.
A NOTÍCIA é simples. O Tribunal de Contas fez um estudo de algumas obras públicas. Cinco ao todo: a ponte Rainha Isabel, em Coimbra; a Casa da Música, no Porto; o túnel do Terreiro do Paço, em Lisboa; o túnel do Rossio, também em Lisboa; e o aeroporto Sá Carneiro, no Porto. Foram detectados atrasos, no acabamento das obras, entre um a mais de quatro anos, o que dá, em média, o dobro do tempo de construção para cada obra. As derrapagens financeiras nos custos elevaram-se, no total, a 241 milhões de euros.
Entre as suas conclusões, o Tribunal de Contas sugere que seja criado um Observatório das Obras Públicas, com as funções de acompanhar e vigiar o processo de construção, o cumprimento dos calendários e a evolução dos custos. Uma entidade deste género estaria já prevista na lei, mas nunca teria funcionado.
O governo, pela voz de representante do Ministério das Obras Públicas, concordou e garantiu que tal Observatório seria criado e entraria em funcionamento no segundo semestre de 2009. Segundo a mesma fonte, a sua “operacionalização” está dependente de uma certificação de “software”. O Tribunal de Contas congratulou-se com a resposta pronta do governo.
Muitos foram os que celebraram a intenção do governo. Até um ex-ministro das Obras Públicas, João Cravinho, aprovou, não sem franzir o sobrolho: “O que é preciso é fazer cumprir a legislação. O fundamental é estabelecer, nas regras de contratação, as disposições que permitam tornar extremamente penalizadora a derrapagem".
.
O PROCESSO de criação deste Observatório, cuja utilidade está por provar, só tem um paralelo: o das obras públicas que se propõe observar. Na verdade, há pelo menos cinco anos que este Observatório está em projecto e foi anunciado. O organismo de combate à derrapagem foi o primeiro a derrapar!
Em Novembro de 2004, com efeito, o então Ministro das Obras Públicas, António Mexia, foi ao parlamento anunciar a criação de um Observatório das Obras Públicas. Nada aconteceu, que se saiba. Dois anos depois, em Maio de 2006, o novo ministro, Mário Lino, anunciava a “criação de um Observatório das Obras Públicas com vista a garantir um maior rigor na observação, atenta e sistemática, da Obra Pública, o que permitirá conhecer as causas dos desvios nos custos e nos prazos de execução das obras, e promover o conjunto de acções conducentes à sua eliminação”. Ainda nesse ano, o governo renova as suas intenções de “integrar num só documento toda a legislação publicada, criar um Observatório de Obras Públicas, de modo a determinar as causas dos desvios nos custos e nos prazos de execução”. Mais um tempo e, em Novembro de 2006, novamente Mário Lino anuncia a fundação de um “Observatório de Obras Públicas que permita ao Estado avaliar o desempenho concreto de cada operador económico em cada obra”. Em Outubro de 2007, o ministro volta a anunciar, na Assembleia da República, a “intenção de criação do Observatório de Obras Públicas, que terá como objectivo analisar e acompanhar todos os contratos de empreitadas de obras públicas”. No ano seguinte, em Janeiro de 2008, o decreto que aprova o Código dos Contratos Públicos cria o Observatório das Obras Públicas. Passam os meses. Em Julho uma portaria do ministério define as regras de funcionamento do sistema de informação designado por Observatório das Obras Públicas: “A presente portaria procede à constituição e à definição das regras de funcionamento do sistema de informação designado por Observatório das Obras Públicas, nos termos do disposto no artigo 466.º do Código dos Contratos”. E assim chegámos a Junho de 2009. O Tribunal de Contas propõe e o governo aceita. É anunciada a criação do Observatório.
.
OS EFEITOS deste Observatório, se vier a ser criado, são imprevisíveis. O modo de nascimento de certas organizações define já o que serão: pretextos ou empregos. Os observatórios entraram em moda há alguns anos e multiplicaram-se. Entre úteis e inúteis, a lista telefónica revela-os às dezenas.
O Observatório do QREN é uma estrutura de missão destinada a assegurar o exercício das actividades técnicas de coordenação e “monitorização” estratégica do Quadro de Referência Estratégico Nacional.
Em Abril de 2009, a Ministra da Educação, o Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local e a Associação Nacional de Municípios Portuguesas acordaram em criar o Observatório das Políticas Locais de Educação.
O Observatório da Emigração é uma instituição criada em 2008 pela Secretaria de Estado das Comunidades em “parceria” com o Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa.
O Observatório da Imigração é uma unidade criada no âmbito do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, que pretende aprofundar o conhecimento sobre a realidade da imigração em Portugal.
O Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, criado no âmbito do Ministério da Justiça, está sedeado no Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, onde funciona desde 1996.
O Observatório Português dos Sistemas de Saúde tem como finalidade proporcionar uma análise precisa, periódica e independente da evolução do sistema de saúde português.
O Observatório do Turismo é o órgão responsável pelo acompanhamento, divulgação e análise da evolução da actividade turística.
O Observatório dos Mercados Agrícolas e Importações Agro-Alimentares foi criado pela Assembleia da República.
.
ESTE não é o catálogo. Ficaram muitos por enumerar, como o Observatório de Segurança de Estradas, o Observatório do Endividamento dos Consumidores, o Observatório das Desigualdades, o Observatório de Prospectiva na Engenharia e Tecnologia, o Observatório da Publicidade, o Observatório do Comércio, o Observatório da Ciência e do Ensino Superior, o Observatório das Actividades Culturais ou o Observatório do Emprego e Formação Profissional. Sem falar nos observatórios municipais, que os há, nos regionais, que também existem e nos privados, que não faltam.
Para quê criar observatórios dependentes do governo? Para que servem as Inspecções e as direcções gerais? Por que não contratar entidades independentes, exteriores à Administração Pública, privadas ou estrangeiras? Já agora, comparem-se os prazos e os custos de obras públicas com grandes empreendimentos privados, a ponte do Carregado, por exemplo, ou os grandes centros comerciais. O resultado é uma vergonha para a Administração Pública.
.
«Retrato da Semana» - «Público» de 14 de Junho de 2009
A NOTÍCIA é simples. O Tribunal de Contas fez um estudo de algumas obras públicas. Cinco ao todo: a ponte Rainha Isabel, em Coimbra; a Casa da Música, no Porto; o túnel do Terreiro do Paço, em Lisboa; o túnel do Rossio, também em Lisboa; e o aeroporto Sá Carneiro, no Porto. Foram detectados atrasos, no acabamento das obras, entre um a mais de quatro anos, o que dá, em média, o dobro do tempo de construção para cada obra. As derrapagens financeiras nos custos elevaram-se, no total, a 241 milhões de euros.
Entre as suas conclusões, o Tribunal de Contas sugere que seja criado um Observatório das Obras Públicas, com as funções de acompanhar e vigiar o processo de construção, o cumprimento dos calendários e a evolução dos custos. Uma entidade deste género estaria já prevista na lei, mas nunca teria funcionado.
O governo, pela voz de representante do Ministério das Obras Públicas, concordou e garantiu que tal Observatório seria criado e entraria em funcionamento no segundo semestre de 2009. Segundo a mesma fonte, a sua “operacionalização” está dependente de uma certificação de “software”. O Tribunal de Contas congratulou-se com a resposta pronta do governo.
Muitos foram os que celebraram a intenção do governo. Até um ex-ministro das Obras Públicas, João Cravinho, aprovou, não sem franzir o sobrolho: “O que é preciso é fazer cumprir a legislação. O fundamental é estabelecer, nas regras de contratação, as disposições que permitam tornar extremamente penalizadora a derrapagem".
.
O PROCESSO de criação deste Observatório, cuja utilidade está por provar, só tem um paralelo: o das obras públicas que se propõe observar. Na verdade, há pelo menos cinco anos que este Observatório está em projecto e foi anunciado. O organismo de combate à derrapagem foi o primeiro a derrapar!
Em Novembro de 2004, com efeito, o então Ministro das Obras Públicas, António Mexia, foi ao parlamento anunciar a criação de um Observatório das Obras Públicas. Nada aconteceu, que se saiba. Dois anos depois, em Maio de 2006, o novo ministro, Mário Lino, anunciava a “criação de um Observatório das Obras Públicas com vista a garantir um maior rigor na observação, atenta e sistemática, da Obra Pública, o que permitirá conhecer as causas dos desvios nos custos e nos prazos de execução das obras, e promover o conjunto de acções conducentes à sua eliminação”. Ainda nesse ano, o governo renova as suas intenções de “integrar num só documento toda a legislação publicada, criar um Observatório de Obras Públicas, de modo a determinar as causas dos desvios nos custos e nos prazos de execução”. Mais um tempo e, em Novembro de 2006, novamente Mário Lino anuncia a fundação de um “Observatório de Obras Públicas que permita ao Estado avaliar o desempenho concreto de cada operador económico em cada obra”. Em Outubro de 2007, o ministro volta a anunciar, na Assembleia da República, a “intenção de criação do Observatório de Obras Públicas, que terá como objectivo analisar e acompanhar todos os contratos de empreitadas de obras públicas”. No ano seguinte, em Janeiro de 2008, o decreto que aprova o Código dos Contratos Públicos cria o Observatório das Obras Públicas. Passam os meses. Em Julho uma portaria do ministério define as regras de funcionamento do sistema de informação designado por Observatório das Obras Públicas: “A presente portaria procede à constituição e à definição das regras de funcionamento do sistema de informação designado por Observatório das Obras Públicas, nos termos do disposto no artigo 466.º do Código dos Contratos”. E assim chegámos a Junho de 2009. O Tribunal de Contas propõe e o governo aceita. É anunciada a criação do Observatório.
.
OS EFEITOS deste Observatório, se vier a ser criado, são imprevisíveis. O modo de nascimento de certas organizações define já o que serão: pretextos ou empregos. Os observatórios entraram em moda há alguns anos e multiplicaram-se. Entre úteis e inúteis, a lista telefónica revela-os às dezenas.
O Observatório do QREN é uma estrutura de missão destinada a assegurar o exercício das actividades técnicas de coordenação e “monitorização” estratégica do Quadro de Referência Estratégico Nacional.
Em Abril de 2009, a Ministra da Educação, o Secretário de Estado Adjunto e da Administração Local e a Associação Nacional de Municípios Portuguesas acordaram em criar o Observatório das Políticas Locais de Educação.
O Observatório da Emigração é uma instituição criada em 2008 pela Secretaria de Estado das Comunidades em “parceria” com o Instituto Superior de Ciências do Trabalho e da Empresa.
O Observatório da Imigração é uma unidade criada no âmbito do Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo Intercultural, que pretende aprofundar o conhecimento sobre a realidade da imigração em Portugal.
O Observatório Permanente da Justiça Portuguesa, criado no âmbito do Ministério da Justiça, está sedeado no Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, onde funciona desde 1996.
O Observatório Português dos Sistemas de Saúde tem como finalidade proporcionar uma análise precisa, periódica e independente da evolução do sistema de saúde português.
O Observatório do Turismo é o órgão responsável pelo acompanhamento, divulgação e análise da evolução da actividade turística.
O Observatório dos Mercados Agrícolas e Importações Agro-Alimentares foi criado pela Assembleia da República.
.
ESTE não é o catálogo. Ficaram muitos por enumerar, como o Observatório de Segurança de Estradas, o Observatório do Endividamento dos Consumidores, o Observatório das Desigualdades, o Observatório de Prospectiva na Engenharia e Tecnologia, o Observatório da Publicidade, o Observatório do Comércio, o Observatório da Ciência e do Ensino Superior, o Observatório das Actividades Culturais ou o Observatório do Emprego e Formação Profissional. Sem falar nos observatórios municipais, que os há, nos regionais, que também existem e nos privados, que não faltam.
Para quê criar observatórios dependentes do governo? Para que servem as Inspecções e as direcções gerais? Por que não contratar entidades independentes, exteriores à Administração Pública, privadas ou estrangeiras? Já agora, comparem-se os prazos e os custos de obras públicas com grandes empreendimentos privados, a ponte do Carregado, por exemplo, ou os grandes centros comerciais. O resultado é uma vergonha para a Administração Pública.
.
«Retrato da Semana» - «Público» de 14 de Junho de 2009
12 comentários:
I Parte
O mundo dos observatórios
para mil e uma finalidades,
são públicos e predatórios
das mais fúteis imbecilidades.
Nascem por todo o lado
e por razões disparatadas,
é um sinal revelado
de políticas embotadas!
Tanta gente empoleirada
paga principescamente,
esta nação empoeirada
a definhar miseravelmente.
II Parte
De frente para o despenhadeiro
nesta penosa e rude caminhada,
a queda nesse esbarrondadeiro
deixará a economia definhada!
A situação é delicada
com tanto esbanjamento,
abeira-se a derrocada
do nosso parco orçamento.
Quem se lixa é o mexilhão
nesta e noutras histórias,
com tanto político brincalhão
e as suas políticas predatórias!
Tomei a liberdade de levar 'emprestado'.
Saudações
Parece que a moda dos Observatórios Cega de Despesismo um Estado Despesista, Favoritista, Amiguista, Clientelarista, monturo de vergonha para nós, os que empobrecemos vergonhosamente sem apelo nem agravo.
A julgar pela raiva vexada que me vara em certos dias de injustiça crassa, sobre mim Directa, isto não vai acabar bem.
Os aparelhos partidários têm muitas bocas para alimentar.
não seria suficiente o "observatório natural" que é a assembleia da república? ou estarei a ser ingénuo?
um abraço,
josé ricardo
Avisa-se os interessados que amanhã será proposto aos leitores um passatempo com prémio a propósito desta crónica.
Decorrerá no 'Sorumbático' (blogue onde António Barreto também é 'contribuidor'), mas a uma hora ainda não definida.
.
Como habitualmente, o prémio será um livro.
Para quando o Observatório da Qualidade e Eficácia dos Observatórios? Estou disponível para integrar mais um desses sorvedouros de dinheiro dos contribuintes.
Já está a decorrer, no Sorumbático, o anunciado passatempo com prémio a propósito de "observatórios".
Termina às 20h de amanhã, terça-feira.
Boa sorte!
Julgo pertinente perguntar: por que motivo acabou o Conselho Superior das Obras Públicas, sem que tenha sido substituído por um Organismo em que certas funções não ficassem no vazio?
Aqui fica um pouco de "veneno":
Quando se punha em causa a Ota, um dos argumentos contra essa localização era o seu preço exagerado.
Ora essa "alegação" enfermava, porventura, de uma incompreensão - pois não era precisamente por isso que a Ota era preferida e acarinhada?
.
Terminou o passatempo promovido no 'Sorumbático', tendo sido referidos os seguintes observatórios (é possível que alguns estejam repetidos, mas aqui ficam tal como os leitores os indicaram):
… das actividades culturais
… da justiça
… português dos sistemas de saúde
… da imprensa
... Português dos Sistemas de Saúde
... Permanente da Justiça
... dos recursos educativos
… dos tarifários (ANACOM)
… das Políticas Locais de Educação
… dos jardins (Gulbenkian)
… da língua portuguesa
... do medicamento e produtos de saúde
… permanente sobre a produção, o comércio e a proliferação de armas ligeiras
… permanente da juventude
… nacional das doenças reumáticas
… da cidadania
… do comércio
... das Desigualdades
da Sociedade da Informação e do Conhecimento
Nacional de Saúde
de Óbitos (dentro do anterior)
dos Poderes Locais
dos Percursos dos Estudantes
da Cidadania e Intervenção Social
de Trajectos dos Estudantes do Ensino Secundário
da Literatura Infanto-Juvenil
… nacional dos recursos humanos
… biologia e sociedade
… da profissão de informação - documentação
… nacional de doenças respiratórias
… de segurança, criminalidade organizada e terrorismo
… para a emigração
… da avaliação de desempenho dos docentes
Observ da Sociedade da Informação e do Conhecimento
Observ do Algarve
OBERCOM Observ da Comunicação
OPSS Observ Português dos Sistemas de Saúde
OI Observ da Imigração Alto Comissariado para a Imigração e Diálogo
OPJ Observ Permanente da Justiça Centro de Estudos Sociais
ONSA Observ Nacional de Saúde
OLP Observ da Língua Portuguesa Comunidade dos Países de Língua Portuguesa
Observ sobre a Adopção de Crianças
Observ de Tarifários do Serviço Telefónico Móvel
Observ da Imprensa
OPJ Observ Permanente da Juventude
Observ do Turismo de Lisboa
ORE Observ dos Recursos Educativos
OPL Observ dos Poderes Locais
ONDOR Observ Nacional das Doenças Reumáticas
Observ Web 2.0 Portugal
Observ de Segurança das Estradas e Cidades
Observ de Prod., Comércio e Proliferação de Armas Ligeiras
OEDT Observ Europeu da Droga e Toxicodependência
OBERCID Observ da Cidadania
OLGBT Observ de Educação
Observ do Quadro Comunitário de Apoio III
Observ para Baguim do Monte
Observ da Luta Contra a Pobreza na Cidade de Lisboa
Observ da Segurança Escolar
Observ Europeu do Racismo e Xenofobia
OPET Observ de Prospectiva da Engenharia e da Tecnologia
Observ do Gabinete de Inserção na Vida Activa
FACTO Observ da Fundação para as Artes, Ciências e Tecnologias
Observ do Desenvolvimento do Alentejo
OPI-D Observ da Profissão de Informação - Documentação
Observ do e – Learning
Observ Permanente da Liberdade Religiosa
Observ da Sustentabilidade do Entre Douro e Vouga
Observ da Jihad
Observ de Timor – Leste
OC Observ da China
Observ Local da Câmara Municipal de Vila Franca de Xira
OBLIJ Observ da Literatura Infanto-Juvenil
Observ Europeu das PME
Observ Local da ADM Estrela
Observ da Competitividade da Região Centro
Observ de Emprego dos Diplomados do Ensino Superior
Observ para a Integração de Pessoas Portadoras de Deficiência
Observ de Segurança em Meio Escolar
Ainda há "espaço" para a criação do Observatório dos Observatórios, bem como do seu supervisor, ou seja: O "Observatório do Observatório dos Observatórios" - penso que assim poderemos OBSERVAR melhor o que o os observadores andam a observar...
Enviar um comentário