SARAH ADAMOPOULOS seleccionou um pouco mais de trinta pessoas a quem pediu para contarem um pouco da sua experiência de criança. Este é o resultado. Atraente e estranho. Não se trata de uma amostra representativa. São escolhas de Sarah, feitas, creio, ao ritmo e à circunstância de amizades, conhecimentos, camaradagens e afinidades. Muitos deles vêm das letras e das artes. Valem por eles, não valem por universos estatísticos. Mas têm comunidade de experiência e de recordação. A felicidade, em primeiro lugar. Quase todos os entrevistados tiveram infâncias felizes. Depois, vem o espaço, que é uma maneira de sentir a liberdade. Referem os espaços largos da infância e queixam-se da falta de espaço, hoje, o que também quer dizer falta de liberdade. A descoberta do mundo, a seguir. E a descoberta dos outros. Para quase todos, eram tempos em que os pais davam o exemplo e ensinavam coisas, enquanto as mães davam afectos. Vindos de meios cultivados, aprenderam artes e letras: com os pais ou em escolas privadas, nesta que é mais uma revelação da miséria cultural da nossa escola de ontem e de hoje.
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Nem todos estes relatos são iguais. Seria injusto dizê-lo. E pouco objectivo. São histórias diferentes e circunstâncias variadas. E diversos os estilos e os factos. Mas quase todos têm um traço comum: uma infância feliz! Por outras palavras, tempos doces e despreocupados. O carinho dos pais. A atenção dos professores. A revelação da escola. Os jogos e as brincadeiras. Um mundo a descobrir.
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É preciso reconhecer: são clichés! Podem ser verdade: os clichés não são geralmente errados. Mas é certo que são só uma parte dos factos. São o fruto de escolhas contemporâneas e da memória actual. Com certas recordações, não se está a ajustar contas com o passado, mas sim com o presente. O que parece estar em causa é o que se não tem hoje, não o que se tinha ontem. Estes relatos valem mais pelo que se tem ou não tem como adulto, do que pelo que se era ou não era como criança.
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Não creio que exista período da vida mais insólito, para não dizer mais duro ou difícil, do que a juventude, incluindo nesta a infância e a adolescência. As ambições são desmedidas. Os medos permanentes. Os atrevimentos excessivos. O capricho e o amuo são regras de vida. Pensam-se e fazem-se tontarias. Sofre-se, em igual medida, com o amor e a falta dele. Fantasia-se, deseja-se e receia-se o sexo de que se não percebe nada. Os pais nunca compreendem. Os irmãos são sempre incómodos. Vive-se quase sempre à beira do desespero. O egoísmo e a inveja são leis. A contradição é um modo de vida: é na juventude que se encontra a mais completa combinação de crueldade e doçura. E nada disto impede que os jovens sejam também generosos, disponíveis, curiosos e criativos. É neste caos que, muitas vezes, nasce a revolta. Que é o melhor que a juventude traz.
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Sempre tive dificuldade em perceber por que razão as pessoas se reclamam de uma infância feliz. Ou por que motivo apagam as memórias das dificuldades e elegem apenas as da felicidade. Porque sentem as pessoas tanta necessidade de exibir uma juventude encantadora, feliz, mágica? Quando ouço ou leio relatos de infância e juventude, estou sempre à espera dos sentimentos previsíveis. Não tinha o que queria, nunca tinha tudo o que queria. Sentia-se fechado, preso e abafado, tinha vontade de partir, de ir para longe. Os adultos não compreendiam. Os pais não se abriam e não explicavam dúvidas e problemas. Doces, não eram um modelo. Severos, eram odiosos. Os adultos mentiam, omitiam ou proibiam, geralmente sem explicar porquê. Era assim, porque era assim. Rapazes e raparigas, sem conhecimento nem experiência, percebiam-se mal uns aos outros. Zangas e lutas eram tão desmesuradas quanto os desejos e as paixões.
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Fico à espera de ler e ouvir esses sentimentos, mas são raros, muito raros, as testemunhas que os transmitem. O essencial dessas recordações é o que constrói a “infância dourada” e a “juventude feliz”. Mas, quando falo discretamente com eles, sem os pais por perto, sem outras presenças, o que me dizem (quando dizem, do fundo da sua insondável reserva...) em nada se parece com esse período mágico e leve que recordam os seus pais e de que eles seguramente falarão dentro de trinta anos. Contam-me (quando me contam...) a insatisfação e a frustração. Queixam-se da falta de liberdade e de meios. Lamentam a incompreensão dos adultos. Mudam com frequência de projectos e de ambições. Garantem-me que a juventude deles é pior e muito mais difícil do que a dos seus pais. É muito fácil assegurarem que não têm futuro. Ou que este é sem esperança.
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É natural que assim seja. As cabeças não estão organizadas, os sentimentos muito menos. Sabe-se pouco. É-se forçado a entrar na vida dos outros, dos adultos, dos que têm poder sobre eles. Já se quer parecer grande, mas não se consegue. Vive-se quase sempre em competição. Os adultos avaliam tudo. É nesta altura que mais espaços se antevêem, mais possibilidades se adivinham, mas é também nesse tempo que se aprendem os limites, as fronteiras, os termos dos direitos, o peso dos deveres. Cada ano que passa, da infância à adolescência, é mais um ano de interditos e de obrigações. Não podia deixar de ser de outra maneira, mas essa é uma aprendizagem dura. A minha experiência diz-me que a infelicidade e a felicidade preencheram a minha juventude em quantidades exageradas. Ora uma, ora outra. Simultânea e sucessivamente.
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Nunca saberemos exactamente se as recordações que Sarah Adamopoulos recolheu são verdadeiras ou não. Podemos confiar nela, que não inventou. Mas não sei se podemos confiar neles, que recordaram. Alguns testemunhos deixam eles próprios as dúvidas. Eu próprio conheço isso. Tenho recordações vivíssimas de factos passados com os meus três a sete anos. Lembro-me das circunstâncias, das roupas, da luz do dia, dos ruídos e até dos cheiros. Estou a ver a minha mãe, no Porto, em 1945, a calafetar as janelas com cortinas, jornais e cobertores, pois havia exercícios de prevenção e era necessário esconder as luzes de improváveis aviões inimigos. Lembro-me de um médico, tinha eu três anos, a limpar-me a cabeça de um horroroso eczema. Ainda hoje sei como eram as senhas do racionamento que durou até aos meus seis ou sete anos. Lembro-me do meu primeiro acidente, tinha eu três anos, que me deixou uma marca na mão para toda a vida. Lembro-me de ter querido sovar um irmão através de uma janela e de ter apenas conseguido cortar as minhas veias. Recordo o modo como, com os meus irmãos armados em cow-boys, quase queimámos vivo o Mário, que era o nosso índio. Será realmente que me lembro disto tudo? Não será que são memórias feitas mais tarde, ao ouvir histórias? André Gago, nesta colectânea, resume bem o problema: “Talvez não passe de uma fantasia, isto de pretender ter recordações de uma altura da vida a qual se diz ser impossível ser recordada. Mas, se não é uma recordação, é uma fantasia bem urdida”.
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Um dos indícios mais certeiros de que a memória da infância é um ajuste de contas com o presente reside no facto de quase todos os testemunhos fazerem, directa ou indirectamente, implícita ou explicitamente, a comparação das juventudes do seu tempo com as de hoje. Rogério Ribeiro diz simplesmente: “As crianças não tinham então o poder que têm hoje sobre os pais”! E Rui Reininho não tem dúvidas em afirmar que as crianças do seu tempo tinham menos liberdade e menos oportunidades: “Hoje é tudo mais agradável”! Já António Vitorino de Almeida tem a certeza de que “Antigamente, a infância era infinitamente melhor”! E Baptista Bastos, quando recorda Lisboa de há várias décadas, surpreende-nos: “A cidade nessa época era muito afectuosa. Tenho a memória de uma cidade que me inspirava um profundo afecto...”.
Creio que estão todos a falar de hoje, claro.
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Na minha experiência e numa visão simplificada, os adultos dividem-se em duas grandes categorias. Por um lado, os que dizem que os jovens, no seu tempo, eram mais cultos, mais empenhados, tinham “causas” e trabalhavam, enquanto os de hoje são uns valdevinos, inúteis, superficiais, sem valores, preguiçosos e abúlicos. Por outro, os que garantem que os jovens de hoje são autênticos génios, sabem tudo, têm tudo, são autónomos, portam-se como gente grande, têm uma visão do mundo e são quase enciclopédicos, enquanto os do seu tempo eram amorfos, oprimidos, viviam como numa reserva, limitavam-se a obedecer e quase não tinham existência. O que é realmente interessante é que não têm razão. Nem uns, nem outros.
domingo, 31 de agosto de 2008
Tão felizes que éramos!
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Prefácio de «Infância, quando eles eram pequeninos», Sarah Adamopoulos - Nelson de Matos, Lisboa 2008.
quinta-feira, 28 de agosto de 2008
Luz - Tomar - Aqueduto
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Aqueduto construído pelos monges há quatro ou cinco séculos, para abastecer o convento, o mosteiro e a cidade de Tomar. Os locais chamam-lhe os “Pegões”, como noutras partes do país. É um magnífico aqueduto, muito bem conservado. (1995).
domingo, 24 de agosto de 2008
Aniversário do incêndio do Chiado
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A RECUPERAÇÃO DO CHIADO teve boas e más soluções. Mas o problema não é apenas, nem sobretudo, o do gosto. É o do ambiente geral que se vive no centro da cidade. A noite do Chiado é de abandono, a sugerir um princípio de vida marginal. Ao fim-de-semana, a “cena” repete-se. Como, aliás, em grande parte da Baixa pombalina. O que se passa neste centro histórico é lamentável.
As causas têm de ser encontradas em questões mais gerais: a lei das rendas, a especulação, os horários dos comércios, o privilégio aos centros comerciais, a prepotência camarária... Tudo foi muito mais grave do que o incêndio!
Daqui a vinte anos, gostaria de ver um Chiado com residentes, rendas livres, mais emprego, divertimentos e comércio aberto dia e noite”.
As causas têm de ser encontradas em questões mais gerais: a lei das rendas, a especulação, os horários dos comércios, o privilégio aos centros comerciais, a prepotência camarária... Tudo foi muito mais grave do que o incêndio!
Daqui a vinte anos, gostaria de ver um Chiado com residentes, rendas livres, mais emprego, divertimentos e comércio aberto dia e noite”.
«Expresso» de 23 de Agosto de 2008
quinta-feira, 21 de agosto de 2008
Luz - Uma vinha nova em socalcos modernos.
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.Nas extremas, podem ver-se socalcos e patamares mais antigos. Nestes socalcos modernos, deve assinalar-se o facto de muitos deles estarem amparados por muros antigos, daqueles que já quase se não fazem hoje. Em cada socalco, apenas dois “bardos”, duas filas de videiras devidamente aramadas. A grande distância entre os dois bardos é feita em previsão da passagem das máquinas. Esta vinha parece excepcionalmente bem tratada. (2007).
domingo, 17 de agosto de 2008
As referências na criação
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NINGUÉM É ABSOLUTAMENTE ORIGINAL. Ninguém cria a partir do nada. Criar começa por ser “acrescentar qualquer coisa”. Um olhar, um facto, uma interpretação ou uma composição. Mesmo as “revoluções”, estéticas, filosóficas ou científicas, têm como ponto de partida a vontade de romper e de renovar os termos das questões anteriores.
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As escolas, os estilos, as correntes de pensamento e as modas fazem-se por sucessivos desenvolvimentos, por acrescentos e variações ao que estava previamente adquirido. Quando ocorrem rupturas ou fundações, os seus responsáveis não estão libertos das ferramentas anteriores, da linguagem, das formas de expressão ou do saber acumulado. No século XX, artistas, pensadores e cientistas multiplicaram-se em rupturas e criação de novos “paradigmas”. Por vezes, fizeram-no de modo abrupto, com violência na destruição do que os antecedia. Mesmo assim, não dispensavam filiações de método ou de inspiração, nos antigos gregos, no Renascimento ou nas Luzes. Sócrates ou Galileu, Leonardo ou Bach, Shakespeare ou Mill inspiraram à distância de milhares de milhas e de séculos.
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É por isso que as referências são essenciais. Umas são explícitas, conhecidas e assumidas. Outras são implícitas, escondem-se por detrás da nossa memória, dentro do nosso conhecimento e à volta da nossa experiência ou do que julgamos ser a nossa experiência. Mesmo esta, frequentemente traidora, é muitas vezes a aprendizagem da experiência dos outros. Quantas vezes não julgamos sinceramente estar a ser originais e não nos limitamos a repetir o que assimilámos? Por isso a crítica e o debate são essenciais à honestidade e ao rigor.
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As referências são muitas vezes o resultado de um acto de liberdade. A escolha de referências é fruto de uma selecção e de uma aprendizagem. Por isso podem ser contraditórias. Na Sociologia, escolhi por exemplo Tocqueville, Marx, Weber e Aron, entre outros, reconhecendo a quase absoluta incompatibilidade entre eles. Cada um trouxe-me algo, a síntese, se é que existe uma, é minha. Terei sido inteiramente livre nas minhas escolhas? Não terei já sofrido influências e condicionamento? A minha resposta é ambiciosa: a liberdade reside na capacidade de escolha de influências. Por isso falo de referências, não de mestres, patrões, mentores ou ídolos.
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Na Fotografia, os nomes que povoam a minha memória são August Sander, Stieglitz, Steichen, Eugene Smith, Walker Evans, Dorothea Lange, Edward Weston, Cartier-Bresson, Sebastião Salgado, Castello Lopes e outros, diferentes e contraditórios. Não sigo ninguém, tento não copiar e procuro a minha maneira (e quantas vezes não consigo encontrá-la de modo nítido...). À medida que se interioriza a experiência de outros, tentamos modificá-la, dar-lhe nova vida. É o que fazemos mais ou menos livremente, com mais ou menos capacidade de inovação. Mas não conseguimos, nem queremos, afastar todas as inspirações e todas as experiências. Essas são as referências. Caso contrário, seriam o catecismo e a regra.
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Na ciência, na política, na filosofia, na música ou na pintura, a nossa liberdade mede-se pela capacidade de escolha de referências, o que implica empatia e crítica, em doses variáveis, mas elevadas. A nossa criatividade consiste na capacidade de acrescentar, modificar e variar o legado que recebemos.
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Lisboa, 2008
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As escolas, os estilos, as correntes de pensamento e as modas fazem-se por sucessivos desenvolvimentos, por acrescentos e variações ao que estava previamente adquirido. Quando ocorrem rupturas ou fundações, os seus responsáveis não estão libertos das ferramentas anteriores, da linguagem, das formas de expressão ou do saber acumulado. No século XX, artistas, pensadores e cientistas multiplicaram-se em rupturas e criação de novos “paradigmas”. Por vezes, fizeram-no de modo abrupto, com violência na destruição do que os antecedia. Mesmo assim, não dispensavam filiações de método ou de inspiração, nos antigos gregos, no Renascimento ou nas Luzes. Sócrates ou Galileu, Leonardo ou Bach, Shakespeare ou Mill inspiraram à distância de milhares de milhas e de séculos.
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É por isso que as referências são essenciais. Umas são explícitas, conhecidas e assumidas. Outras são implícitas, escondem-se por detrás da nossa memória, dentro do nosso conhecimento e à volta da nossa experiência ou do que julgamos ser a nossa experiência. Mesmo esta, frequentemente traidora, é muitas vezes a aprendizagem da experiência dos outros. Quantas vezes não julgamos sinceramente estar a ser originais e não nos limitamos a repetir o que assimilámos? Por isso a crítica e o debate são essenciais à honestidade e ao rigor.
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As referências são muitas vezes o resultado de um acto de liberdade. A escolha de referências é fruto de uma selecção e de uma aprendizagem. Por isso podem ser contraditórias. Na Sociologia, escolhi por exemplo Tocqueville, Marx, Weber e Aron, entre outros, reconhecendo a quase absoluta incompatibilidade entre eles. Cada um trouxe-me algo, a síntese, se é que existe uma, é minha. Terei sido inteiramente livre nas minhas escolhas? Não terei já sofrido influências e condicionamento? A minha resposta é ambiciosa: a liberdade reside na capacidade de escolha de influências. Por isso falo de referências, não de mestres, patrões, mentores ou ídolos.
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Na Fotografia, os nomes que povoam a minha memória são August Sander, Stieglitz, Steichen, Eugene Smith, Walker Evans, Dorothea Lange, Edward Weston, Cartier-Bresson, Sebastião Salgado, Castello Lopes e outros, diferentes e contraditórios. Não sigo ninguém, tento não copiar e procuro a minha maneira (e quantas vezes não consigo encontrá-la de modo nítido...). À medida que se interioriza a experiência de outros, tentamos modificá-la, dar-lhe nova vida. É o que fazemos mais ou menos livremente, com mais ou menos capacidade de inovação. Mas não conseguimos, nem queremos, afastar todas as inspirações e todas as experiências. Essas são as referências. Caso contrário, seriam o catecismo e a regra.
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Na ciência, na política, na filosofia, na música ou na pintura, a nossa liberdade mede-se pela capacidade de escolha de referências, o que implica empatia e crítica, em doses variáveis, mas elevadas. A nossa criatividade consiste na capacidade de acrescentar, modificar e variar o legado que recebemos.
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Lisboa, 2008
quinta-feira, 14 de agosto de 2008
Luz - Colombo
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Grande mãe! Num centro comercial, apesar do barulho, mau grado o movimento, uma mãe ajuda o filho nos trabalhos de casa. Tive curiosidade de perguntar porquê ali: longe de casa? Ela trabalhava ali? À espera de boleia do marido? Inventei mais dez razões. Acabei por preferir não saber exactamente. Só sei que, naquela tarde, admirei aquela mãe. E, já agora, a criança, cuja colaboração para os trabalhos era indispensável! (2006).
domingo, 10 de agosto de 2008
A Grande obra e a Administração Pública
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EM TEMPOS RECENTES, dois casos agitaram a opinião e a imprensa: o aeroporto de Lisboa e o comboio de alta velocidade, o TGV. E ainda vão animar os debates públicos durante algum tempo. Estes casos envolvem obras públicas, grandes obras públicas. Implicam escolhas e decisões. Têm evidentes dimensões políticas, económicas, financeiras, regionais e sociais. Delas decorrem custos, vantagens e inconvenientes. Estão em causa interesses vários e muitos conflitos de interesses. É normal que assim seja. Estas duas serão, talvez, as mais caras e mais vultuosas obras públicas da história de Portugal. Além de traduzirem um enorme esforço da população presente, um grande contributo da engenharia e da técnica em geral, constituem uma condicionante do desenvolvimento futuro da sociedade e do país. De estranhar seria que projectos desta amplitude não desencadeassem discussões vivas.
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Como me parece evidente, as decisões finais devem ser políticas. Não se imaginam empreendimentos desta natureza decididos apenas na óptica técnica. O problema, entre nós, é que muitas vezes a decisão política não é tecnicamente informada, não repousa sobre bases sólidas, não decorre de estudos sérios com bases objectivas e científicas. A escolha não é entre “política” e “técnica”, é entre “tecnicamente fundamentada” e “sem fundamentos técnicos”. É por exemplo imaginável que se tome uma decisão que não seja economicamente mais barata ou tecnicamente mais recomendável, mas que social e politicamente tenha argumentos de peso. Desde que não seja um disparate técnico, evidentemente.
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Antes destes casos, outras obras tinham comovido a opinião e a imprensa. O Centro Cultural de Lisboa, a EXPO de Lisboa, as pontes sobre o Tejo, as obras do Terreiro do Paço, a Casa da Música no Porto, a ponte Europa em Coimbra, o Eixo Norte-sul em Lisboa e outras. Igualmente discutível e importante foi um programa lançado pelo governo há vários anos e que condicionava o desenvolvimento ou a requalificação urbana de muitas cidades portuguesas, era o PÓLIS.
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Também aqui, em todos estes casos, estamos perante obras públicas, com todos os interesses envolvidos, debates, conflitos e escolhas políticas inerentes a estes processos. Tudo normal. Com algo mais de comum a várias destas obras: os atrasos na realização, o crescimento ou a “espiral de custos”, os trabalhos a mais, as indecisões, os graves incómodos causados à população, etc. Nalguns destes exemplos, por acréscimo, as nuvens de corrupção surgiram no horizonte. Houve dúvidas sobre os concursos, sobre os custos derivados de incidentes ou de mau planeamento, sobre os preços finais das empreitadas, sobre as verdadeiras causas dos atrasos, sobre as escolhas de empresas e de grupos financiadores...
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Um outro dossier importante, envolvendo obras públicas relevantes, é o dos bairros sociais, geralmente de iniciativa camarária, com ou sem a participação de empresas, proprietários e promotores privados. Nestes casos, as discussões foram semelhantes a todas as outras. Mas com diferenças específicas. É o caso das adjudicações que tinham regimes especiais. E o de uma lei do Parlamento que isentou as câmaras de procedimentos normais e amnistiou os autarcas que tinham cometido irregularidades de acordo com as leis previamente existentes.
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Com estas breves referências, quero simplesmente assinalar a actualidade das questões envolvendo obras públicas, grandes obras do Estado. As discussões têm vários temas centrais. A preparação das decisões em todas as suas vertentes, a começar pelas implicações sociais e a longo prazo. A adequação das decisões. A competência informada das escolhas. A utilidade, a estratégia e o planeamento da obra. A informação do público. A durabilidade e a qualidade dos materiais. A honestidade dos processos.
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Ora, podemos verificar que, pelo teor dos debates recentes e pelos incidentes relativos a outras obras, as discussões públicas, além de terem razão de ser pela importância do que está em causa, decorrem ainda do facto de, em Portugal, os processos de decisão não serem aparentemente informados, públicos e competentes. Assim como da falta de esclarecimento dos interessados. Ou, finalmente, da fenómenos aberrantes ligados a estes projectos ou a este tipo de obras.
Exemplos destes últimos são os custos excessivos, quando comparados com os orçamentados. Os atrasos na duração das obras, muitas vezes longe de qualquer margem de imponderabilidade. A má qualidade e o curto prazo de vida de alguns empreendimentos públicos que, poucos anos volvidos, já necessitam de reabilitação (quando esta é possível...). E a desonestidade de certos procedimentos, o que põe em causa o interesse geral e o bem comum, assim como a igualdade de oportunidades para os vários interessados.
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Não creio estar a revelar nada de sensacional: as obras públicas são, em Portugal, tema de grande controvérsia. Das estradas às barragens, dos monumentos aos bairros sociais, das pontes aos aeroportos, do caminho-de-ferro aos portos, todas estas decisões envolvem polémica excessiva. Estou convencido de que isso resulta de várias causas. Da carga política que os governos conferem às suas obras. Da falta de experiência de processos democráticos de decisão. Da ausência de competência técnica no seio da Administração Pública. Do primado exagerado da política sobre a técnica. Das ligações excessivas do poder político aos interesses económicos e mesmo de uma relativa promiscuidade.
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É antiga a tradição das “Grandes Obras”. O seu eco e as suas realizações vêm de longe, da Mesopotâmia, do Egipto, da Grécia ou de Roma. Dos Incas ou dos Azetecas. Da Idade Média ou dos grandes impérios orientais. Até chegarmos ao século XIX, quando, com o crescimento urbano, com a indústria e todo o seu aparato tecnológico, as grandes obras se transformaram numa constante da acção das autoridades. Era o último grito da acção governativa esclarecida e progressista. A Inglaterra, a França, a Alemanha e os Estados Unidos, em meados do século XIX, são imensos estaleiros de “grandes obras” que vão moldar os tempos até aos nossos dias. Foram os tempos de afirmação do orgulho nacional, de consolidação dos Estados nacionais e da instalação dos governos e das Administrações Públicas modernas. Foram os tempos de um enorme optimismo e de uma confiança ilimitada no poder da indústria e da construção. Foram, por excelência, os tempos do “Grand Oeuvre”.
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Através da história, estas “grandes obras” tiveram múltiplos objectivos. A consolidação de um regime. A comemoração de um deus ou de um poderoso. O estabelecimento de um poder. A consagração de uma nação. A criação de uma capital, de um comércio ou de um porto. A conquista de um território. A defesa de um país. O abastecimento de um povo. A criação de emprego. E outros ainda.
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São trabalhos de grande envergadura, que ocupam gente, tempo e espaço. São obras públicas pagas pelos poderes e pelos contribuintes. São em geral obras que resultam da acção política e da vontade dos dirigentes de organizar a vida colectiva.
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Antes destes casos, outras obras tinham comovido a opinião e a imprensa. O Centro Cultural de Lisboa, a EXPO de Lisboa, as pontes sobre o Tejo, as obras do Terreiro do Paço, a Casa da Música no Porto, a ponte Europa em Coimbra, o Eixo Norte-sul em Lisboa e outras. Igualmente discutível e importante foi um programa lançado pelo governo há vários anos e que condicionava o desenvolvimento ou a requalificação urbana de muitas cidades portuguesas, era o PÓLIS.
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Também aqui, em todos estes casos, estamos perante obras públicas, com todos os interesses envolvidos, debates, conflitos e escolhas políticas inerentes a estes processos. Tudo normal. Com algo mais de comum a várias destas obras: os atrasos na realização, o crescimento ou a “espiral de custos”, os trabalhos a mais, as indecisões, os graves incómodos causados à população, etc. Nalguns destes exemplos, por acréscimo, as nuvens de corrupção surgiram no horizonte. Houve dúvidas sobre os concursos, sobre os custos derivados de incidentes ou de mau planeamento, sobre os preços finais das empreitadas, sobre as verdadeiras causas dos atrasos, sobre as escolhas de empresas e de grupos financiadores...
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Um outro dossier importante, envolvendo obras públicas relevantes, é o dos bairros sociais, geralmente de iniciativa camarária, com ou sem a participação de empresas, proprietários e promotores privados. Nestes casos, as discussões foram semelhantes a todas as outras. Mas com diferenças específicas. É o caso das adjudicações que tinham regimes especiais. E o de uma lei do Parlamento que isentou as câmaras de procedimentos normais e amnistiou os autarcas que tinham cometido irregularidades de acordo com as leis previamente existentes.
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Com estas breves referências, quero simplesmente assinalar a actualidade das questões envolvendo obras públicas, grandes obras do Estado. As discussões têm vários temas centrais. A preparação das decisões em todas as suas vertentes, a começar pelas implicações sociais e a longo prazo. A adequação das decisões. A competência informada das escolhas. A utilidade, a estratégia e o planeamento da obra. A informação do público. A durabilidade e a qualidade dos materiais. A honestidade dos processos.
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Ora, podemos verificar que, pelo teor dos debates recentes e pelos incidentes relativos a outras obras, as discussões públicas, além de terem razão de ser pela importância do que está em causa, decorrem ainda do facto de, em Portugal, os processos de decisão não serem aparentemente informados, públicos e competentes. Assim como da falta de esclarecimento dos interessados. Ou, finalmente, da fenómenos aberrantes ligados a estes projectos ou a este tipo de obras.
Exemplos destes últimos são os custos excessivos, quando comparados com os orçamentados. Os atrasos na duração das obras, muitas vezes longe de qualquer margem de imponderabilidade. A má qualidade e o curto prazo de vida de alguns empreendimentos públicos que, poucos anos volvidos, já necessitam de reabilitação (quando esta é possível...). E a desonestidade de certos procedimentos, o que põe em causa o interesse geral e o bem comum, assim como a igualdade de oportunidades para os vários interessados.
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Não creio estar a revelar nada de sensacional: as obras públicas são, em Portugal, tema de grande controvérsia. Das estradas às barragens, dos monumentos aos bairros sociais, das pontes aos aeroportos, do caminho-de-ferro aos portos, todas estas decisões envolvem polémica excessiva. Estou convencido de que isso resulta de várias causas. Da carga política que os governos conferem às suas obras. Da falta de experiência de processos democráticos de decisão. Da ausência de competência técnica no seio da Administração Pública. Do primado exagerado da política sobre a técnica. Das ligações excessivas do poder político aos interesses económicos e mesmo de uma relativa promiscuidade.
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É antiga a tradição das “Grandes Obras”. O seu eco e as suas realizações vêm de longe, da Mesopotâmia, do Egipto, da Grécia ou de Roma. Dos Incas ou dos Azetecas. Da Idade Média ou dos grandes impérios orientais. Até chegarmos ao século XIX, quando, com o crescimento urbano, com a indústria e todo o seu aparato tecnológico, as grandes obras se transformaram numa constante da acção das autoridades. Era o último grito da acção governativa esclarecida e progressista. A Inglaterra, a França, a Alemanha e os Estados Unidos, em meados do século XIX, são imensos estaleiros de “grandes obras” que vão moldar os tempos até aos nossos dias. Foram os tempos de afirmação do orgulho nacional, de consolidação dos Estados nacionais e da instalação dos governos e das Administrações Públicas modernas. Foram os tempos de um enorme optimismo e de uma confiança ilimitada no poder da indústria e da construção. Foram, por excelência, os tempos do “Grand Oeuvre”.
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Através da história, estas “grandes obras” tiveram múltiplos objectivos. A consolidação de um regime. A comemoração de um deus ou de um poderoso. O estabelecimento de um poder. A consagração de uma nação. A criação de uma capital, de um comércio ou de um porto. A conquista de um território. A defesa de um país. O abastecimento de um povo. A criação de emprego. E outros ainda.
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São trabalhos de grande envergadura, que ocupam gente, tempo e espaço. São obras públicas pagas pelos poderes e pelos contribuintes. São em geral obras que resultam da acção política e da vontade dos dirigentes de organizar a vida colectiva.
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São muitas vezes obras úteis e necessárias. Outras vezes não. Mas são sempre obras a que os poderosos conferem elevado estatuto de propaganda. Com essas obras, pretende-se melhorar a vida dos cidadãos, mas também “ficar na história”, atávico desejo de soberanos e dirigentes. Por isso há expressões consagradas. Como as “Obras faraónicas” ou os “Elefantes brancos”. E os belgas têm mesmo uma tradição que designam de “GTI”, os “Grands Travaux Inutiles”. É possível consultar nas enciclopédias exemplos e listas destes “grandes trabalhos inúteis” feitos em diversos países e que incluem aeroportos sem movimento, túneis sem saída, sedes de governo desocupadas, barragens sem água ou desaproveitadas, auto-estradas sem destino e colossais estaleiros inacabados. Mas também obras que acabaram por ser utilizadas, de uma maneira ou outra, mas que se revelaram excessivas nos custos e nos esforços.
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As grandes obras não são sobretudo inúteis, deve reconhecer-se. Mas há qualquer coisa de gigantesco, de projecção exibicionista, de propaganda e de desejo de omnipotência por parte daqueles que sonham com a sua realização e que as levam a cabo. As grandes obras de Napoleão III e a nova Paris dos finais do século XIX eram uma afirmação desse tipo. As grandes obras ligadas às Exposições internacionais e universais, desde meados do século XIX, são igualmente uma afirmação de poder e império. Os grandes canais do Suez e do Panamá, para além da utilidade evidente, tinham essa dimensão assertiva e, aliás, impressionaram o mundo! O Túnel da Mancha, de finanças e economia mais que duvidosas, entra nessa categoria de obras. Como a cidade capital de Brasília. E como, recentemente, “Les Grands Travaux” de François Mitterrand, que não se coibiu de restaurar, e assumir como republicana, essa tradição imperial. No seu plano de “grands travaux”, constavam um arco de triunfo, uma biblioteca nacional, uma ópera, uma cidade das ciências, vários museus, ministérios, palácios e pontes.
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Em Portugal, tudo é um pouco mais modesto, mas as “Obras Públicas” do Estado Novo tinham estatuto mítico, com especial lugar para os Palácios da Justiça, as pontes e as barragens. E a democracia reavivou esse valor: o Centro Cultural de Belém, a EXPO e o Parque das Nações, a ponte Vasco da Gama e a Casa da Música ficam bem nessa tradição.
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As discussões recentes, nas quais avultam, como disse, o aeroporto de Lisboa e o comboio de alta velocidade, revelam a falta de preparação das decisões, mas sobretudo o seu lado secreto, a sua dimensão despótica e a sua afirmação orgulhosa e ciumenta. Noto, à margem, que nestes casos do aeroporto e do comboio, o governo garante que todos os estudos foram feitos e que a decisão é firme e sólida, mas não só tais estudos não foram conhecidos a tempo, como não é do conhecimento público que se tenham feito estudos de previsão e de implicações sociais. Se estudos existem, são técnicos, económicos e financeiros, não sociais, apesar de terem sérias implicações na sociedade e nos comportamentos.
São muitas vezes obras úteis e necessárias. Outras vezes não. Mas são sempre obras a que os poderosos conferem elevado estatuto de propaganda. Com essas obras, pretende-se melhorar a vida dos cidadãos, mas também “ficar na história”, atávico desejo de soberanos e dirigentes. Por isso há expressões consagradas. Como as “Obras faraónicas” ou os “Elefantes brancos”. E os belgas têm mesmo uma tradição que designam de “GTI”, os “Grands Travaux Inutiles”. É possível consultar nas enciclopédias exemplos e listas destes “grandes trabalhos inúteis” feitos em diversos países e que incluem aeroportos sem movimento, túneis sem saída, sedes de governo desocupadas, barragens sem água ou desaproveitadas, auto-estradas sem destino e colossais estaleiros inacabados. Mas também obras que acabaram por ser utilizadas, de uma maneira ou outra, mas que se revelaram excessivas nos custos e nos esforços.
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As grandes obras não são sobretudo inúteis, deve reconhecer-se. Mas há qualquer coisa de gigantesco, de projecção exibicionista, de propaganda e de desejo de omnipotência por parte daqueles que sonham com a sua realização e que as levam a cabo. As grandes obras de Napoleão III e a nova Paris dos finais do século XIX eram uma afirmação desse tipo. As grandes obras ligadas às Exposições internacionais e universais, desde meados do século XIX, são igualmente uma afirmação de poder e império. Os grandes canais do Suez e do Panamá, para além da utilidade evidente, tinham essa dimensão assertiva e, aliás, impressionaram o mundo! O Túnel da Mancha, de finanças e economia mais que duvidosas, entra nessa categoria de obras. Como a cidade capital de Brasília. E como, recentemente, “Les Grands Travaux” de François Mitterrand, que não se coibiu de restaurar, e assumir como republicana, essa tradição imperial. No seu plano de “grands travaux”, constavam um arco de triunfo, uma biblioteca nacional, uma ópera, uma cidade das ciências, vários museus, ministérios, palácios e pontes.
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Em Portugal, tudo é um pouco mais modesto, mas as “Obras Públicas” do Estado Novo tinham estatuto mítico, com especial lugar para os Palácios da Justiça, as pontes e as barragens. E a democracia reavivou esse valor: o Centro Cultural de Belém, a EXPO e o Parque das Nações, a ponte Vasco da Gama e a Casa da Música ficam bem nessa tradição.
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As discussões recentes, nas quais avultam, como disse, o aeroporto de Lisboa e o comboio de alta velocidade, revelam a falta de preparação das decisões, mas sobretudo o seu lado secreto, a sua dimensão despótica e a sua afirmação orgulhosa e ciumenta. Noto, à margem, que nestes casos do aeroporto e do comboio, o governo garante que todos os estudos foram feitos e que a decisão é firme e sólida, mas não só tais estudos não foram conhecidos a tempo, como não é do conhecimento público que se tenham feito estudos de previsão e de implicações sociais. Se estudos existem, são técnicos, económicos e financeiros, não sociais, apesar de terem sérias implicações na sociedade e nos comportamentos.
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Retomando o meu argumento. No essencial, os governos preferem escolher antes de estudar e decidir antes de debater. Recorrem à política do facto consumado e a uma atitude de teimosia, como se o seu futuro estivesse dependente dessa decisão. Não percebem que associar a população, os técnicos e os interessados, em vez de os enfraquecer, aumenta o seu poder, confere-lhes prestígio e autoridade.
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As causas desta atitude são muitas e variadas. A vontade de um governo “ficar na história” é evidentemente uma razão. Como é o desejo de, através das obras, os governos prosseguirem outros objectivos colaterais, como sejam os de conquistar adeptos e eleitores, empregar mão-de-obra, melhorar estatísticas de emprego e investimento, agradar aos financiadores dos partidos ou encontrar pretextos para ir colher fundos europeus.
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Mas há outras causas. A erosão da competência técnica da Administração Pública, efectiva ao longo das últimas décadas, é uma. Outra, as relações entre o poder político e os poderes económicos que não se processam à vista dos cidadãos. O “marialvismo” partidário de que sofrem os governos também é responsável. As esperanças eleitorais que os governos depositam na realização de obras também contribuem para este comportamento. A debilidade do Parlamento, como instituição independente e de debate político, facilita este estado de coisas. Finalmente, a fragilidade da sociedade civil e das associações técnicas, profissionais e científicas ajuda os apetites dos governos. Apesar da sociedade plural, aberta e liberal em que vivemos, os governos recentes têm revelado um apetite insaciável, uma vontade crescente de dominar e controlar a vida económica e social.
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Vem a este propósito referir os novos regulamentos de certificação profissional que retiram estas competências às Ordens. É criada uma agência governamental que será encarregada disso. Quer dizer, o acesso à profissão e à certificação de cursos passa a ficar regulado pelas instituições políticas e administrativas, estatais. As sociedades profissionais, técnicas e científicas, são retiradas do circuito. Estas não são boas notícias.
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O Estado deixou nascer e proliferar o número de cursos superiores, universitários e politécnicos, de toda a espécie, uma espécie de multiplicação metastática de que o governo é responsável. Mais ainda, que o governo estimulou, dado que encontrava aqui uma maneira fácil de resolver outros problemas. Os estabelecimentos públicos não tinham capacidade suficiente para acolher toda a procura. O governo desejava ver as estatísticas do desemprego jovem mais brandas. Esta era uma maneira de ir buscar fundos europeus para a formação. Como era um modo de incentivar e apoiar a iniciativa privada na área do ensino superior e da formação. Não se pode dizer que eram as melhores razões.
Retomando o meu argumento. No essencial, os governos preferem escolher antes de estudar e decidir antes de debater. Recorrem à política do facto consumado e a uma atitude de teimosia, como se o seu futuro estivesse dependente dessa decisão. Não percebem que associar a população, os técnicos e os interessados, em vez de os enfraquecer, aumenta o seu poder, confere-lhes prestígio e autoridade.
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As causas desta atitude são muitas e variadas. A vontade de um governo “ficar na história” é evidentemente uma razão. Como é o desejo de, através das obras, os governos prosseguirem outros objectivos colaterais, como sejam os de conquistar adeptos e eleitores, empregar mão-de-obra, melhorar estatísticas de emprego e investimento, agradar aos financiadores dos partidos ou encontrar pretextos para ir colher fundos europeus.
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Mas há outras causas. A erosão da competência técnica da Administração Pública, efectiva ao longo das últimas décadas, é uma. Outra, as relações entre o poder político e os poderes económicos que não se processam à vista dos cidadãos. O “marialvismo” partidário de que sofrem os governos também é responsável. As esperanças eleitorais que os governos depositam na realização de obras também contribuem para este comportamento. A debilidade do Parlamento, como instituição independente e de debate político, facilita este estado de coisas. Finalmente, a fragilidade da sociedade civil e das associações técnicas, profissionais e científicas ajuda os apetites dos governos. Apesar da sociedade plural, aberta e liberal em que vivemos, os governos recentes têm revelado um apetite insaciável, uma vontade crescente de dominar e controlar a vida económica e social.
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Vem a este propósito referir os novos regulamentos de certificação profissional que retiram estas competências às Ordens. É criada uma agência governamental que será encarregada disso. Quer dizer, o acesso à profissão e à certificação de cursos passa a ficar regulado pelas instituições políticas e administrativas, estatais. As sociedades profissionais, técnicas e científicas, são retiradas do circuito. Estas não são boas notícias.
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O Estado deixou nascer e proliferar o número de cursos superiores, universitários e politécnicos, de toda a espécie, uma espécie de multiplicação metastática de que o governo é responsável. Mais ainda, que o governo estimulou, dado que encontrava aqui uma maneira fácil de resolver outros problemas. Os estabelecimentos públicos não tinham capacidade suficiente para acolher toda a procura. O governo desejava ver as estatísticas do desemprego jovem mais brandas. Esta era uma maneira de ir buscar fundos europeus para a formação. Como era um modo de incentivar e apoiar a iniciativa privada na área do ensino superior e da formação. Não se pode dizer que eram as melhores razões.
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Nalgumas áreas disciplinares, tanto nas engenharias como em certos campos das humanidades (relações públicas, comunicação social, recursos humanos, gestão) e das técnicas sanitárias, apareceram centenas de cursos por todo o país, cada um com uma designação mais estapafúrdia ou mais especializada, na tentativa de se encontrarem “nichos” de mercado. Todo este crescimento foi, a maioria das vezes, feito sem atenção à qualidade do ensino, ao rigor da formação e à capacidade técnica e científica dos docentes e formadores.
Nalgumas áreas disciplinares, tanto nas engenharias como em certos campos das humanidades (relações públicas, comunicação social, recursos humanos, gestão) e das técnicas sanitárias, apareceram centenas de cursos por todo o país, cada um com uma designação mais estapafúrdia ou mais especializada, na tentativa de se encontrarem “nichos” de mercado. Todo este crescimento foi, a maioria das vezes, feito sem atenção à qualidade do ensino, ao rigor da formação e à capacidade técnica e científica dos docentes e formadores.
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Muito depressa se verificou que a nova situação comportava graves defeitos e riscos. Em muitos casos, a preparação técnica e científica dos diplomados deixava muito a desejar. Nem a academia, nem a economia e os empregadores, nem as comunidades técnicas, científicas e profissionais se reconheciam nestes novos cursos e nestes novos especialistas. Haveria talvez excepções, com certeza, mas o panorama geral era preocupante.
Muito depressa se verificou que a nova situação comportava graves defeitos e riscos. Em muitos casos, a preparação técnica e científica dos diplomados deixava muito a desejar. Nem a academia, nem a economia e os empregadores, nem as comunidades técnicas, científicas e profissionais se reconheciam nestes novos cursos e nestes novos especialistas. Haveria talvez excepções, com certeza, mas o panorama geral era preocupante.
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Assim surgiram iniciativas e pressões para encontrar processos de certificação profissional. Havia tradições, concretizadas nos famosos exames de admissão às Ordens, mas não eram suficientes, nem sobretudo contemplavam a imperiosa necessidade de informar o utente, o cliente ou o consumidor, como se quiser. Algumas Ordens, a começar pela dos Engenheiros, criaram um mecanismo de certificação de cursos. Em vez de esperar pelos diplomados de boa ou má qualidade, este processo de reconhecimento ou certificação dava a conhecer, desde o momento da candidatura por parte do estudante, do valor conferido aos vários cursos e às várias instituições.
Assim surgiram iniciativas e pressões para encontrar processos de certificação profissional. Havia tradições, concretizadas nos famosos exames de admissão às Ordens, mas não eram suficientes, nem sobretudo contemplavam a imperiosa necessidade de informar o utente, o cliente ou o consumidor, como se quiser. Algumas Ordens, a começar pela dos Engenheiros, criaram um mecanismo de certificação de cursos. Em vez de esperar pelos diplomados de boa ou má qualidade, este processo de reconhecimento ou certificação dava a conhecer, desde o momento da candidatura por parte do estudante, do valor conferido aos vários cursos e às várias instituições.
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Foi uma inovação importante e interessante. Esperava-se que este processo se alargasse a todas as áreas de formação superior e de qualificação profissional. Tratava-se de um mecanismo de controlo técnico que protegia os candidatos, defendia os padrões técnicos de uma profissão e preservava os critérios de exigência. E poderia ter mesmo mais uma vantagem de valor incalculável: era um incentivo ao melhoramento de estabelecimentos e de cursos de menor qualidade que, excluídos da certificação ou do reconhecimento prévio, tinham de “fazer pela vida” e elevar os seus padrões de funcionamento.
Foi uma inovação importante e interessante. Esperava-se que este processo se alargasse a todas as áreas de formação superior e de qualificação profissional. Tratava-se de um mecanismo de controlo técnico que protegia os candidatos, defendia os padrões técnicos de uma profissão e preservava os critérios de exigência. E poderia ter mesmo mais uma vantagem de valor incalculável: era um incentivo ao melhoramento de estabelecimentos e de cursos de menor qualidade que, excluídos da certificação ou do reconhecimento prévio, tinham de “fazer pela vida” e elevar os seus padrões de funcionamento.
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Poderia haver riscos de poder corporativo, de “closed shop” ou de favoritismo. Com certeza. Mas, em democracia e com liberdade de informação, esse risco era bem menor do que aqueles que decorrem da certificação estatal.
Poderia haver riscos de poder corporativo, de “closed shop” ou de favoritismo. Com certeza. Mas, em democracia e com liberdade de informação, esse risco era bem menor do que aqueles que decorrem da certificação estatal.
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Esta, com efeito, é perigosa. Não tanto pela segregação política (que pode existir), mas sobretudo pela tendência laxista e demagógica que se detecta na actuação das instâncias políticas e administrativas. Assim como pela incompetência técnica de que os organismos estatais, nestas áreas, dão sobejas provas. O poder político e estatal usa critérios, para a sua acção, que ultrapassam em muito as fronteiras da avaliação técnica e científica. O poder político e administrativo tem de ter em conta regras próprias, como sejam a gratificação eleitoral, o pagamento de promessas políticas, os equilíbrios regionais e políticos e os compromissos de vária ordem que escapam aos princípios e às regras técnicas e científicas.
Esta, com efeito, é perigosa. Não tanto pela segregação política (que pode existir), mas sobretudo pela tendência laxista e demagógica que se detecta na actuação das instâncias políticas e administrativas. Assim como pela incompetência técnica de que os organismos estatais, nestas áreas, dão sobejas provas. O poder político e estatal usa critérios, para a sua acção, que ultrapassam em muito as fronteiras da avaliação técnica e científica. O poder político e administrativo tem de ter em conta regras próprias, como sejam a gratificação eleitoral, o pagamento de promessas políticas, os equilíbrios regionais e políticos e os compromissos de vária ordem que escapam aos princípios e às regras técnicas e científicas.
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E não se pense que se trata, da minha parte, de um pré-conceito ou preconceito contra o Estado e o poder político. Este tem as suas áreas de competência, assim como regras e critérios de acção, que não incluem, em primeiro lugar, o rigor científico ou a qualidade técnica. A melhor prova que temos e que nos deveria fazer reflectir seriamente é justamente a proliferação de cursos e estabelecimentos de qualidade medíocre: esta só foi possível graças à cumplicidade activa e ao estímulo do governo e da administração. Note-se que não se tratou de silêncio ou inércia, mas sim de apoio e envolvimento activo. Nenhum estabelecimento e nenhum curso poderiam ter nascido sem autorização e reconhecimento do governo. O seu currículo recente faz do Estado e do governo entidades incompetentes (e mesmo perniciosas) para avaliar ou certificar cursos, formações e qualidade técnica ou científica.
E não se pense que se trata, da minha parte, de um pré-conceito ou preconceito contra o Estado e o poder político. Este tem as suas áreas de competência, assim como regras e critérios de acção, que não incluem, em primeiro lugar, o rigor científico ou a qualidade técnica. A melhor prova que temos e que nos deveria fazer reflectir seriamente é justamente a proliferação de cursos e estabelecimentos de qualidade medíocre: esta só foi possível graças à cumplicidade activa e ao estímulo do governo e da administração. Note-se que não se tratou de silêncio ou inércia, mas sim de apoio e envolvimento activo. Nenhum estabelecimento e nenhum curso poderiam ter nascido sem autorização e reconhecimento do governo. O seu currículo recente faz do Estado e do governo entidades incompetentes (e mesmo perniciosas) para avaliar ou certificar cursos, formações e qualidade técnica ou científica.
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Talvez não seja de estranhar, dadas as tendências conhecidas e recentes. Mesmo previsível, não deixa de ser condenável. Há cerca de dois anos, o governo aprovou, quase sem oposição, a famigerada lei de nomeações de altos cargos da função pública. Com essa lei, tornou legal a prática furtiva anterior que consistia na nomeação de amigos e clientes para os postos dirigentes da Administração. Esta lei fez o impensável: legalizou os “jobs for the boys”. Os responsáveis pela Administração passaram a ter os seus mandatos coincidentes com os das legislaturas. Têm de ser legitimados pelo eleitorado. Vêem os seus mandatos cessar com as eleições. Ligam as suas funções ao ciclo eleitoral dos deputados e dos ministros. É-lhes exigida “confiança política” e não, em primeiro lugar, currículo técnico e científico, experiência administrativa, muito menos isenção e independência, que deveriam ser os seus primeiros atributos.
Talvez não seja de estranhar, dadas as tendências conhecidas e recentes. Mesmo previsível, não deixa de ser condenável. Há cerca de dois anos, o governo aprovou, quase sem oposição, a famigerada lei de nomeações de altos cargos da função pública. Com essa lei, tornou legal a prática furtiva anterior que consistia na nomeação de amigos e clientes para os postos dirigentes da Administração. Esta lei fez o impensável: legalizou os “jobs for the boys”. Os responsáveis pela Administração passaram a ter os seus mandatos coincidentes com os das legislaturas. Têm de ser legitimados pelo eleitorado. Vêem os seus mandatos cessar com as eleições. Ligam as suas funções ao ciclo eleitoral dos deputados e dos ministros. É-lhes exigida “confiança política” e não, em primeiro lugar, currículo técnico e científico, experiência administrativa, muito menos isenção e independência, que deveriam ser os seus primeiros atributos.
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As “grades obras públicas” constituem um bom exemplo da evolução actual da nossa colectividade e da Administração Pública. Nesta evolução, sublinhei algumas tendências que me parecem negativas. Poder político a mais. Falta de preparação das decisões. Secretismo nos trabalhos prévios. Relações pouco claras ou mesmo duvidosas entre os políticos (nacionais ou autárquicos) e os interesses económicos e financeiros. Voracidade crescente do governo que pretende alargar e consolidar o seu poder de controlo da sociedade, da técnica, da ciência e da economia. E ausência de poderes independentes, alternativos, de equilíbrio e de ponderação que tornam melhores as decisões, mais bem aceites e mais competentes. Só me resta dizer, para concluir, que vale a pena estarmos atentos. E vale a pena contrariar esta espécie de despotismo crescente.
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Dia Nacional do Engenheiro - Ordem dos Engenheiros
Figueira da Foz, 24 de Novembro de 2007
As “grades obras públicas” constituem um bom exemplo da evolução actual da nossa colectividade e da Administração Pública. Nesta evolução, sublinhei algumas tendências que me parecem negativas. Poder político a mais. Falta de preparação das decisões. Secretismo nos trabalhos prévios. Relações pouco claras ou mesmo duvidosas entre os políticos (nacionais ou autárquicos) e os interesses económicos e financeiros. Voracidade crescente do governo que pretende alargar e consolidar o seu poder de controlo da sociedade, da técnica, da ciência e da economia. E ausência de poderes independentes, alternativos, de equilíbrio e de ponderação que tornam melhores as decisões, mais bem aceites e mais competentes. Só me resta dizer, para concluir, que vale a pena estarmos atentos. E vale a pena contrariar esta espécie de despotismo crescente.
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Dia Nacional do Engenheiro - Ordem dos Engenheiros
Figueira da Foz, 24 de Novembro de 2007
quinta-feira, 7 de agosto de 2008
Luz - Vale do Douro, perto do Cachão da Valeira
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Já quase não há vinha, é quase tudo mortório e olival. Estes terrenos, nesta zona, são muito duros para cultivar vinha. (2008).
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