O Orçamento lá foi aprovado. Não se
pode deixar de festejar o que parece ser uma atitude de compaixão de que
ninguém deveria envergonhar-se. Pensionistas, idosos, crianças, trabalhadores,
pobres, famílias em dificuldade e empregados da Administração vão beneficiar de
alguma compensação depois de seis anos de vida difícil. É verdade que uma parte
da classe média, composta sobretudo por funcionários públicos, sai mais
beneficiada do que os realmente desfavorecidos. Mas há muito já que o PS navega
por estas águas.
Havia dinheiro para estes
benefícios? É o que veremos. Há dinheiro para mais apoios? Não se sabe. Os
aliados do PS vão fazer pressão e exigir mais? Também não sabemos. Os problemas
deste Orçamento resumem-se numa só palavra: incerteza. Por um lado, gasta-se e
apoia-se, mas por outro é ainda preciso abater uns milhares de milhões à
despesa pública. E o crescimento económico é uma incógnita.
A discussão na generalidade e,
agora, na especialidade, teve e tem um teor lamentável. Há muito que é isto e
assim será no futuro. A regra do berreiro impôs a lei e o tom. A ácida maneira
de falar, o conteúdo abrasivo das palavras, as insinuações, os ataques
gratuitos, as acusações destituídas de significado e as mentiras fazem deste
debate um monumento à inutilidade dos cérebros.
Este Orçamento quase não refere o
mais importante problema português actual: a falta de investimento. Em fábricas
e empresas, em tecnologia e equipamento, em inovação e investigação, em
estruturas produtivas e em projectos de desenvolvimento. Para apoiar um sector
quase heróico de empresas exportadoras, para permitir a reorganização de
algumas indústrias e serviços a fim de promover a competitividade, seria
necessário termos bancos e recursos. O investimento exige financiamento. Este
depende do sistema bancário, que, por sua vez, está condicionado pelos capitais
existentes e pelo crédito possível. Ora, no nosso país, falta tudo o que
antecede. Os últimos dez a quinze anos varreram a economia portuguesa como um
vendaval. O “capitalismo português” está morto e enterrado. Não há capital e
quase não há capitalistas. Os bancos estão destruídos, deficientes ou em
trânsito para grupos internacionais. O sistema bancário está de rastos.
Que se perceba pela leitura de
alguns capítulos do Orçamento e em conformidade com o arremedo de debate
parlamentar, o Governo parece contar sobretudo com recursos públicos, os seus,
magros, e os da União, um pouco mais corpulentos. Mas limitados. Já vimos este
cenário. Apesar de muito útil, este investimento é parco e pouco reprodutivo. A
conclusão parece evidente: não havendo recursos em Portugal, é indispensável
buscar o investimento externo. Ora, este tem vindo a descer e está cada vez
mais prudente: é necessário ver as condições de segurança e confiança, as
vantagens, a burocracia, os envolvimentos sociais, a justiça, a fiscalidade, os
incentivos e a corrupção. Neste vasto e indispensável capítulo, pouco ou nada
se debateu. Já os últimos anos de sufoco financeiro tinham sido nefastos. O
governo anterior, que não tinha capital, mas tinha tempo, não alterou as
condições de investimento externo. Ajudaram-se uns grupos internacionais a
comprar o que já estava feito e venderam-se empresas a saldo. E a diplomacia
económica do “visa gold” revelou-se pouco produtiva e arriscada.
Apesar de sempre ter preferido o
investimento público, o PS não condena o investimento privado. E quando esse
investimento tem a participação empenhada dos seus ministros e autarcas, é
bem-vindo. O problema agora é o do apoio dos seus aliados. Sem reservas nem
fingimentos, o PCP e o Bloco detestam o investimento privado, tanto nacional
como externo. Vivem para lutar contra o capitalismo, a iniciativa privada e o
mercado. É o que nunca esquecerão durante a legislatura ou o tempo que ela
dure.
DN, 28 de Fevereiro de
2016
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