domingo, 30 de março de 2014

Luz - Barcelona, na famosa Praça da Catalunya

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Esta é a maior praça de Espanha ou a segunda maior (e nesse caso a primeira será a Praça das Glórias Catalãs!). A praça, que não é particularmente bonita ou acolhedora, tem um incrível movimento de pessoas e viaturas durante todo o dia e parte da noite. Turista que se preze passa por ali e assim começa as suas voltas organizadas à cidade. A praça liga a velha Barcelona à nova, as avenidas novas às Ramblas. À volta desta praça, em vários edifícios importantes dos finais do século XIX e do início do século XX, instalaram-se instituições, empresas e serviços, a começar pela Telefónica. Durante a Guerra Civil, aqui se combateu, aqui se instalaram soldados e milícias de todos os lados, por aqui foram massacrados uns tantos anarquistas (ora pelos comunistas, ora pelos fascistas…). (2012).

domingo, 23 de março de 2014

Luz - José Medeiros Ferreira

Quatro imagens de umas férias na montanha, em Flims, nos Grisons, Suíça, 1970. Estavam o Zé, a Maria Emília, a Line e eu. Só a Line praticava ski, pelo que nos limitávamos a passear, apanhar sol e beber uns copos à noite. E uma fotografia da revista Polémica, em Genebra.
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José Medeiros Ferreira e Line Krieger. Deve ser a maior aproximação do José da prática do ski! Trata-se de uma ilusão óptica. Os skis pertenciam a outros passeantes… 
Um momento de absoluta paz
Line, AB e José
Line, Maria Emília e José
Os quatro de Genebra da revista Polémica (falta o quinto, o Manuel de Lucena). Eurico de Figueiredo, AB, José Medeiros e Carlos Almeida. 1971

domingo, 16 de março de 2014

Luz - Barcelona

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Perto do Nou Camp. Ao fundo, a grande praça de touros de Barcelona. Que é um belo exemplo de obra doravante inútil! Com efeito, as touradas foram proibidas em Barcelona e em toda a Catalunha! Não só por efeito do “politicamente correcto” e da nova visão dos animais deste mundo, mas também, tenho a certeza, para maçar a diferença entre a Catalunha e a Espanha ou Castela ou Andaluzia… (2012)

terça-feira, 11 de março de 2014

"É preciso um acordo global entre partidos a cinco ou dez anos" (*)

"O PSD hoje faz uma coisa e no dia seguinte o PS ganha, faz o contrário ou desfaz tudo. Já há, aliás, várias medidas tomadas pelo atual Governo para as quais o PS já disse "quando chegarmos ao poder, daqui a um ano, limpamos tudo, fazemos o contrário". As coisas são tão profundas e tão importantes na autarquia, na saúde, na educação, na segurança social, na justiça, que é necessário haver um acordo de longo prazo. Eem Portugal qualquer ideia relativa a um acordo entre partidos ésempre malvista."  
 
"Parte da elite política e dos partidos não quer acordos alargados"  
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António Barreto já foi comunista durante a ditadura, fez-se membro do PS em 1974, apoiou a AD de Sá Carneiro e depois Mário Soares, na candidatura à Presidência da República. Já tinha sido secretário de Estado e ministro, mas há mais de 20 anos que deixou a política ativa. É sociólogo, preside à Fundação Francisco Manuel dos Santos, onde criou o portal de informação estatística PORDATA.

Também já presidiu às comemorações do Dia de Portugal, por escolha de Cavaco Silva, e é uma voz livre, que acha que em Portugal há muita opinião e pouco estudo, muitos palpites e pouca reflexão. E para ele não há dúvida: Portugal precisa de um entendimento entre PS e PSD que possibilite reformas de longo prazo. Nesta entrevista ele explica porquê.

- Como é habitual, pedimos que escolhesse três temas para abordarmos. Começou por "a reforma do Estado: o quê, por quem, quanto tempo." Acredita que a reforma do Estado já tenha começado? Algumas pessoas no Governo dizem que sim, que está em curso há dois anos. Está ou não?  


- Não... [risos]. Por motivos de necessidade, pela austeridade, pelo programa de ajustamento, pelos problemas financeiros, pela falência do Estado do ponto de vista financeiro e até económico, no investimento, etc, começaram a fazer-se certas coisas em todos os ministérios que eram obrigatórias. Para poupar. Fizeram-se umas bem, outras mal, outras assim-assim, como sempre na vida quando se fazem coisas a correr, num frenesim. Fizeram-se muitas coisas em cada um dos sectores para os quais olho. Mas pergunto-me sempre: vamos lá ver se de facto foram reformas estruturais.

- E foram, em algum sector?... Dê-me um exemplo de um desses sectores.  

- Transformação da rede dos municípios. São 308. Porque não 200, porque não 140?

- Eliminámos algumas freguesias.  

- Pois... A freguesia é o recheio do peru, e o peru continua lá. O importante são os municípios, não são as freguesias. Há muitas soluções possíveis. Podíamos optar por um só tipo de autarquia. Há países... Por exemplo, a Suíça tem duas ou três mil comunas, mas não tem nada abaixo da comuna! Há comunas muito pequeninas, que têm 15 mil pessoas e cujos vereadores se ocupam de cortar as árvores e de limpar as ruas, e há comunas como Genebra ou Zurique, que são grandes cidades, e que são estruturas adaptadas às diferentes situações. Nós aí nada fizemos. Outra questão estrutural, a da relação entre medicina privada e medicina pública, que não está resolvida, nem pouco mais ou menos. Continua a haver médicos dos dois lados...

- E em cada um desses campos, o que vê são os interesses do PS e do PSD que os impossibilitam de ter uma visão comum?  

- Mais ou menos. Já começa a ser uma espécie de teoria de papagaio: quando um diz uma coisa o outro diz exatamente o contrário no dia seguinte. No último ano, depois do desvario, daquele exercício de verão com o Presidente da República, o PS e o PSD, em que podia haver eleições, podia não haver eleições e podia haver um pacto, e deixou de haver... A partir de então, basta o Governo dizer A para no mesmo instante, ou uma hora depois, o PS vir dizer B.

- Devo concluir, daquilo que está a dizer, que não acredita que vá ser possível fazer uma reforma do Estado, e dos seus gastos, nos próximos tempos em Portugal?  

- Não acredito enquanto não houver um acordo global a médio prazo, nunca menos de cinco, dez anos, no qual participe a maioria dos partidos políticos, sobretudo os mais importantes, com a participação das empresas, do sindicalismo, e de outros tipos de interesses. Lembra-se do acordo de Moncloa lembra-se dos acordos feitos na Alemanha, na Holanda, em França? Há em quase todo o sítio. Tem de haver em Portugal.

- E é essa também a resposta à pergunta que fez, "o quê, por quem, em quanto tempo?"  

- "O quê" é determinar quais são os principais pontos para os quais é necessária reforma. Na educação, o mais sério, o mais importante, nem se toca na relação entre a escola e a comunidade. A relação entre a escola e os pais, entre a escola e os autarcas, isso é que é uma reforma estrutural! Saber até onde é que vai o currículo nacional, onde é que há um currículo diversificado, qual é a relação dos professores com a escola ou a relação dos professores com o ministério, isto é que é a reforma estrutural! Mas nem se lhe toca! Porque é grave, porque é sério, é problema para durar muito tempo e que não se pode resolver na dependência do puro resultado eleitoral. O PSD hoje faz uma coisa e no dia seguinte o PS ganha, faz o contrário ou desfaz tudo. Já há, aliás, várias medidas tomadas pelo atual Governo para as quais o PS já disse "quando chegarmos ao poder, daqui a um ano, limpamos tudo, fazemos o contrário". As coisas são tão profundas e tão importantes na autarquia, na saúde, na educação, na segurança social, na justiça, que é necessário haver um acordo de longo prazo. E em Portugal qualquer ideia relativa a um acordo entre partidos é sempre malvista.

- Os estudos de opinião revelam que os portugueses querem acordos alargados...  

- Quem não quer é uma parte da elite política, uma parte importante dos partidos políticos. E na imprensa, que vive a informação de uma maneira mais ativa, enérgica, mais adversarial e contraditória, não tem bom acolhimento a ideia.

- Já disse que era o momento de criar grupos de reflexão, de começar a estudar para depois se poder fazer a verdadeira reforma do Estado. Acha que os nossos credores aceitarão que, em benefício da qualidade dessa reforma, se atrase um pouco os timings?  

- Não falo por eles, não sei o que pensam. Os credores não têm nada que dizer sobre este assunto. Repare no QREN. É um programa de investimentos a seis, sete anos, de 24 ou 25 mil milhões de euros. Sobre isso, não era importante haver um acordo de dois terços dos representantes políticos? Era vital! Não vai haver, porque eles não querem. Nem o PSD quer o PS nem o PS quer o PSD. Começassem a trabalhar já, independentemente das eleições europeias, independentemente das eleições do ano que vem... E há circunstâncias inspiradoras. Em Espanha, em 1977, houve o acordo de Moncloa Na Alemanha temos uma grande coligação. Há países na Europa com três, quatro, cinco partidos no governo. (Continuando) Há também a revisão da Constituição: conforme a altura, conforme o partido e conforme as circunstâncias, quem fala em revisão da Constituição é logo acusado de qualquer coisa: fascista, comunista, salazarista, qualquer coisa. Já se fizeram seis ou sete revisões constitucionais, duas das quais muito importantes mesmo. Não foi o suficiente. Esta Constituição serviu quase na perfeição durante dez anos, foi uma espécie de apólice de seguro da democracia, contra todos os vícios. Simplesmente, isto não resulta para poder governar, não resulta para o futuro.

- Neste momento, vê que seja absolutamente fulcral avançar para uma revisão constitucional?  

- Passos Coelho foi às eleições dizer que queria a revisão. Tentou fazê-la e no dia seguinte enterrou-a logo.

- Da forma como ele a procurou fazer, não teria consenso com o PS.  

- Até às próximas legislativas, não vai haver nenhum resultado. Pode haver é reflexão! E os dirigentes dos partidos políticos portugueses têm de deixar de ter medo do pensamento. Têm de pensar, têm de refletir, de estudar!

- A reforma do sistema político, que também advoga, poderia ajudar a resolver esse problema da relação da classe política com o que é o interesse geral, a necessidade de ter acordos?  

- Sim! Por exemplo, dentro da reforma do Estado, outro assunto de que nunca se fala, além da revisão constitucional, um instrumento da reforma do Estado, é o sistema eleitoral. Ninguém hoje dá três vinténs pelo sistema eleitoral que temos.

- Já se fez muita reflexão sobre essa matéria, mas nunca foi possível chegar a um acordo...  


- Já. Mas a decisão nunca é em nome do interesse público, é sempre em nome da circunstância eleitoral.
 - Nos últimos tempos, sempre que se tem falado de reforma do Estado fala-se do Estado social. No fundo, estamos a falar de segurança social, saúde, escola. Esses também são, para si, os eixos fundamentais de uma reforma do Estado ou seria muito mais do que isso?  

- E muito mais do que isso. Também é a parte política, a territorial, a administrativa, a autárquica. Um capítulo da reforma do Estado é o Estado social, sim, que tem de ser revisto e revisto.

- E vê razão para tanta barafunda no espaço público entre o PS e o PSD ou os pontos de contacto são muito mais evidentes do que aquilo que resulta da discussão que se está a ter publicamente?  

- Sabemos que há mais proximidade do que parece, mas como é uma boa arma de arremesso....

"Estamos melhor mas ainda não estamos bem"

- Sempre que fala, a propósito de qualquer coisa, somos sempre tentados a pensar que nas suas respostas há sempre a mesma coisa implícita: os políticos, em Portugal, olham pouco para os números e estudam pouco. É isso mesmo que pensa?  

- É exatamente isso que penso. Resulta do trabalho que fiz, por exemplo, na PORDATA, ou antes da PORDATA numa coisa chamada Situação Social em Portugal, que também foi uma publicação estatística enorme. Primeiro, uma estatística não tem nada de sexy. Porque é que fiz isso? Foi por ter verificado que, em Portugal, o mais fácil do mundo é fazer política na base da opinião e nunca na base dos factos. Você nunca pergunta às pessoas o que elas querem! Você é retórico, o Governo é capaz de fazer uma reforma na saúde, na educação, no que quer que seja, sem perguntar às pessoas o que é que elas pensam, sem perguntar aos juizes, aos advogados, aos réus, aos solicitadores, sem perguntar aos médicos, aos enfermeiros, aos doentes, às associações, sem perguntar aos administradores hospitalares. Fazem política sempre em frente! Eu colaborei na lei de bases do sistema educativo, era deputado na altura. Numa comissão especializada para isso, sentámo-nos os cinco grupos parlamentares, e fiz uma lista com 60 pedidos ao Governo. Número de estudantes, o número de professores, o número de chumbos, quem é que passava, quem não passava, o que é que se gastava por cabeça.

- E sabiam?

- Não sabiam! As respostas chegaram seis meses depois da lei aprovada, a lei foi aprovada na exclusiva base de opiniões!

- Se ainda estamos a contar os carros que existem na administração pública...  

- Bom exemplo.

- Se um partido político, qualquer que ele seja, pedisse ajuda à fundação, e à PORDATA em particular, para obter dados sobre determinadas matérias, para poder fazer propostas mais trabalhadas, estaria disponível?  

- Se é um pedido de dados, damos tudo o que temos. Se é para colaborar com partidos políticos, não. Temos um site que está a começar cada vez mais a ser visto, chamado Conhecer a Crise, estamos a tentar publicar dados de três meses, mensais, trimestrais, porque os nossos dados da PORDATA são anuais. Nestas dificuldades económicas e sociais, é bom saber como é que as coisas estão a correr aos três meses, ou aos seis meses. Como é que as pessoas estão a comer? Estão a comer mais ou menos coelho, mais ou menos frango, mais ou menos azeite, mais ou menos óleo? Isso é interessante. O resultado dessas coisas dá logo um sinal e vê-se muitas vezes, em pormenores, nas dívidas, no cartão de crédito, nos despejos, nos despedimentos e na comida, onde é que as coisas estão a mexer. Esse género de coisas, qualquer partido político, qualquer instituição pode pedir. Nós damos tudo o que temos, se soubermos. Colaboração bilateral com um partido, não.

- Olha muito para os números. Nos últimos dois anos começam a aparecer alguns indicadores macro que parecem alimentar expectativas positivas. Estamos melhor ou estamos pior?  

- [Sorriso] Estamos ligeiramente melhor do que há três anos, no estrito sentido que parece termos evitado a bancarrota e o pior, de que iríamos pagar cem anos. Nisso estamos ligeiramente melhor. Há um bocadinho de músculo. Mas não estamos melhor ainda porque não andamos bem. As pessoas não estão a viver melhor, ainda estão a viver pior do que há quatro ou cinco anos, quando só havia a dívida. Fui operado há pouco tempo e estou a fazer fisioterapia. O joelho já tem músculo e já ando; e já não se vê que estou manco, mas ainda sinto que está cá qualquer coisa. Portanto, preciso ainda de mais um bocado para poder dizer "estou mesmo melhor".

- Qual a maior ameaça, para o Estado social? A financeira, porque vivemos uma crise financeira grave, ou a ideológica, que possa existir de uma clivagem entre PS e PSD?  

- Ideologia há sempre. Quando vejo um partido acusar outro de ideologia dou sempre uma gargalhada, porque estão ambos a ser ideológicos. É bom ser ideológico, isto é, defender ideias e princípios, mas defendê-los com números e com factos e saber do que estamos a tratar. Quantos reformados vamos ter daqui a 20 anos? Há dinheiro para isso? Quantos reformados vamos ter daqui a 40 anos? Há dinheiro para isso? Há um número que gosto sempre de recordar a mim próprio, para nos pôr no sítio: há 30,40 anos, em Portugal, havia 150 mil, 130 mil reformados e pensionistas. Hoje há três milhões. Esta é a diferença, são as balizas da diferença que criam um problema sério.

- Essa é a medida do avanço do nosso bem-estar social, mas também a medida do nosso problema?
 

- É. Por exemplo, sou favorável à manutenção de um Serviço Nacional de Saúde. Foi talvez o que de melhor em Portugal se fez nestes 40 anos. Melhor do que se fez na educação, melhor do que se fez na justiça - aqui nem comparação -, melhor do que se fez na segurança social. E, portanto, vamos preservar muito disto. Mas também já se sabe que este sistema não é eficiente, há muita gente em filas de espera, há acidentes que acontecem com frequência por falta de tempo, de espaço nos hospitais, portanto, é necessário alterar algumas coisas. Por outro lado, há o dinheiro: a despesa da saúde, já toda a gente sabe no mundo inteiro, é exponencial, não tem limite, é infinita. Mas o que as pessoas ganham, o que as pessoas rendem, o que as pessoas trabalham, é finito. Tem de se encontrar também uma solução para isto. Todos os partidos o sabem, não têm é coragem de o dizer e de aceitar que é necessário começar a estudar.

- Não têm coragem ou os interesses que estão dentro desses partidos assim o exigem?  

- Pode ser as duas coisas.

- Falta dimensão aos líderes para além dos grandes interesses que atravessam os partidos?  

- Pode ser as duas coisas... Vejam a questão, por exemplo, da medicina privada e da medicina pública. Sempre fui defensor da separação de águas. Um médico que é médico no público, que não seja médico no privado, e vice-versa. E eu encontro gente que pensa a mesma coisa nos dois ou três partidos. Mas depois, quando chega a altura...

- É a diferença entre estar na oposição e no Governo, que marca muito o PS e o PSD?  

- Infelizmente, é. E era por isso que eu achava que um grande esforço de entendimento devia ser forçado pela opinião pública, por vocês, jornais, rádios, universidades.

- "Coesão social: efeitos da troika, consequências a médio e longo prazo", foi o segundo tema que escolheu para esta conversa. Acabado este ajustamento, daqui a uns meses, se as coisas correrem bem, estaremos mais bem preparados para enfrentar o futuro? Ou, pelo contrário, este ajustamento e esta crise deixaram demasiada gente para trás e as consequências, as mais graves, ainda se vão fazer sentir?

- Respondo 'sim' às duas perguntas, que parecem contraditórias mas não são. Creio que nalguns sectores da economia, nalguns sectores do pensamento, da reflexão e da economia real, há domínios que estarão hoje em melhores condições de enfrentar os anos a seguir. Muita gente percebeu que o consumo e a poupança são duas entidades em que se deve mexer com cuidado. Estão a aumentar os níveis de poupança, que é para mim uma surpresa agradável. Portanto, há sectores, situações, segmentos da população que vão estar melhor, mas cujos resultados só se sentirão se ho u ver bom enquadramento, isto é, uma boa política para os próximos anos. Para mim, o caso mais flagrante da maior falha do Governo atual foi que muito pouco se fez para preparar o investimento futuro. Estava à espera de que, desde há três anos, aparecesse um novo código de investimentos, uma simplificação dos processos, dos contratos com as empresas mundiais que podem vir para Portugal para a criação de emprego. Com capitais nacionais ou estrangeiros, não é só capitais estrangeiros, e já ouvi dizer aí que há quem queira beneficiar os capitais estrangeiros em detrimento dos portugueses. Este novo enquadramento geral do investimento, com a burocracia, a justiça, foi muito pouco estudado. Depois, há a segunda parte da pergunta: há quem tenha ficado para trás. Há quem se tenha ido embora. É pena que ainda hoje não se saiba quantos é que se foram embora nos últimos anos. Há tanta demagogia a propósito das consequências da troika Todos os dias vejo nos jornais, na imprensa, ou na rua, em qualquer sítio, que há mais suicídios, mais tuberculosos, mais crime, mais homicídios, mais divórcios, mais mortalidade infantil...

- Isso são consequências sociais do plano de ajustamento?  

- Isso é o que toda a gente diz.

- Mas não é verdade?  

- Em parte não é verdade. Cada vez que me dizem "no ano passado houve menos 500 crianças do que no ano anterior, isto é a crise", a primeira coisa a fazer é ir ver como é que foram os últimos dez anos, e depois ver qual é a evolução! Há situações da natalidade que fazem pensar que talvez - talvez! - nos próximos cinco anos se confirme uma tendência para uma redução suplementar, mas não vamos esquecer de que estamos em redução há 40 anos!

- A troika não é responsável por tudo aquilo que aconteceu em Portugal...?  

- Não. São os portugueses! São os responsáveis por tudo o que aconteceu em Portugal, desde o desvario do endividamento, da dívida, de ter de chamar a troika - e por tê-la cá naquelas circunstâncias, por se ter adiado um, dois, três anos, o que podia ter sido feito antes em muito melhores condições. Nós chamámos a troika...

- ...No limite?  

- No limite da guilhotina. Já a lâmina vinha a cair, alguém pôs lá uma mãozinha, o que eu agradeço, porque se a guilhotina tivesse caído era um bocadinho pior. Agora, nós somos os responsáveis do que fizemos. Houve especulação financeira mundial? Houve, no mundo inteiro, não foi só em Portugal. Houve banditismo financeiro americano e multinacional? Houve, no mundo inteiro, não foi só em Portugal. O que aconteceu de mal a Portugal aconteceu no mundo inteiro, mas nós estávamos particularmente mal preparados para isso.

- Há pouco, ia falar da natalidade. A natalidade foi colocada agora no centro das atenções pelo Governo. Esse é um dos problemas ou é mais um chavão?  

- Já é, pelo menos, o terceiro ou quarto Governo que nos últimos 30 anos faz da natalidade o problema mais importante do País. E eu acho que, em grande parte, é demagogia. Já há quem tenha oferecido cheques de 200 euros a receber 18 anos depois... Houve um candidato a primeiro-ministro que disse, um dia, "eu em quatro anos de Governo farei aumentar a natalidade 3%"!... Isto são tolices medonhas porque não se mexe na natalidade assim, nem com 200 euros, nem com ação do Governo, nem sequer com creches. É um conjunto de medidas, de ações, de sistemas, ao longo do tempo...De décadas! A França tem uma política natalista há 80 ou 90 anos!

- Isso é resultado também da evolução económica do País?  

- Os valores são diferentes. As pessoas muito conservadoras e muito reacionárias gostam muito de dizer "hoje já não há valores". Isto é errado. Hoje há valores, são é diferentes do que eram há 40 ou 50 anos. Dito isto, é verdade que vale a pena estudar a demografia e prever, como fizemos na Fundação Francisco Manuel dos Santos ou na PORDATA, e no estudo que está agora a acabar de decorrer, que fizemos a meias com o Instituto Nacional de Estatística sobre a fecundidade. É verdade que dentro de 30 anos, ou 40, pode haver em Portugal sete milhões de habitantes. É verdade!

- E isso é bom ou é mau?  

- Se for essa a escolha dos portugueses, é o que deve ser, primeiro. Segundo, pode ser mau. Isto é, esses sete milhões podem ser um grupo de pessoas tão idosas, com tão pouca vitalidade para trabalhar, para pensar, para estudar, para imaginar, seja para o que for, que o País se transforme numa espécie de estaleiro de idosos. E depois, das duas uma: ou assim fica ou é uma estação de férias para os países mais ricos e os países com mais genica, ou então pura e simplesmente, que é outra solução, vêm pessoas de África, da Ásia, da América Latina...

- A imigração. Vivemos num mundo globalizado. Se Portugal tiver condições económicas para produzir e para exportar, nós que somos um País de emigrantes, podemos olhar também para a imigração como ajudando a resolver esse problema da falta de natalidade e envelhecimento da população?  

- Com certeza. Vai ser inevitável que Portugal tenha novamente, daqui a dez ou 20 anos, novas vagas de imigração. Como naquele pequeno período nos anos 1990, em que de repente apareceram em Portugal meio milhão de estrangeiros, brasileiros, ucranianos, moldavos, cabo-verdianos, guineenses. Para os meus valores é bom que Portugal seja uma sociedade plural e não seja uma sociedade homogénea, tudo igual uns aos outros.

- Quando se fala na coesão social, fala-se também da reestruturação nas infraestruturas, hospitais, tribunais, escolas. Como é que olha para essa realidade?

- Acho que alguns desses passos foram muito bem dados. Uma das causas, nos últimos 30 anos, da segunda vaga de decréscimo da mortalidade infantil, quando estava a 10 ou 15 e foi trazida até aos 2,3 por mil, ficou a dever-se muito ao desaparecimento de centenas de maternidades que não o eram e à organização de um serviço de assistência neonatal às mães em risco ou às crianças acabadas de nascer em risco. Era necessário fechar maternidades que se julgavam capazes e não tinham os meios necessários. Criar ambulâncias que fizessem os cinquenta quilómetros até Lisboa, até ao Porto ou até Faro. E portanto, foi feita uma reestruturação, muito combatida, como se lembram, e na qual colaboraram as ministras, aliás, muitas mulheres, a Leonor Beleza, a Maria de Belém, mais duas ou três, o Correia de Campos...

- ...Que pagou politicamente por isso...  

- Pagou por todos. E ele tinha razão em tentar reestruturar e aprofundar a reorganização do sistema de saúde. Entre nós, o que me mete medo é que quando se começa a fazer uma coisa, geralmente, depois vai-se longe de mais. É como com as escolas.

- O racional dessas medidas é sempre o número de pessoas que vivem nessas regiões. Isso não é também um contributo para uma desertificação rápida do País?  

- Pode ser. Não chamo desertificação, é despovoamento. A sociedade moderna vai ser uma sociedade em que não há tanta população rural quanto havia no passado ou hoje. Isso não me preocupa.

- Isso é a tendência universal, a concentração nas grandes cidades.  

- É. Preocupa-me é que o despovoamento seja acompanhado de desertificação no sentido de abandono, porque a desertificação implica perder recursos, águas, florestas, produção agrícola, localidades para turismo. Há sítios no mundo, na Escócia, na Alemanha, nos Estados Unidos, na França, na Itália, despovoadíssimos, ainda mais do que Portugal, que são sítios belíssimos ou interessantes do ponto de vista turístico,cultural, ou para a saúde, caça, flora, ou para produzir! Portugal precisa de produzir floresta em grandes quantidades e para isso, muitas vezes, é melhor despovoar. Se for feito sem atenção, chama-se desertificação e pode ter muito maus resultados. Se for feito com atenção, chama-se despovoamento e eu não sou desfavorável. Fui visitar escolas no Alentejo, aindahá dez anos, que tinham três, quatro, cinco alunos. O processo pedagógico, social, cultural, psicológico, de formação destes alunos não é aceitável! Estes miúdos têm de ter 20,40,50 colegas, têm de mexer-se de uns lados para os outros. Mas depois os ministérios perdem a cabeça, os diretores-gerais perdem a cabeça e em vez de quatro é dez, depois em vez de dez são 20, depois dos 20,40, e depois não se repara, não se faz a diferença. Há sítios onde se justifica uma escola de 20 alunos.

- Passamos para o terceiro tema. Há pouco dizia que tinha uma certa preocupação por ver que o Governo não preparou o investimento económico para um futuro breve e por isso propôs debater "as condições políticas para o desenvolvimento económico". O que é que podia ter sido feito aproveitando este ajustamento?  

- Estudo e inquérito real a milhares de empresários portugueses e estrangeiros. Para saber exatamente o que é que os faz vir para Portugal, oqueéque os faz sair. Há cinco anos, fui convidado a assistir a uma reunião em que um secretário de Estado ia falar com umas dezenas de empresários. Anunciou as 200 medidas que ia tomar. Quando terminou, o primeiro empresário que estava na sala pediu a palavra e disse: "O Estado anuncia isso tudo, eu fico muito contente e gostava muito que muitas dessas medidas fossem, efetivamente, tomadas. Isto vai demorar muito tempo, eu propunha-lhe só uma coisa: o Estado podia começar a pagar o que deve aos empresários, e com grande rapidez, e eu já não queria mais nada. E o secretário de Estado, diante de toda a gente - o desplante é que é espantoso -, disse: "O senhor, se não se importa, no fim da reunião dá-me o seu nome e fala com a minha secretária que eu vejo o seu caso e resolvo." Isto não é política de investimento. Portanto, primeiro, estudar o que os empresários querem e precisam, saber para o que estão disponíveis e o que querem fazer, o que é preciso para eles voltarem ou aumentarem os seus investimentos. Depois disso, falar seriamente com os sindicatos e ver em que é que podem contribuir.

- E podem?  

- Acho que sim.

- Não os acha, alguns, talvez a maior parte, um tecido muito

- Está à espera de que eu lhe diga... os da Autoeuropa contribuem para o desenvolvimento e para o investimento.

- A Autoeuropa é só uma.

- Mas há mais empresas. Talvez não tão poderosas.

- Há um sindicalismo mais moderno a emergir?

- Creio que sim, que é o sindicalismo de empresa. O sindicalismo nas empresas, não nos sectores, porque quando se mete o sector em que vem, de um lado, a empresa de informática ou de química mais moderna do mundo, e do outro lado um vão de escada completamente perdido...

- Olhamos para os sindicatos e vemo-los muito atravessados pelos interesses dos partidos. Não vê também isso ainda assim, hoje?  

- Vejo. Mas sabe que quando você chama as pessoas, elas são capazes de dar o melhor de si. Se você chamar, você Governo, você patrões... Os patrões falam pouco diretamente com os sindicatos.

- E quando falam, como é o caso da Autoeuropa, dá resultado?  

- Dá. Se os patrões estão disponíveis para falar e para encontrar soluções, encontram soluções. Para o investimento, não esqueça: burocracia, justiça, contratos a longo prazo, estabilidade fiscal e legal.

- Temos falado nesta entrevista do consenso que é necessário entre os partidos. O acordo do IRC que foi feito entre o PS...  

- [Interrompendo] Foi uma ajuda.

- E é um princípio para fazer mais nesta área e entre os partidos? Era exigível que isso acontecesse?  

- Muitíssimo mais. À volta dos investimentos públicos do QREN, podia também fazer-se, para dar tempo à revisão constitucional, um trabalho, um acordo entre partidos, princípios fundamentais para a definição do Orçamento. Em vez de inscrever no Orçamento os limites da dívida, os limites do QREN e do IRS, criar alguns princípios que associassem os principais partidos a uma política, para que um partido não venha pôr em causa o que o outro fez. À volta disso, um grande programa de desenvolvimento do investimento, interno e externo. Isto é matéria para um formidável acordo nacional.

- Para sairmos deste programa de ajustamento, em sua opinião, Portugal deve procurar uma saída à irlandesa, ou limpa, como se diz, ou é melhor um programa cautelar que nos dê garantias?  

- Até essa discussão se transformou numa guerra de capoeira, numa guerra política, porque se um diz que quer a saída limpa, o outro diz "não, não, eu quero à irlandesa", "não, não, eu quero à italiana", ou à grega, "não, não, eu quero um programa cautelar". Agora, dentro dos programas cautelares, já há três hipóteses, o cautelar forte, o cautelar fraco, o cautelar assim-assim. Eu não sei o suficiente de finanças internacionais para poder responder. Parece-me que depois destes três anos, em que o facto de haver um apoio externo ao ajustamento serviu para alguma coisa, sair bruscamente só para ser machista, para ser marialva, para dizer "é limpo, é uma saída limpa"... penso que há gente no Governo que quer isso, e depois na oposição também querem. Querem se o Governo quiser o contrário, como é o costume. Parece-me que um ou dois anos com a parede escorada ainda, com um bocadinho de apoio, já não é de canadianas, para voltar ao outro exemplo, mas com uma ajuda, acho que é melhor. É um recado dado ao exterior...

- [interrompendo] Conhece a classe política. Não seria melhor estarmos controlados ainda mais um tempo por alguém de fora, para não fazermos disparates?  

- Controlados, acho que não. Escorados, acho que sim. Devemos ter durante um ano ou dois, sobretudo na União Europeia, não sei se no Fundo Monetário, alguém a quem prestar contas, o Banco Central Europeu e a Comissão, e o Parlamento, para mostrar que somos capazes de tomar conta do assunto. £ uma das maneiras de o fazer era assinar um acordo, mais uma vez - estou obcecado com isso -, um acordo PS-PSD que se chamasse "Acordo de Colaboração e Cooperação Pós-Troika", para dois ou três anos. Com esse acordo, garanto-lhe que metade do assunto cautelar está resolvido.

- Mas se o Presidente da República conseguiu estimular o aparecimento desse acordo, quem é que poderá fazê-lo? Só a absoluta necessidade, um dia?  

- Se for verdade o que diz, é mais uma vez a justificação do meu pessimismo ou do meu ceticismo. Se fosse chefe do PS, tinha-o proposto eu, por exemplo.

- O que é que espera das próximas eleições europeias? Uma vitória do PS?  

- Mais abstenção, mais desinteresse. No caso português, não estou à espera do aparecimento de coisas de extrema-direita, nacionalistas, porque em Portugal não há disso.

- Fenómenos populistas. Não vê nenhuma personagem que possa estimular o seu aparecimento?  

- Não, em Portugal não creio que vá haver disso.

- Não acredita que Marinho e Pinto tenha um resultado fora do normal em Portugal?  

- Não estou à espera de que ele tenha um resultado fora do normal.

- Está à espera de que estas eleições tragam dificuldades para António José Seguro, no PS, ou mais para Pedro Passos Coelho na chefia do Governo?  

- Parece-me que as eleições europeias vão ter, primeiro, resultados negativos, abstenção, desinteresse pelas questões europeias. E depois vão talvez forçar a ideia de que há uma espécie de empate, de travão mútuo, em que o PS não consegue vingar, o Governo, mesmo com coligação, também não consegue vingar, o que é um anúncio de que as eleições legislativas a seguir poderão confirmar essa espécie de empate. E o empate não sei se é boa solução. Ainda não percebi se um empate é um estímulo ao acordo que eu proponho sistematicamente ou se é um travão a esse acordo.  
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(*) - «DN» de 9 de Março de 2014

domingo, 9 de março de 2014

Luz - Barcelona

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Tapas. (2012)

domingo, 2 de março de 2014

Luz - Barcelona

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Saída de uma igreja, numa pequena transversal da Rambla. (2012)