Olha-se para São Bento e o que se
vê? Uma casa assombrada. Um Parlamento inútil, inoperante e incapaz.
Se alguém tinha dúvidas sobre a
qualidade, o valor e o papel da Assembleia da Republica, tem agora matéria para
ser esclarecido: um período de um mês, talvez mais, em que o nosso pobre
Parlamento revela à luz do dia, a todo o mundo, a sua futilidade, a sua
dependência do governo, a sua função de arena de mau gosto, a sua falta de
espírito de corpo, a sua ausência de orgulho e a sua deficiência de honra!
Eleitos há mais de um mês, os
deputados passeiam-se pela intriga partidária. Só se preocuparam com a eleição
do novo presidente, que imediatamente se vestiu de valete de copas, às ordens
do seu partido e de um futuro governo ainda em estado gasoso. Aos 230
deputados, não lhes ocorreu reunir, discutir, debater, organizar os seus
trabalhos, criar comissões, estabelecer ordens do dia e agendas para os
próximos meses, começar a preparar projectos de lei, coligir informação,
analisar situações reais nos vários sectores da vida, olhar para a execução
orçamental, estudar a sério as PPP, voltar a olhar para os grandes casos que
ainda hoje ameaçam a democracia (BPN, BPP, BCP, CGD, PT, CIMPOR, BES, GES…) e
fazer qualquer coisa que se veja, que interesse ao país e que justifique o
vencimento que recebem. Dizem que, desculpa de preguiçosos, estão à espera do
programa do governo.
Com a lei eleitoral que temos,
não é possível esperar muito mais. Com a disciplina de voto imposta por todos
os partidos aos seus deputados, é fácil prever que ninguém, sem autorização
superior, tomará a decisão de abrir um livro ou fechar uma porta. Com este
sistema de voto por grupo ou sindicato de deputados, a inércia é a estratégia,
não fazer ondas é um mandamento. Com o pensamento político próprio de uma
brigada, quem ousa ter uma iniciativa sem botas cardadas? Com a falta de
tradição institucional, o que importa, tal como os comunistas dizem, são as
relações de força, o resto é poesia. Assim é que o Parlamento não reúne, não
trabalha, não cria comissões, não tem ideias, não começa a elaborar leis. Está
à espera. De quê? Dos chefes. Das negociações secretas entre os partidos da
esquerda. Do governo. Do Presidente. Da luz verde do PCP.
Já tudo lhe chamaram. Até nomes
que a vergonha e a cerimónia me impedem de repetir. Circo de São Bento foi certamente
a alcunha que mais bem lhe colou à pele. Pois bem, o Circo está fechado para
obras. A casa da liberdade está devoluta! O Fórum da democracia está mudo!
A situação actual da Assembleia
da República não é totalmente inédita e não data apenas deste último mês. Na
verdade, é ponto de chegada de um processo gradual de subalternização e
decadência de que há numerosos indícios. Vários foram os sinais dados. Aluga-se
o hemiciclo para festas e filmes! Nos Passos Perdidos fazem-se exposições! No
rés-do-chão canta-se o fado! Nos claustros, come-se sardinha e bebe-se
jeropiga! De vez em quando, crianças das escolas brincam aos deputados! Este
Parlamento mete dó!
DN, 8 de Novembro de
2015
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