutra coisa. Os socialistas que querem castigar Sócrates e os social-democratas que se querem ver livres de Ferreira Leite estão activos e agitados. Não querem ganhar eleições, querem que os seus adversários internos as percam. Nos municípios, depois dos precedentes de há poucos anos, a tentação independente é fortíssima e alguns partidos vão conhecer problemas de monta. A situação social e os conflitos profissionais recentes vão levar muitos eleitores a comportamentos improváveis. Mais do que muitas outras, estas eleições são razoavelmente imprevisíveis. Parece tão difícil retirar o primeiro lugar aos socialistas como voltar a dar-lhes a maioria absoluta. Além disso, pouco se pode prever, muito ou tudo pode acontecer. Ora, as eleições servem para definir uma indispensável maioria de governo e seleccionar melhor pessoal político do que aquele que temos à disposição. Por isso, seria interessante que as atenções dos eleitores começassem a concentrar-se nos próximos sufrágios. Mas tal é difícil acontecer, já se viu porquê.
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NÃO SE PENSE, todavia, que nada está em preparação. Pelo contrário. Nos subterrâneos da democracia já se trabalha. Ouvem-se espadas e amolam-se facas. Decisões estão a ser preparadas. Escolhas estão a ser feitas. Não há congresso, convenção, seminário ou inauguração que não tenha isso em mente, mesmo se não explícito. As desculpas da crise e da corrupção servem para esconder a campanha em curso, pois ficaria mal, quando as populações sofrem, pensar em eleições. Mas esse tão especial momento, o da confecção das listas, já chegou. Os ajustes de contas adiados, no PS, no PSD e no CDS, começam por aí. Os chefes partidários que receiam perder querem deixar em legado, aos seus sucessores, grupos parlamentares fiéis e complicados. A simultaneidade das duas eleições permite combinar escolhas entre Parlamento e Câmaras. Figuras de enfeite estão a ser convidadas. Lá teremos, como sempre, candidatos que, se não forem ministros, fazem-se substituir e vão à sua vida.
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HÁ CADA VEZ MENOS pessoas a votar pela camisola ou por mera credulidade. Há cada vez mais quem faça contas à vida e decida livremente votar. Há quem não vote enquanto o sistema eleitoral for o que é: proporcional por lista, com grandes círculos anónimos e colectivos e sem compromisso pessoal. Outros, mesmo críticos do sistema, procuram sinais que os ajudem a decidir. Por exemplo, um bom critério é o de exigir que o candidato vencedor fará tudo o que for necessário para fazer ou compor um governo de maioria parlamentar. Quem tal não fizer e se esconda atrás das eternas declarações marialvas e covardes, deverá ser punido. Mas há outras exigências que se podem fazer aos candidatos, na falta de hábitos legais ou de comportamentos de honra. Nenhum candidato deveria ser admitido sem um compromisso público relativamente à seriedade do seu gesto, isto é, uma promessa irrefutável de que, depois de eleito, cumpre o seu mandato e não se retira para a sua vidinha. Os barões que concorrem para o currículo, ou na exclusiva esperança de virem a ser ministros, seriam assim afastados. De igual modo, a certeza de que um candidato, depois de eleito, nunca se deixará substituir, aumentaria a confiança que ainda se pode depositar numa eleição. Finalmente, a honestidade e a moralidade da nossa democracia poderia ser melhorada se um candidato prestasse juramento solene ou simplesmente prometesse: se for eleito, comportar-se-á sempre com independência pessoal, votará de acordo com a sua consciência e os seus compromissos pessoais e não prestará vassalagem à disciplina de partido, o mais infame costume do nosso parlamento. Tudo isto parece irrealista, mas é mais possível do que se julga. Por vezes, a honra substitui as más leis. Com vantagem.
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«Retrato da Semana» - «Público» de 8 de Fevereiro de 2009
EXTRAORDINÁRIO, ESTE ANO de 2009! Um dos mais difíceis da história recente do país. Ainda por cima com eleições europeias, autárquicas e legislativas. Curiosamente, o peso das dificuldades é tal que as eleições parecem estar a anos de distância.
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A crise económica e financeira, com relevo especial para o fecho de empresas, os despedimentos e o desemprego, ocupa as atenções. Estas são partilhadas com a corrupção e a proliferação de negócios estranhos, com ou sem intervenção do governo. Antigamente, as crises criavam oportunidades e sobretudo gangsters. Hoje, os bandidos de sucesso e os golpes de génio financeiro provocam, eles, as crises. O terceiro tema que a todos prende é o da justiça. Quando há crise, negócios esquisitos e corrupção, logo a justiça é chamada a agir. Mas, em si mesma, tem sobejos motivos de apreensão: os seus desmandos, os atrasos, a vaidade judicial, as chicanas processuais e a quebra do segredo de justiça são suficientes para mobilizar as preocupações dos cidadãos. Já se percebeu que a justiça e a regulação são incapazes de resolver os problemas a tempo: são cada vez mais o lado inquietante do problema. Para muitos, desempregados ou vítimas, o desespero começa a ser uma realidade.
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A GRAVIDADE do que precede é tal que nem recordamos o facto essencial do ano: as eleições. Teoricamente, estas poderiam ser um instrumento de resolução. Debates sérios e veredicto popular poderiam seleccionar e ungir quem tem mais capacidades para deitar mãos à obra. Mas, com realismo, receia-se o pior: é bem possível que das eleições resulte um poder minoritário, partidos fragmentados e uma autoridade dispersa.
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As eleições europeias não interessam a ninguém. Não têm qualquer espécie de significado. Ou antes, têm-no cada vez menos, se tal é possível. Em tempos de ressurreição do proteccionismo, são um modelo de inutilidade. Já as outras, autárquicas e legislativas, são de real importância. Espera-se que sejam úteis. Com os ecrãs de nevoeiro criados pelas dificuldades presentes, poucos são os que pensam que as eleições poderiam ajudar. E delas não se ocupam. Mas há quem não pense noutra coisa. Os socialistas que querem castigar Sócrates e os social-democratas que se querem ver livres de Ferreira Leite estão activos e agitados. Não querem ganhar eleições, querem que os seus adversários internos as percam. Nos municípios, depois dos precedentes de há poucos anos, a tentação independente é fortíssima e alguns partidos vão conhecer problemas de monta. A situação social e os conflitos profissionais recentes vão levar muitos eleitores a comportamentos improváveis. Mais do que muitas outras, estas eleições são razoavelmente imprevisíveis. Parece tão difícil retirar o primeiro lugar aos socialistas como voltar a dar-lhes a maioria absoluta. Além disso, pouco se pode prever, muito ou tudo pode acontecer. Ora, as eleições servem para definir uma indispensável maioria de governo e seleccionar melhor pessoal político do que aquele que temos à disposição. Por isso, seria interessante que as atenções dos eleitores começassem a concentrar-se nos próximos sufrágios. Mas tal é difícil acontecer, já se viu porquê.
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NÃO SE PENSE, todavia, que nada está em preparação. Pelo contrário. Nos subterrâneos da democracia já se trabalha. Ouvem-se espadas e amolam-se facas. Decisões estão a ser preparadas. Escolhas estão a ser feitas. Não há congresso, convenção, seminário ou inauguração que não tenha isso em mente, mesmo se não explícito. As desculpas da crise e da corrupção servem para esconder a campanha em curso, pois ficaria mal, quando as populações sofrem, pensar em eleições. Mas esse tão especial momento, o da confecção das listas, já chegou. Os ajustes de contas adiados, no PS, no PSD e no CDS, começam por aí. Os chefes partidários que receiam perder querem deixar em legado, aos seus sucessores, grupos parlamentares fiéis e complicados. A simultaneidade das duas eleições permite combinar escolhas entre Parlamento e Câmaras. Figuras de enfeite estão a ser convidadas. Lá teremos, como sempre, candidatos que, se não forem ministros, fazem-se substituir e vão à sua vida.
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HÁ CADA VEZ MENOS pessoas a votar pela camisola ou por mera credulidade. Há cada vez mais quem faça contas à vida e decida livremente votar. Há quem não vote enquanto o sistema eleitoral for o que é: proporcional por lista, com grandes círculos anónimos e colectivos e sem compromisso pessoal. Outros, mesmo críticos do sistema, procuram sinais que os ajudem a decidir. Por exemplo, um bom critério é o de exigir que o candidato vencedor fará tudo o que for necessário para fazer ou compor um governo de maioria parlamentar. Quem tal não fizer e se esconda atrás das eternas declarações marialvas e covardes, deverá ser punido. Mas há outras exigências que se podem fazer aos candidatos, na falta de hábitos legais ou de comportamentos de honra. Nenhum candidato deveria ser admitido sem um compromisso público relativamente à seriedade do seu gesto, isto é, uma promessa irrefutável de que, depois de eleito, cumpre o seu mandato e não se retira para a sua vidinha. Os barões que concorrem para o currículo, ou na exclusiva esperança de virem a ser ministros, seriam assim afastados. De igual modo, a certeza de que um candidato, depois de eleito, nunca se deixará substituir, aumentaria a confiança que ainda se pode depositar numa eleição. Finalmente, a honestidade e a moralidade da nossa democracia poderia ser melhorada se um candidato prestasse juramento solene ou simplesmente prometesse: se for eleito, comportar-se-á sempre com independência pessoal, votará de acordo com a sua consciência e os seus compromissos pessoais e não prestará vassalagem à disciplina de partido, o mais infame costume do nosso parlamento. Tudo isto parece irrealista, mas é mais possível do que se julga. Por vezes, a honra substitui as más leis. Com vantagem.
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«Retrato da Semana» - «Público» de 8 de Fevereiro de 2009
quinta-feira, 5 de fevereiro de 2009
Luz - Operárias têxteis
domingo, 1 de fevereiro de 2009
Ajudar quem
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CRISE ECONÓMICA. Crise financeira. Crescimento negativo. Recessão oficial. Crédito difícil. Falência de empresas. Bancos sem recursos. Apoio do Estado. Nacionalização de bancos em dificuldades. Apoios estatais extraordinários. Aumento do défice público. Obras públicas. Desemprego.
Estes são, há já várias semanas, os títulos das notícias. O desemprego parece ser a ameaça mais grave. Destrói a economia e a sociedade. Cria fenómenos individuais e familiares de enorme sofrimento. Deixa sequelas profundas nas pessoas e nas comunidades. Para além das mil e três receitas que os Estados e os economistas inventam, tantas delas sem destino nem viabilidade, os desempregados deveriam estar à cabeça de todas as preocupações. Não apenas por dó, conforto e solidariedade, mas também por outras razões. A paz social e a recuperação económica. E a dignidade humana.
Nestes períodos de dificuldade, perde-se rapidamente a cabeça com programas de salvação, quantas vezes a pensar mais nas eleições do que na sociedade. Há muito dinheiro dos contribuintes a circular, mas não se sabe bem aonde ele vai parar. Salvam-se bancos e empresas, talvez, mas perdem-se vidas e famílias, provavelmente. Recompensam-se criminosos, mas castigam-se vítimas. Confortam-se especuladores, mas ameaçam-se os que poupam. Fazem-se auto-estradas, mas não há quem nelas circule. Por entre planos sofisticados, ficam a ganhar os técnicos e os burocratas, mas perdem os desempregados e os pobres.
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A RIGIDEZ da burocracia e da legislação elimina hipóteses de intervenção com bons resultados para a sociedade, a economia e os necessitados. A megalomania das administrações e dos tecnocratas leva-os a produzir planos e programas que, no papel, gastam milhões e empregam milhares, mas que geralmente não respondem, ou respondem mal, às necessidades imediatas. Os desempregados que recebem para ficar em casa deveriam ter a oportunidade de fazer algo de útil para a sociedade e para a sua dignidade pessoal. Os reformados com possibilidade de colaborar deveriam ser organizados para prestar serviços úteis, solidários e até produtivos. Os subsídios concedidos a quem sabe movimentar-se agilmente na selva dos fundos deveriam ter, em tempos de crise, outra “filosofia” e estarem destinados directamente a quem precisa e a quem sabe dar-lhes um destino genuíno, não necessariamente as inaugurações preparadas para a televisão.
Deveria ser fácil e expedito encontrar soluções que travassem a caminhada inexorável para a falência e a perda definitiva de emprego. Reduzir a produção, encerrar as empresas alguns dias por semana e diminuir temporariamente os salários deveriam ser aceites por trabalhadores, sindicatos, patrões e Estado. Contratar “precários” em condições especiais deveria ser simples. Tudo isto, evidentemente, desde que os empresários fossem honestos, falassem com os trabalhadores e dessem o exemplo.
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A ADMINISTRAÇÃO deveria ter já organizado acções excepcionais que fizessem bem aos desempregados e aos pobres, mas que garantissem uma qualquer utilidade social. Áreas não faltam. Apoio aos lares de idosos, acompanhamento de velhos e doentes, cuidado de crianças em creche. Transporte e deslocação de pessoas carenciadas. Limpeza, reparação e manutenção do património. Classificação de arquivos e documentos. Protecção e vigilância das florestas. Tratamento e amparo dos “sem abrigo”. Reparação e calcetamento de ruas. Vigilância dos museus (parcialmente fechados por falta de verba...). Abertura de monumentos e bibliotecas até horas mais tardias. Obras locais nos jardins e parques. Acompanhamento de actividades desportivas juvenis. Transporte escolar. Apoio às actividades das organizações não governamentais e de solidariedade. O que não falta são necessidades.
Ontem, neste jornal, José Pacheco Pereira escreveu sobre estes problemas e evoca em particular a questão do desemprego e dos mecanismos do Estado providência que melhor conhecemos, os que integrariam o “modelo social europeu”. Sublinha em particular, com toda a razão, um enviesamento deste “modelo”: parece estar feito para proteger melhor os que já têm alguma segurança. O emprego precário, sem as protecções habituais da legislação excessivamente rígida, é combatido pelos sindicatos e por certos partidos, mas é visto por muitos desempregados como uma verdadeira salvação. Em períodos de crise como a actual, seriam úteis dispositivos de toda a espécie que permitissem que as actividades e os empregos a criar durante os períodos difíceis fossem abrangidos por novas regras. Os abusos podem ser muitos, mas é melhor corrigir depois do que deixar o vazio. O subsídio de desemprego deveria estar ligado a trabalho, mesmo que não seja emprego.
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QUANDO HÁ fundos à disposição dos pobres, dos desempregados, dos marginalizados e dos excluídos, assim como quando há recursos orientados para o desenvolvimento, as perguntas que logo surgem ao espírito são conhecidas. Será que esses recursos chegam realmente onde importa? As mulheres e os homens do campo, das fábricas e dos serviços receberão alguma parte dos benefícios existentes? As pequenas e médias empresas que geram emprego com mais flexibilidade e mais rapidez que os grandes conglomerados estão realmente no fim da linha dos fluxos de dinheiros? Os apoios aos pobres, aos desempregados e aos idosos alcançam efectivamente aqueles a que estão destinados? Essas ajudas são instrumentos de recuperação e de recomeço de vida ou, pelo contrário, reforçam a humilhação dos destituídos e dos desempregados?
Há muitos anos que se sabe que grande parte desses fundos fica pelo caminho. Trabalhos muito sérios das Nações Unidas, do Banco Mundial e da União Europeia mostram que, desde os anos setenta, grande parte da ajuda fica entre as mãos dos burocratas, dos políticos e de uma longa fileira de oportunistas que se colocam estrategicamente entre doadores e necessitados. Noutros casos, são os próprios agentes de desenvolvimento, nacionais ou estrangeiros, que retiram uma quota-parte considerável. Há ainda situações em que a ajuda de emergência, cheia de boas intenções, destrói agricultores, artesãos e empresas incapazes de competir com bens de caridade. É sempre assim: a pobreza de muitos aguça a esperteza de alguns.
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«Retrato da Semana» - «Público» de 1 de Fevereiro de 2009
CRISE ECONÓMICA. Crise financeira. Crescimento negativo. Recessão oficial. Crédito difícil. Falência de empresas. Bancos sem recursos. Apoio do Estado. Nacionalização de bancos em dificuldades. Apoios estatais extraordinários. Aumento do défice público. Obras públicas. Desemprego.
Estes são, há já várias semanas, os títulos das notícias. O desemprego parece ser a ameaça mais grave. Destrói a economia e a sociedade. Cria fenómenos individuais e familiares de enorme sofrimento. Deixa sequelas profundas nas pessoas e nas comunidades. Para além das mil e três receitas que os Estados e os economistas inventam, tantas delas sem destino nem viabilidade, os desempregados deveriam estar à cabeça de todas as preocupações. Não apenas por dó, conforto e solidariedade, mas também por outras razões. A paz social e a recuperação económica. E a dignidade humana.
Nestes períodos de dificuldade, perde-se rapidamente a cabeça com programas de salvação, quantas vezes a pensar mais nas eleições do que na sociedade. Há muito dinheiro dos contribuintes a circular, mas não se sabe bem aonde ele vai parar. Salvam-se bancos e empresas, talvez, mas perdem-se vidas e famílias, provavelmente. Recompensam-se criminosos, mas castigam-se vítimas. Confortam-se especuladores, mas ameaçam-se os que poupam. Fazem-se auto-estradas, mas não há quem nelas circule. Por entre planos sofisticados, ficam a ganhar os técnicos e os burocratas, mas perdem os desempregados e os pobres.
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A RIGIDEZ da burocracia e da legislação elimina hipóteses de intervenção com bons resultados para a sociedade, a economia e os necessitados. A megalomania das administrações e dos tecnocratas leva-os a produzir planos e programas que, no papel, gastam milhões e empregam milhares, mas que geralmente não respondem, ou respondem mal, às necessidades imediatas. Os desempregados que recebem para ficar em casa deveriam ter a oportunidade de fazer algo de útil para a sociedade e para a sua dignidade pessoal. Os reformados com possibilidade de colaborar deveriam ser organizados para prestar serviços úteis, solidários e até produtivos. Os subsídios concedidos a quem sabe movimentar-se agilmente na selva dos fundos deveriam ter, em tempos de crise, outra “filosofia” e estarem destinados directamente a quem precisa e a quem sabe dar-lhes um destino genuíno, não necessariamente as inaugurações preparadas para a televisão.
Deveria ser fácil e expedito encontrar soluções que travassem a caminhada inexorável para a falência e a perda definitiva de emprego. Reduzir a produção, encerrar as empresas alguns dias por semana e diminuir temporariamente os salários deveriam ser aceites por trabalhadores, sindicatos, patrões e Estado. Contratar “precários” em condições especiais deveria ser simples. Tudo isto, evidentemente, desde que os empresários fossem honestos, falassem com os trabalhadores e dessem o exemplo.
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A ADMINISTRAÇÃO deveria ter já organizado acções excepcionais que fizessem bem aos desempregados e aos pobres, mas que garantissem uma qualquer utilidade social. Áreas não faltam. Apoio aos lares de idosos, acompanhamento de velhos e doentes, cuidado de crianças em creche. Transporte e deslocação de pessoas carenciadas. Limpeza, reparação e manutenção do património. Classificação de arquivos e documentos. Protecção e vigilância das florestas. Tratamento e amparo dos “sem abrigo”. Reparação e calcetamento de ruas. Vigilância dos museus (parcialmente fechados por falta de verba...). Abertura de monumentos e bibliotecas até horas mais tardias. Obras locais nos jardins e parques. Acompanhamento de actividades desportivas juvenis. Transporte escolar. Apoio às actividades das organizações não governamentais e de solidariedade. O que não falta são necessidades.
Ontem, neste jornal, José Pacheco Pereira escreveu sobre estes problemas e evoca em particular a questão do desemprego e dos mecanismos do Estado providência que melhor conhecemos, os que integrariam o “modelo social europeu”. Sublinha em particular, com toda a razão, um enviesamento deste “modelo”: parece estar feito para proteger melhor os que já têm alguma segurança. O emprego precário, sem as protecções habituais da legislação excessivamente rígida, é combatido pelos sindicatos e por certos partidos, mas é visto por muitos desempregados como uma verdadeira salvação. Em períodos de crise como a actual, seriam úteis dispositivos de toda a espécie que permitissem que as actividades e os empregos a criar durante os períodos difíceis fossem abrangidos por novas regras. Os abusos podem ser muitos, mas é melhor corrigir depois do que deixar o vazio. O subsídio de desemprego deveria estar ligado a trabalho, mesmo que não seja emprego.
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QUANDO HÁ fundos à disposição dos pobres, dos desempregados, dos marginalizados e dos excluídos, assim como quando há recursos orientados para o desenvolvimento, as perguntas que logo surgem ao espírito são conhecidas. Será que esses recursos chegam realmente onde importa? As mulheres e os homens do campo, das fábricas e dos serviços receberão alguma parte dos benefícios existentes? As pequenas e médias empresas que geram emprego com mais flexibilidade e mais rapidez que os grandes conglomerados estão realmente no fim da linha dos fluxos de dinheiros? Os apoios aos pobres, aos desempregados e aos idosos alcançam efectivamente aqueles a que estão destinados? Essas ajudas são instrumentos de recuperação e de recomeço de vida ou, pelo contrário, reforçam a humilhação dos destituídos e dos desempregados?
Há muitos anos que se sabe que grande parte desses fundos fica pelo caminho. Trabalhos muito sérios das Nações Unidas, do Banco Mundial e da União Europeia mostram que, desde os anos setenta, grande parte da ajuda fica entre as mãos dos burocratas, dos políticos e de uma longa fileira de oportunistas que se colocam estrategicamente entre doadores e necessitados. Noutros casos, são os próprios agentes de desenvolvimento, nacionais ou estrangeiros, que retiram uma quota-parte considerável. Há ainda situações em que a ajuda de emergência, cheia de boas intenções, destrói agricultores, artesãos e empresas incapazes de competir com bens de caridade. É sempre assim: a pobreza de muitos aguça a esperteza de alguns.
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«Retrato da Semana» - «Público» de 1 de Fevereiro de 2009
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