Na cerimónia de posse, os semblantes
mostravam aquilo de que realmente se tratava: de um velório! O conteúdo era,
todavia, de ficção. O Presidente da República enganara-se de discurso: este era
o que deveria ter lido há dez anos. Ou então dentro de quinze dias, quando der
posse ao governo de António Costa, por enquanto sem acordo de maioria, sem
composição e sem programa.
Apesar disso, os empossados
merecem uma saudação sincera. Quaisquer que sejam as suas razões, estiveram
presentes e entregaram-se a esta ruim mas necessária tarefa com cavalheirismo e
desejo de dar a entender que sabiam perder.
Vivemos uma confusão
meticulosamente organizada. E uma desordem constitucionalmente protegida.
Espera-se, uma vez mais, que a fantasia do governo de gestão não venha criar a
seguir uma situação perfeitamente alucinada.
O Presidente da República fez um
discurso quase como se fosse Primeiro-ministro. Com regras, objectivos e
estratégia! Como se fosse. Passos Coelho fez um discurso de Primeiro-ministro
normal de tempos normais. Como se fosse. Este é o novo governo, como se fosse. Que
cumpra as regras, é o que se deseja. Que mostre o que queria, é o que se
espera. Que o discurso do Primeiro-ministro seja referência para a oposição que
vai ser dentro de algumas semanas, é o que se sugere.
Perdeu-se tempo. É verdade. Mas
este tempo foi perdido por boas razões: para a manutenção das regras da
democracia. Caso contrário, entregava-se a politica definitivamente ao golpe e
ao improviso. Dentro de algumas semanas, teremos talvez novo governo com
maioria de apoio. Como diz Jerónimo de Sousa, logo se verá. Por quanto tempo,
logo veremos.
Tempo realmente perdido, sem
razão, foi o de longos meses desde as europeias, quando já se sabia que tudo
passaria a ser provisório. Tempo perdido inutilmente foi o de mais de três
semanas entre as eleições e a tomada de posse do Parlamento. Tempo perdido, sem
razão nem vantagem, são as semanas de processo, à espera da contagem, à espera
dos emigrantes, à espera da posse, à espera da formação, à espera da
apresentação, à espera da aprovação… Tudo poderia passar-se em meia dúzia de
dias…
Vamos ver quem, por PS
interposto, vai governar Portugal. Ou o PCP, durante uns meses, ou a Troika,
durante um pouco mais. Na primeira hipótese, teremos eleições, novo governo e
talvez segundo resgate. Na segunda, teremos só eleições e novo governo.
Ao contrário do que se receia, o
PCP não se interessa, para já, pela União Europeia, o BCE, a NATO, ou o FMI… De
todas estas organizações, o PCP vai dizer mal, o pior possível, assim como vai
votar contra elas no Parlamento Europeu.
O grande problema vai ser entre o
PCP e a Troika, não entre o PCP e a NATO ou o FMI. Noutras palavras: o PCP
preocupa-se com a política nacional, é-lhe totalmente indiferente a questão
europeia que tanto preocupa o Presidente Cavaco Silva e a direita. Lá fora,
vota contra o euro, contra a União, contra o Tratado orçamental, contra o
défice, contra a dívida… Cá dentro, por uns tempos, cala-se e tenta ganhar onde
pode.
O que realmente interessa ao PCP está
cá dentro, é o ganho imediato, o certificado de bom comportamento e algumas
conquistas… Vai fazer as exigências habituais: mais défice, mais endividamento,
mais impostos, mais salário mínimo, mais vencimento para os funcionários… Mais
empresas públicas, mais investimento público… E não vai causar, por enquanto,
mais problemas. O PCP está pronto a pagar muito pela sua nova virgindade
europeia e democrática. Vai dar os seus votos ao PS, durante uns meses, porque
este lhe prestou o enorme serviço de o considerar democrático e europeu. Se não
fosse agora, talvez nunca fosse.
DN, 1 de Novembro de
2015
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