Em percentagem do total mundial,
a população europeia está a diminuir. Além disso, é a mais envelhecida. A parte
da União Europeia no produto global, perto de 15%, está em decréscimo. As taxas
de crescimento da economia europeia são das mais reduzidas do mundo. A União
deixou de ser uma grande potência industrial. E é cada vez menos uma potência
financeira insubstituível. A capacidade científica da Europa atrasa-se em
relação aos Estados Unidos e já está ameaçada por outros continentes. Sem a
América e sem a Grã-Bretanha, a defesa e a segurança da União Europeia são
quase inexistentes.
A Europa tem o mais generoso,
solidário e acolhedor Estado social. É o continente onde mais se gasta por
habitante em saúde, educação, cultura, apoio à família e ao rendimento,
segurança social e apoio ao desemprego. É o único continente onde todos os
países são democracias. É o continente que atrai maior número de turistas
internacionais.
Em contas aproximadas, valores
proporcionais e conceito alargado, a Europa tem actualmente cerca de 3,5
milhões de refugiados. É o continente que recebe mais refugiados vindos de
outros continentes. Este é um enorme esforço de que muitos europeus podem ou
devem estar orgulhosos.
A Europa parece transformar-se
num parque temático. Ou num sítio do Património da UNESCO. O Estado social
europeu, em qualquer das suas versões, da alemã à portuguesa, da inglesa à
sueca, é uma obra-prima de solidariedade. Mas também é a condenação à
bancarrota inevitável.
Poderá a Europa receber ainda
mais refugiados e imigrantes em desespero? Talvez. Mas não esqueço os 3,5
milhões que já cá estão. Há limites, mas raras são as pessoas que querem falar
dos limites. Sabe-se que se trata de questão difícil. Como estabelecer os
limites? A que níveis? Com que regras?
Vai ser muito difícil encontrar
uma resposta equilibrada para qualquer daquelas perguntas. Uns querem abrir as
portas, sem limites. Outros querem fechar as portas, sem excepções. Uma solução
equilibrada é aquela que não põe em causa (ou o menos possível…) os direitos
dos cidadãos, as liberdades públicas, os valores culturais europeus, a
solidariedade humana e os direitos universais.
A recusa europeia de considerar a
imigração e a corrente de refugiados como uma questão política a tratar a tempo
e horas, com rigor, tornou tudo mais difícil. A recusa europeia de aceitar que
poderia haver uma política de controlo e de gestão dos imigrantes e dos
refugiados atrasou e agravou os problemas. A ponto de entrarmos em crise
ameaçadora. A evolução política de cada país, como na Inglaterra agora e outros
a seguir, revela as ameaças.
O mar do Sul, o “cemitério”
mediterrâneo, os campos de refugiados, as multidões nas fronteiras e os
conflitos políticos em tantas cidades europeias estão aí para revelar o que já
sabemos, uma crise sem precedentes. As reacções políticas dos eleitorados, as
derivas xenófobas, confirmam o mal-estar crescente. Não basta dizer que se
trata de xenofobia e de racismo. Às vezes é, às vezes não é. Os cidadãos
europeus têm o direito de preferir viver com imigrantes ou sem imigrantes.
A política será chamada a
resolver, a encontrar as soluções equilibradas. Mas, por enquanto, tem
contribuído para tornar tudo mais difícil. A direita defende valores europeus,
as tradições culturais e o legado cristão. A esquerda defende valores
universais, o laicismo, a solidariedade internacional e o multiculturalismo. A
direita quer fechar, para preservar a Europa. A esquerda quer abrir, para mudar
a Europa. Nenhuma parece ter razão.
Os Europeus têm o direito de
querer mudar. Os Europeus têm o direito de querer conservar. Ambos têm razões.
Nenhum tem a razão. O caminho é abrir, mas com critério e controlo. E integrar,
com generosidade e liberdade.
DN, 3 de Julho de 2016
1 comentário:
Não sei mesmo como e quando a política resolve arregaçar as mangas e tratar seriamente o assunto dos refugiados. Concordo que as portas da Europa se abram, mas não sem critério. E concordo ainda mais e com mais veemência em acabar com a mortandade no mediterrâneo - são pessoas, caramba; seres iguais a nós, que pensam e sonham, que têm direito a viver num mundo sem o absurdo da guerra. Mas não vislumbro como é que se atalha tal problema sem envolver os estados de onde saem e que são os seus países naturais.
A crise da Europa é um facto. Nem será só europeia. Mas é aqui que vivemos.E, na verdade, estamos desprotegidos.
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