Perante os evidentes abusos
cometidos pelas grandes operadoras de “redes sociais”, eleva-se o clamor: mata,
esfola, proíbe, censura, vigia, controla e regula! São estas as palavras-chave
que descansam os incautos e os virtuosos, mas acabam por permitir aos
operadores continuar a fazer os seus negócios, com mais ou menos exigências,
mas negócios apesar de tudo.
A verdade é que estas “redes”
correspondem a objectos de sedução e criam necessidades de consumo (artificiais,
pois claro, como praticamente todas as necessidades de consumo). Fomentam novos
costumes e hábitos. Estabelecem padrões de comportamento. Resultam de uma
enorme capacidade de manipulação do mercado e de um formidável talento para
inventar necessidades sedutoras e irresistíveis.
Estas “redes” vieram para ficar.
Sejam as mais conhecidas (as ditas “sociais”, a começar pelo famigerado
Facebook), sejam todas as outras, fechadas, discretas, profissionais ou
diletantes. Há comportamentos, hábitos, sistemas de educação e de ciência,
circuitos artísticos e de informação e sobretudo negócios que já não dispensam
as “redes”.
Estas vivem das decisões
individuais de centenas de milhões de pessoas que, no mundo inteiro, aderem e
utilizam. Sem essa adesão, não há “redes”. O único controlo que se conhece é o
exercido por governos ditatoriais que têm os meios políticos e técnicos para
filtrar e censurar como querem e entendem. Também existe o “acompanhamento”
feito por empresas e Estados (mesmo democráticos, como se vê agora), que
espiam, gravam e observam. É talvez este o sistema prevalecente.
Proibir estas “redes”? Só as
ditaduras. Controlar? Ilusão total. No dia seguinte ao estabelecimento de um
qualquer procedimento, logo a seguir os operadores de “redes” inventarão outros
sistemas e outras “redes”. Vigiar e regular? Fora de questão. Primeiro, porque
já se faz e ou as pessoas não sabem, ou sabem e não se importam, ou os Estados
e as empresas que o fazem não confessam. Segundo, porque, neste capítulo, o
Estado merece tanta confiança quanto os operadores e as empresas.
A solução para este problema, se
é que tem solução, é a velha e santa liberdade. Informada, pois claro. Por
outras palavras: quem pode deve dar meios para que o cidadão decida. Informar e
publicar listas exaustivas dos perigos, das faculdades concedidas, dos
dispositivos que não estão explícitos mas que podem funcionar (localização das
pessoas, listas de contactos, inventários de preferências, actividades viciosas
e virtuosas, etc. …) e dizer o que se deve recear, o que se pode esperar, o que
se pode fazer para contrariar, como se pode apagar uma APP, como se pode não
descarregar os dispositivos… Publiquem-se as listas dos intrusivos e dos que
perseguem os cidadãos.
Cada um decida por si. Quanto
mais informado melhor. O Estado (e já agora jornais, televisões, universidades,
associações privadas…) pode elencar os perigos e as soluções, as ameaças e as
vacinas. Mas deixem a cada um escolher os seus vícios, os seus defeitos, as
suas virtudes, os seus prazeres e a sua curiosidade… E defender a sua
privacidade. Ajudem cada um a saber às quantas anda e o que pode fazer…
Há muito a fazer. Pelo Estado,
pelos cidadãos, pelas associações, pelas universidades, pelos organismos de defesa
dos consumidores… A palavra de ordem é avisar. Informar sobre as consequências
e os efeitos, sobre os perigos e as ameaças. Que acontece a quem se inscreve no
Facebook? Que se deve fazer para evitar ser perseguido pelo telemóvel, pelo
computador e pelas redes? Que APP se deve liquidar para que não saibam com quem
se anda, a fazer o quê e aonde? Isso é que ajudaria o consumidor e o cidadão!
Isso é que dava meios para escolher melhor, para defender a liberdade e para
ajudar à autonomia de cada um.
DN, 8 de Abril de 2018
Sem comentários:
Enviar um comentário