A moda está a pegar. Já tínhamos
reuniões bilaterais periódicas, semanais ou não, entre os três partidos da
quase coligação, a fim de verificar, acompanhar e aprofundar. Sem falar nas
reuniões permanentes entre os representantes do governo e dos dois partidos que
apoiam mas não fazem parte. Já havia também as reuniões regulares entre os
responsáveis pelos grupos parlamentares dos três partidos e meio que apoiam o
governo. E ainda tínhamos as reuniões temáticas ou de grupos de trabalho dos
dois ou três partidos a fim de desenvolver legislação e programas específicos.
Agora, temos uma novidade absoluta: as reuniões trimestrais entre o ministro da
educação e os sindicatos de professores. Para acompanhar as medidas e a acção
do ministério, diz a FNE, Federação Nacional de Educação. Para avaliar as
políticas de educação, diz a FENPROF, Federação Nacional de Professores. Estas
reuniões não substituem as negociações laborais, que continuam com a sua
dinâmica própria.
Com as devidas distâncias e
diferenças, este procedimento faz lembrar um famigerado Estatuto do Estudante
outorgado há muitos anos por um dos governos de Cavaco Silva. Esse estatuto,
com a força de um decreto-lei que o aprovava e lhe dava força de lei, concedia
aos estudantes poderes e competências inimagináveis. Eram estudantes
universitários e do secundário, sublinhe-se. Participação em órgãos de
direcção, controle de gestão, co-gestão e avaliação, tudo era concedido aos
estudantes, os mais novos dos quais teriam cerca de 15 anos!
Nos dois casos, a demagogia e a
abdicação das responsabilidades governativas impressionam tanto quanto a
escolha de um parceiro privilegiado em detrimento dos outros interessados no
mesmo assunto ou na mesma política pública. Quem assim age, falará
evidentemente de democracia e diálogo! Mas não é uma coisa nem outra.
Corporativismo? Talvez. Infiltração política? Seguramente. Eleitoralismo?
Provavelmente.
É este o momento para recordar os
eternos marginalizados das políticas educativas: os Pais. Por vários motivos,
estes são sistematicamente afastados das responsabilidades que deveriam ser
suas. Uns não querem saber, gostariam mesmo que a escola se ocupasse de tudo e
o mais tempo possível, sendo uma espécie de substituto completo para as funções
paternas. Outros estão disponíveis e prontos a assumir responsabilidades, mas
foram praticamente expulsos das escolas, das reuniões, das preocupações e da
gestão. Muito poucos conseguem estar presentes e ser aceites. Na maioria dos
casos, são detestados pelo ministério, pelos professores e pelos sindicatos.
Durante décadas, nos textos de lei, falava-se de “comunidade educativa”, o que
ainda hoje acontece nalguns casos. Quando se lê com cuidado, rapidamente se
percebe que, para o ministério da educação e para os partidos políticos (pelo
menos o PS, o PSD e o PCP), a comunidade inclui os professores e os alunos,
ponto final. Nem autarcas, nem associações locais, nem sociedades, nem
empresários… E muito menos os pais. Metediços, ignorantes e incompetentes, são
os epítetos que muitos professores e quase todos os sindicatos reservam para os
pais dos seus alunos. No que são acompanhados pelo ministério que jamais fez
reais esforços para interessar os pais e lhes dar tempo, proporcionar
estruturas de participação sincera e atribuir responsabilidades e poderes.
Este é um velho e desastroso defeito
da educação em Portugal, da sua escola e das políticas educativas. Os
professores não são obrigados a ter em conta os pais e a sociedade. As
comunidades locais ficam indiferentes às suas escolas. Os alunos procuram
esgueirar-se entre pais e professores. Poucos pais assumem as suas
responsabilidades. Se alguém pretende melhorar a escola, é por aqui que deve
começar: pela comunidade e pelos pais.
DN, 1 de Maio de 2016
2 comentários:
Digamos que concordo idealmente com o texto. Não na realidade que vivemos. E sei mais ou menos do que falo. Porque muito lutei para que os representantes dos pais estivessem presentes nas decisões. Reconheço que, como diz, muitos se demitem e gostariam que a escola decidisse tudo, e até quase lhes adoptasse os filhos. Reconheço que os professores não os querem na escola - mas não os querem mesmo, vedam-lhes determinada informação e, se possa, a escola, através dos respectivos órgãos, impossibilita, pelos mais variados meios, que alguns participem - porventura os mais válidos e questionantes, coisa que nunca saberemos porque, ainda que se mostrem disponíveis, não chegam a fazer parte de nada -. As representatividades autárquica e de encarregados de educação, consignadas no conselho de Escola são quase fictícias (as histórias a que assisti são de incomensurável idiotia, que nem ouso contar). Com parte da responsabilidade educativa transferida para a autarquia, não vejo como é que a mesma se desligue da escola. Mas a filiação política continua a dirigir confianças e o inverso. Acredito no entanto que haja, em muito lugar, boas relações institucionais entre as duas organizações, dependendo as mesmas do bom ou mau carácter das lideranças. A formação pessoal e o carácter são mais importantes que o domínio de todos os programas do windows ou a capacidade de ter a legislação sempre presente.
Há no entanto alguma coisa nos EE que se salienta e contribui para a desagregação deste sector. A impossibilidade de as pessoas se reunirem e poderem efectivamente, representar um grupo alargado de pessoas. O que acontece é que os eleitos são, quase sempre, do agrado da escola e não fazem ondas. Se fazem, no ano seguinte, por isto ou aquilo, são afastados.
Agora imaginemos que é efectivamente eleito um membro com interesse genuíno na participação e em passar o testemunho aos restantes EE. Como é que faz? Marca reuniões com quem se ninguém aparece? Envia mails para quê se ninguém responde? E esse interessado(a), acaba a decidir de acordo consigo mesmo, impotente para tanta mudança que exigia mais gente, para actividades que envolvam os pais, a escola e a comunidade.
E no entanto, sei de escolas onde nada - ou pouco - do que diz acontece. E os pais participam activamente. E, se é certo que há reuniões, elas não são em catadupa nem existem só para se dizer ámen. Existem por necessidade de resolver questões. O perfil das lideranças é, em meu entender, determinante no caminho que a escola tem de fazer conjuntamente com pais e comunidade.E quase me parece que os professores já entram velhos na escola. O Projecto Educativo de Escola devia deixar-se de conversa da treta e levantar problemas a resolver durante três anos, envolver todos nessa resolução e ir em frente. Não é assim que a escola trabalha. A escola faz o projecto e, na sua maioria, encaixa depois os pais onde decide. Ora, não é assim que se consegue envolver a comunidade dos pais e EE. Lutamos por alguma coisa se a sentimos nossa. Falta o sentimento de pertença.
Não, não é assim. Na escola pública, os pais e encarregados de educação não só podem como devem exercer os seus direitos, mas também cumprir com os seus deveres, no espaço que lhes compete. O problema é que muitos não vão à escola quando devem e aqueles que se apresentam nem sempre sabem como se organizar, intervir e se fazer representar democraticamente nos órgãos próprios da instituição.
A comunidade educativa é a comunidade escolar mais alargada e está representada no órgão máximo da escola ou agrupamento de escolas, o conselho geral, onde estão representados os pais e encarregados de educação, os docentes, os alunos (no caso das escolas com ensino secundário), os não docentes, a autarquia, associações locais de interesse económico, científico, cultural, artístico, desportivo, etc. Bom, está tudo nos normativos…, assim os queiram consultar. Todos sabemos que não se muda a cultura de uma escola por decreto, são os bons exemplos e as qualidades pessoais e profissionais dos intervenientes que fazem a diferença.
Mas,para melhor se compreender o papel da comunidade educativa no desenvolvimento do projeto educativo de uma escola, o melhor é conhecê-lo, pessoalmente. Fica o convite.
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