domingo, 4 de dezembro de 2016

Sem emenda - Não é final, mas é vitória…

Na “Internacional”, é a luta que é final. Mas entre os slogans e as senhas das revoluções, a “vitória final” ou a “vitória, sempre” fazem parte do arsenal semântico. Em Portugal, este fim-de-semana, assistimos a uma liturgia vitoriosa inédita. É a primeira vez, em quase quarenta anos, que o PCP comemora a vitória. Com cuidado. Com precauções. Com ameaças. Mas vitória!

Um relógio parado está certo duas vezes por dia. A primeira vez foi há 42 anos: aconteceu uma revolução militar que se transformaria gradualmente em revolução política e social! Prevista há muito, esperada durante décadas e desejada tempos sem fim, fez-se e foi o que se sabe. O PCP garantiu que a tinha previsto. Cavalgou-a. Dirigiu-a durante uns meses. Perdeu-a em 1975, a 25 de Novembro. Por isso, as esquerdas detestam o 25 de Novembro. Por isso, o PS, que aplaudiu, tem hoje vergonha do 25 de Novembro. Por isso, o Parlamento recusou o ano passado associar-se à comemoração dos 40 anos e, este ano, não aceitou evocar a data. Felizmente que agora o dia se transformou no Dia Internacional pela Eliminação da Violência Contra as Mulheres, que tem o condão de mobilizar as opiniões e os jornais. Foi também o dia em que morreu Fidel Castro, o mais duradouro ditador do século XX, o mais longo mito e o mais perene herói das esquerdas, incluindo de muitos socialistas que esquecem o ontem e sonham com amanhãs. Parte do mundo deixou-se deslizar numa obscena lamúria em que se festejava em Fidel Castro o que não se tolera em ditadores como Salazar, Mussolini, Franco e Pinochet. Mas Fidel é de esquerda. Como os ditadores Estaline, Pol Pot, Mao e Ceausescu. Deve ser por isso que tem todas desculpas.

O PCP espera agora que o seu relógio acerte pela segunda vez. Há quarenta anos que é contra a CEE, contra a União e contra o Euro. Nunca deu resultado, nem teve êxito. Desta vez, espera que sim. Os dissabores da União, as ameaças de desmembramento e a ascensão da extrema-direita fazem-no ter esperança.

No dia 2 de Dezembro, o PCP iniciava o seu 20º Congresso, em cuja abertura o secretário-geral desferiu um dos mais brutais ataques à União Europeia e ao Euro, à economia de mercado e à iniciativa privada, em louvor da “pátria”, da saúde e da economia pública. Apesar disso, tudo leva a crer que o PCP vá apoiar o governo do PS por mais algum tempo. Mesmo que tenha de disfarçar, como fará com a nomeação de Paulo Macedo, até ontem o coveiro do SNS.

Na véspera, comemorara-se o 1º de Dezembro, que é agora, também, o Dia internacional de Luta contra a Sida, tema mais actual e mais mobilizador do que a independência nacional. Esta deu origem a uma festa “oficiosa”, vá lá saber-se o que é isso, ainda por cima com a presença das mais altas entidades nacionais. Mas é curioso ver, nestes tempos de viragens e reversões, como a festa da Independência Nacional foi cancelada pela direita, há cinco anos, e restaurada pela esquerda, agora. No dia anterior, a 30 de Novembro, os Reis de Espanha terminavam a sua visita de Estado a Portugal, durante a qual elogiaram o bom entendimento ibérico.

Por toda a esquerda, democrática ou não, corre uma palavra ou um conceito a definir uma política: patriótico! É o que se houve aos governantes, aos congressistas do PCP e aos porta-vozes do Bloco. Mas é também o que corre no topo das instituições, Presidente e Primeiro-ministro. A palavra pode ser banal. A sua utilização oportunista. A sua evocação automática. Mas é a palavra dos perigos imprevistos. E dos fantasmas ameaçadores. Patriótico é também contra a globalização, contra o liberalismo político e económico, contra o mercado livre e contra a liberdade científica. Pátria! Pátria! Quantos crimes se cometeram por tua causa!

DN, 4 de Dezembro de 2016

6 comentários:

Anónimo disse...

Humm… está azedo, furioso e desesperado. Ataca a onda de patriotismo e da união das “esquerdas” e dá o primeiro sinal de crítica a Marcelo por ele se ter envolvido nessa onda.
Se pensou que a tentativa de golpe a 25 de novembro /75 tinha separado, definitivamente, “as esquerdas”, enganou-se! Agora, vê-as unidas num propósito único e patriótico, com validade constitucional, de atirar borda fora a onda desumana levada a cabo pela direita portuguesa institucionalizada no último desgoverno dos Pafiosos de má memória. Tudo isto parece demasiado e excede as expectativas de um ex-comunista que aprendeu tarde o valor da liberdade.

Mais, esqueceu-se de referir que, à semelhança de muitos outros portugueses da sua geração, admirou os homens revolucionários das barbas, Fidel e Che, por muitos e bons anos.Reconhecer isso só lhe ficaria bem.

Unknown disse...

Surpreende-me que a fedorenta doninha Sílvia não se dê ao trabalho de ler o livro “António Barreto – Política e Pensamento”. Afirmar que o cronista “admirou os homens revolucionários das barbas, Fidel e Che, por muitos e bons anos”, só pode ser por manifesta vontade de disseminar a inverdade!
A desonestidade intelectual só fica mal a quem as escrevinha, sabia?

Anónimo disse...

D'Orey,
AB foi um jovem generoso, como muitos outros da sua geração, que "... queria fazer a revolução".Até que um dia percebeu, e bem, que "Isto não bate certo,isto não bate certo."
Levou demasiado tempo a perceber,"Eu deixei de ser, gradualmente deixei de ser. Foi um processo."

Uma curiosidade: também eu na minha juventude revolucionária absorvi diários e outros livros escritos pelos revolucionários dos séculos XIX e XX, porém, no preciso momento que li a cartilha vermelha de Mao Tsé Tung, percebi, por contraste, que o valor da liberdade era muito importante para mim e, consequentemente, desalinhei logo com a "esquerda radical" mimada e sectária que me circundava, até hoje!

Capice?!... Ou queres que te faça um desenho?

Ilha da lua disse...

Sendo assim,não entendo porque a Silvia lê de um forma tão enviesada o artigo do dr.Antonio Barreto

Anónimo disse...

Se não entende, eu vou tentar explicar através de um desenho.
Imagine uma folha de papel A4, ao baixo. Seguidamente,represente nessa folha três linhas retas. A primeira na posição horizontal,a segunda na posição vertical e a terceira na posição oblíqua. Pode baralhar.
Pergunta:qual delas sugere mais tensão e dinâmica na superfície da folha? Será a horizontal? Não, pois não?! Será a vertical? Hummm, também não! Ah, acertou! A resposta certa é: a "enviesada"!...
Linear, minha cara ilha da lua!

Ilha da lua disse...

Facilmente rabatível ....Mas enfim....A senhora Carmo tem muitas certezas e poucas dúvidas