É impossível encontrar, a
propósito de quem quer que seja, um sentimento comum a todos os Portugueses.
Ainda bem. O mesmo, aliás, se pode dizer dos outros povos: o consenso é coisa
rara, utópica mesmo. Mesmo quando está em causa a opinião sobre outros países,
não há consenso. São muitas vezes impressões e preconceitos, aumentados quando
se envolvem questões de religião, de identidade e de história. O nacionalismo é
uma realidade complexa e delicada. É sabido que os Franceses não gostam dos
Alemães nem dos Americanos. Que os Portugueses não morrem de amores pelos
Espanhóis. Que os Polacos abominam os Russos. Que os Croatas detestam os
Sérvios. E que os Escoceses não têm inclinação pelos Ingleses. Daí a ter
certezas sobre os sentimentos colectivos vai um longo e delicado caminho. O
anedotário não define um carácter nem uma cultura. Mas lá que existe…
Se começarmos a procurar com um
pouco mais de pormenor, é possível, todavia, encontrar tendências e percepções
dominantes. Entre esquerdas e direitas, por exemplo, não é difícil encontrar
inclinações frequentes. Assim, relativamente aos Árabes e aos Muçulmanos, duas
entidades de que muito se fala recentemente, parecem claras certas atracções de
estimação.
Salvo excepções, a direita
detesta os Árabes, menos os ricos. Dá-se mal com eles, a não ser que tenham
dinheiro. Está disposta a tudo para negociar com eles.
Não lhes conhece a história. Não
distingue entre Árabes, Turcos e Persas. Nem entre Muçulmanos e Semitas. Não
gosta, mas aprecia aqueles que, nos seus países, mantém a produção petrolífera
e alimentam bolsas e bancos internacionais. Agrada-lhe o princípio dinástico
que, monárquico ou republicano, tanto tem influenciado o poder nalguns países
árabes.
Não lhes perdoa o passado, nem o
que fizeram, nem o que não fizeram. Deixa-lhes fazer o que querem no futuro,
desde que paguem bem. Aprecia os déspotas e ditadores, porque se espera deles
que tragam estabilidade.
Não se importa muito com o modo
como os Árabes em particular e os Muçulmanos em geral tratam as mulheres.
Olha com distância e por vezes
indiferença para os conflitos violentos entre Judeus e Árabes: a eliminação
recíproca agradaria a muita gente da direita.
A direita não gosta de Árabes,
nem de Judeus.
Salvo excepções, a esquerda gosta
dos Árabes. E dos Muçulmanos. Tem medo, mas gosta deles. Não lhes conhece a
história. Não distingue entre Árabes, Turcos e Persas. Nem entre Muçulmanos e
Semitas.
Perdoa-lhes tudo, incluindo a
violência e o despotismo, por alegadamente terem sido, no passado, vítimas da
escravatura e do colonialismo. Deixa-lhes fazer o que quiserem, porque lhes
reconhece o direito à desforra, dado que foram humilhados. Para a esquerda,
actos de terrorismo e outros desmandos, praticados por muçulmanos, têm sempre
uma circunstância atenuante no imperialismo e na pobreza.
Em todo o universo muçulmano e em
especial no mundo árabe, guerras, terrorismo, tortura, pobreza, desigualdade,
ditadura e intolerância têm uma causa principal: o ocidente, os europeus, os
americanos e a politica europeia dos séculos XVIII, XIX e XX.
A esquerda não gosta da maneira
como os Árabes em particular e os Muçulmanos em geral tratam as suas mulheres,
mas entende que são particularismos culturais que merecem respeito.
Olha com indignação para os
conflitos violentos entre Judeus e Árabes: culpa Israel, mas os principais
responsáveis são os americanos e os europeus.
A esquerda não gosta de Judeus,
mas gosta de Árabes.
A direita gosta de Lawrence, mas
prefere vê-lo a manobrar por longe. A esquerda não gosta de Lawrence, mas gosta
de o ver a intrigar. A esquerda gosta do deserto. A direita gosta de tâmaras.
DN, 5 de Junho de 2016
1 comentário:
Se não sai da dualidade, a coisa fica monocromaticamente acinzenda
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